47.

29.8K 3K 1.4K
                                    

        Ele trancou a porta a chave.

        Havia um vergão vermelho no lado direito da face, exatamente onde minhas mãos estalaram-lhe um tapa.

           Lucca mantinha os olhos firmes sob mim, decididos, pesados. Sentia o coração martelar dolorosamente contra o peito quebrantado, estilhaçado sem chance de reparação.

           Encarávamos-nos. Olhos flamejantes e intensos, bélicos, prestes a explodir em uma batalha sem fim.

          — Por que? — Indaguei entre dentes, quase como um rosnado.

           Piscou os olhos, deixando que a cabeça decaísse até o chão. Sua falta de imposição ardia em meh âmago, borbulhando-me em ira.

            — O que você ganhou com toda essa palhaçada?! — Balbuciei queimando em sarcasmo. — Meu deus você me pediu em casamento, me ofereceu o seu anel da famiglia, sendo noivo de outra! Quão cara de pau você pode ser, Lucca?!!

            Seu silêncio era cortante, incitando-me ainda mais a ira.

             — DIGA ALGUMA COISA!

             Senti o ardor das lágrimas queimarem na garganta. A dor era dilacerante.

             — Abe, escute... — Implorou, tomando meu antebraço em uma investida.

             Com um movimento violento, puxei o braço cambaleando para longe. Ódio e repulsa pairavam sob meu olhar.

             — Não encosta em mim! — Argumentei entre dentes. Seus olhos atônitos me assistiam. — Eu tenho nojo de gente como você.

            Esfreguei os olhos, afastando as lágrimas que ameaçavam fugir. Agilmente prendi o cabelo no alto da cabeça, caminhando até a porta em uma tentativa vã de fugir.

           A ira fervilhada nascendo dele.

           — Abigail. — Evocou ele, enquanto eu me frustrava ao não conseguir descantar a fechadura. O ar escapava-me entre os lábios. —ABIGAIL!

          Sua voz reverberou, estremecendo por dentro. De ombros para ele, encostei a testa de encontro a porta de madeira. O ardor das lágrimas subiam-me pela garganta seca, queimando.

          Aquilo não poderia estar acontecendo, poderia?

           — Seu canalha de merda... — Murmurei sentindo a voz embargar e morrer, forçada pelos soluços.

           Seus passos vieram de encontro a mim, anunciando sua posição. Suas mãos alcançaram minha nuca, gentis e firmes. Não contive o soluço miserável que surgiu. O ar escapava entre os dentes.

            Porra.

             — Amor... — Balbuciou ele, fazendo-me dar de ombros e ficar cara a cara com ele. — Amor olha pra mim.

             Meus olhos correram ao seu encontro: frios e magoados. Seus imensos olhos azuis eram desconcertantes, ruindo-me em vários pedaços, porque soavam sinceros e pacientes. Pacientes como Lucca não era.

            — Ela não significa nada, é você que eu amo, porra. — Informou, palavras gentis, mas dolorosas. — Por que eu teria trazido você aqui se não fosse verdade?!

            Hesitei.

            Uma grande lufada de ar escapou-me pelos pulmões, mas meus olhos estavam decididos nos dele. Doía. Doía muito mais que levar um tiro.

Dom AccioOnde as histórias ganham vida. Descobre agora