Vinte e Um: Pai

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"Como assim ele me trataria como uma irmã?" eu refletia aflita enquanto observava Victor retirando o bebê-conforto com Mabel do carro e mais outras tralhas necessárias.

Tentei suprimir meu ressentimento, mas foi impossível. Minha burrice em nutrir todas aquelas esperanças por Victor quando ele não queria saber de mim como algo além de mãe de sua filha era sem tamanho.

Como eu podia ser capaz de agir de maneira tão inconstante em minhas perspectivas referentes a Victor? Em um dia eu o odiava, no outro já não tinha certeza de mais nada. Será que jamais haveria acordo entre meu coração e meu cérebro?

"Não posso forçá-lo a me amar. Se ele deseja apenas me ter como uma irmã, então assim será" decidi, sem conseguir suprimir a dor martelando o meu coração.

— Ouviu, Sarah? — Victor perguntou me surpreendendo com sua repentina aparição em minha frente. — Está em outro mundo? Ficou séria de repente.

Balancei negando aquelas acusações, embora elas fossem verdadeiras. Eu realmente me encontrava em outro mundo, procurando em minha mente como fui permitir me aproximar tanto de Victor outra vez.

Não, eu não queria estar sentindo aquela inquietação e odiava ver meu corpo reagindo aos toques de Victor como se eu fosse uma uma bomba prestes a explodir e incendiar tudo.

"Agir como irmã. Você precisa agir como irmã, Sarah" pensei e logo em seguida fui tomada por uma angústia. Meus desejos deviam ser contidos antes que fosse tarde demais.

"Maldito coração" praguejei irritada e em uma oração rápida pedi o auxílio do Senhor.

— Pegou tudo? — questionei ignorando minhas próprias lamúrias internas.

Victor ergueu as sobrancelhas e sorriu, me deixando confusa.

— Foi isso que acabei de te perguntar — informou e eu rapidamente fiz uma checagem rapida, contando as bolsas carregadas por mim e cadeirinha em suas mãos.

— Oh! Creio estar tudo aí — respondi sem graça.

— Vamos entrar. Minha avó já deve ter ouvido o som do motor e...

Como se estivesse prevendo, a porta da frente daquela casinha simples abriu-se revelando a querida Dona Rita. O sorriso dela ao nos ver parados na entrada de sua casa foi de uma orelha a outra e ela logo tratou de se aproximar o mais rápido que suas pernas curtas lhe permitiram.

— Graças a Deus vocês chegaram! Eu já estava preocupada — disse a senhora de um modo dramático.

A doce avó não mudara muito desde quando a vi pela primeira vez no jantar onde fui apresentada a alguns dos familiares de Victor. Ainda permanecia adorável com sua alegria contagiante e o jeito simples de vestir-se, a saber, um coque no centro da cabeça, uma saia longa e os chinelos confortáveis no pé.

A mente foi invadida pelos momentos de conversas entre ela e eu, e inevitavelmente acabei recordando dos inúmeros conselhos recebidos. Como uma mulher sábia e experiente, Rita reconheceu muitos pontos inadequados em um namoro entre duas pessoas que se denominavam cristãs e não se privou de me procurar isoladamente naquele dia a fim de me alertar quanto a intimidade crescente entre seu neto e eu. Se ao menos parte de mim tivesse levado em conta aquelas admoestações, muitas coisas seriam diferentes. No entanto, em minha rebeldia juvenil preferi ignorá-la e atender as vontades da minha carne.

— Passamos por um pequeno engarrafamento, mas nenhum motivo para fazer alardes, vovó — contou Victor e mal terminou de fechar a boca quando foi enlaçado pelos braços gordinhos da senhora.

— Quantas saudades do meu leãozinho. — Ela salpicou beijos nas bochechas do rapaz, obviamente constrangido. Eu não segurei a risada quando ouvi aquele apelido e acabei me divertindo as custas do rapaz.

Ensina-me amarOnde as histórias ganham vida. Descobre agora