Quatro: Uma Chance

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— Meu Deus, você não dorme? — Gabi perguntou ao entrar na cozinha esfregando um de seus olhos.

Segurando Mabel em um dos braços e o bule com café recém-preparado com a mão livre eu virei na direção dela, sorri e informei: — Eu não sabia a qual hora você levantaria para trabalhar, por isso me adiantei e tomei a liberdade de deixar tudo preparado antes de eu sair.

Ajeitando os cachos bagunçados, minha amiga caminhou até mim, tomou Mabel de meus braços a fim de me ajudar e sentou em um dos banquinhos apoiando a bebê sobre o balcão a sua frente. — E aonde a senhorita vai levando essa fofura?

— Procurar emprego — respondi rápida e deixei o café ao lado do pão e frios fresquinhos comprados por mim há mais ou menos meia hora. — E se der tempo vou atrás de casas baratas para alugar.

Gabi me lançou um olhar compadecido e não reteve sua curiosidade ao arguir: — Sarah, pra que tanta pressa pra ir embora daqui? Por que não espera o pastor Flávio voltar antes de ir correndo arrumar um emprego?

Eu segurei o ar por alguns segundos e fui sincera: — Meus erros trouxeram uma vergonha gigantesca para minha família, principalmente para o meu pai. Não estou pronta para lidar com isso agora. Ainda assim preciso garantir o conforto e a segurança da minha bebê.

Gabi fez algum tempo de silêncio e passou a brincar com Mabel enquanto eu terminava de montar a mesa de café da manhã. Quando tudo já estava pronto, eu me sentei, peguei minha ovelhinha no colo novamente, fechei os olhos e orei em voz alta agradecendo por aquele dia, pela vida da Gabi e também pedi a direção do Senhor para os meus planos. — Amém, filha? — perguntei ao findar a prece e obtive um gritinho como resposta.

— Amém — Gabi falou sorrindo e, assim como eu, deu início a comilança. Nós passamos a conversar sobre nossa infância brincando juntas e eu me diverti com minha amiga enumerando nossas travessuras. — Lembra quando você escondeu a bíblia favorita do seu pai na casinha do meu cachorro porque não queria ir para igreja naquele dia?

Eu não contive as risadas por lembrar de algo que me colocou em um castigo eterno e comentei: — Você não deveria falar sobre isso na frente da Mabel. Ela pode ser influenciada.

Gabi tocou em minha mão como se quisesse me consolar e brincou: — Se essa fofura for como você, então já comece a se preparar. O pastor Flávio sempre contava para todos que foi você quem deu de presente a ele os seus primeiros fios brancos.

Sorri para Gabi e revelei: — Não se preocupe, tenho pedido ao Senhor constantemente para não deixar minha menininha ser burra como eu fui. — Depositei um beijo na cabecinha da bebê. — E assim poupar essa ovelhinha vai poupar a jovem mamãe aqui de ter cabelos brancos antes da hora.

O clima ficou meio tenso, mas entre as bebericadas em sua xícara, Gabi resolveu inquirir: — Posso te fazer uma pergunta?

— Claro.

Ela pensou um pouco e foi direto ao ponto: — Você pretende deixar o Victor conhecer a Maria?

Só de ouvir aquele nome, milhares de pesadelos recorrentes encheram minha mente. A raiva fez meu coração acelerar e um sabor amargo arruinou o doce da bebida cafeínada a qual eu tomava. Como em instinto materno, eu segurei a Mabel mais forte nos braços e já sentindo os olhos se encherem de lágrimas, rebati: — Esse homem não tem direito algum sobre minha filha. No que depender de mim, ele vai morrer sem tocar num fio de cabelo dela.

Gabi tentou apaziguar os meus ânimos segurando mais forte a minha mão. — Calma, minha amiga querida. Eu só achei que depois de todos esses meses fora, você sentiria vontade de ao menos saber como o pai da sua bebê está.

Ensina-me amarWhere stories live. Discover now