Trinta e Dois: Correção

4.2K 672 45
                                    

Quando abri meus olhos naquela manhã de terça, eu senti uma profunda paz invadindo meu coração e sorri.
 
Depois de tanto tempo andando perdida e cheia de amargura, eu finalmente havia sido encontrada pelas mãos poderosas e fiéis do Senhor.
 
"Bem-aventurado aquele cuja iniquidade é perdoada, cujo pecado é coberto. Bem-aventurado aquele a quem o Senhor não atribuí iniquidade e em quem cujo espírito não há dolo" esses dois primeiros versículos do Salmo trinta e dois ressoaram em minha mente e eu comecei a refletir com grande emoção sobre eles.
 
Meu maior erro foi supor que poderia encontrar verdadeira felicidade escondendo no coração maldade e hipocrisia diante do Senhor.
 
Que alegria haveria longe do Criador, Salvador e sustentador da minha fé?
 
Certamente nenhuma. Eu podia afirmar isso com convicção. Minha alma só obteve a paz tão almejada depois que abri mão de todo o orgulho e remorso e me aquietei nos braços do Senhor, onde pude receber verdadeiro perdão.
 
Tudo havia sido feito novo e o momento de se alegrar havia chegado em minha vida!
 
— Bom dia, ovelhinha — cumprimentei a bebê, deitada no berço se divertindo ao tentar colocar o próprio pé na boca. — Hoje é um dia muito importante. Quer saber o motivo? — questionei, acariciando a barriguinha dela. — A mamãe fez as pazes com Jesus! Sim, ela fez! — Em resposta ela deu um sorriso fofo e eu não resisti ao ímpeto de pegá-la em meu colo e beijar muito suas bochechas fofas. — Agora, o que a princesa acha de lermos a bíblia juntas? — Uma ameaça de choro soou e eu entendi o recado. — Bem, talvez seja melhor esperar o café, não é mesmo?
 
Imediatamente tratei de oferecer os cuidados necessários para deixar a bebê limpinha, coloquei nela um vestido rosa lindo e logo após de me arrumar também, resolvi descer para o café da manhã.
 
— Olha só, meninas! Mais um dia se passou e Sarah não desistiu da gente — brincou Karen ao me ver colocar os pés no Salão de Refeições, onde algumas moças já faziam seu desjejum.
 
Era compreensível aquela reação de expectativa geral, afinal, elas deviam estar esperando que hora ou outra eu atendesse aos pedidos constantes de papai e fosse embora. Mas ainda não era tempo. Pedi a ele um pouco de paciência e calma, pois apesar de termos resolvido nossas pendências, eu ainda precisava decidir minha vida.
 
— É, ainda estamos aqui. Não é, meu amor? — eu disse e voltei-me para Mabel na tentativa de disfarçar meu constrangimento.
 
— Não vou mentir, eu gosto muito das duas espero que demore muito para irem — Anelise confessou meio tímida e eu dei risada. — Seria horrível se você esquecesse a gente.
 
— Como vocês são bobas! Só pensam em vocês mesmas — bradou dona Socorro com um tom de bronca, já levantando do seu lugar. — Sarah não se esquecerá de nenhuma de vocês. Entretanto, sua família deve ser prioridade. Entenderam?
 
— Tudo bem, dona Sô! Elas apenas estão preocupadas — falei, buscando amenizar o sermão para as pobres meninas. — Quanto a isso fiquem relaxadas, ainda não estou pronta para deixá-las.
 
Até quis prosseguir com o assunto, mas dona Sô chamou a atenção de todas, batendo palmas.
 
— Chega de tagarelar, minhas queridas, vamos continuar com o café, pois hoje o dia será cheio de atividades — declarou animada. — Venha Sarinha, estou com saudades da sua companhia.
 
Era incrível ver como aquela senhorinha tão amável não guardou ressentimentos quanto ao meu comportamento inadequado em tratá-la nos dias anteriores.
 
— Vou sim, mas antes... — Dei um passo a frente e me coloquei numa posição favorável para que todas ali conseguissem me ver sem dificuldade e antes de começar a falar já senti o nó querendo ganhar espaço em minha garganta. — Sabe, eu andei pensando e tenho evitado, mas gostaria de pedir perdão a vocês, meninas. — Analisei os rostos confusos e achei por bem prosseguir com a explicação: — Depois de ter despejado minha raiva sobre todos, ter fugido e ser resgatada pelo Coelho, o Senhor Jesus me levou a examinar minhas atitudes e assim perceber minhas falhas em agir como uma pessoa verdadeiramente cristã. — Uni os lábios e sequei uma lágrima no canto do olho. — Quero servir ao Senhor de todo o meu coração e para isso é necessário agir certo e...
 
Mal havia fechado a boca quando fui arrebatada para os braços quentinhos e fofos de dona Socorro.
 
— Ah, minha querida! Fiquei tão preocupada e orei tanto! — Ela me apertou um pouco mais, já sendo incomodada pelas tentativas de puxões de Mabel em seus cabelos. — Ainda bem que Deus atendeu minhas preces, protegeu as duas e ainda te deu a bênção de se acertar com seu pai.  
 
— Estou muito feliz também — declarei, sentindo-me tocada por tanta compaixão. — Meu orgulho me fez esquecer o quanto sou amada pelo Senhor, principalmente, e também por vocês.
 
— Sim, menina! — Ela sorriu abertamente. — Somos da mesma família em Cristo. — Alcançou uma de minhas mãos e me puxou em direção a mesa bem feita. — Venha tomar café. Hoje o dia será muitíssimo produtivo!
 
— Nem me diga — comentei animada e me sentei com Mabel, na cadeira vaga, entre Karen e Anelise, de frente para Fabiana e Carla. — Talvez papai venha aqui hoje.
 
Enquanto Karen me passava o pão e a manteiga, notei a confusão em seus olhos puxados.
 
— Desculpe, mas eu quero mesmo saber, você voltará para sua casa, Sarah? — ela questionou aflita.
 
Soltei o ar e, ao mesmo tempo que oferecia frutas a bebê em meu colo, formulava também uma resposta cautelosa.
 
— Decidi orar um pouco sobre isso — informei um pouco inquieta. — Tanta coisa aconteceu que acabei deixando de lado meus objetivos iniciais. Ou seja, arrumar um emprego, alugar alguma casinha e cuidar da minha bebê. — Pensei mais um pouco. — Já causei tantos problemas ao meu pai, não quero sobrecarregá-lo, sabe?

Ensina-me amarOnde as histórias ganham vida. Descobre agora