Explosão

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Cheguei ao lado de fora do salão que cheirava a rosas e tristeza e encontrei Steve.

- Oi. - ele falou baixo.

- Oi. Estava falando com alguém?

- Nada demais.

Meus olhos ardiam sob os óculos escuros e todas aquelas pessoas que passavam e olhavam para mim estavam esgotando o resto das minhas forças em ficar ali.

- Não aguento mais. - falei com Steve, mas fomos interrompidos pelo memorável Sr. Duncan, diretor da minha antiga escola por não sei quantos anos. Devia trabalhar lá desde o nascimento.

- Samantha. - ele surgiu e segurou minha mão sem que eu a estendesse. - Meus pêsames. Sinto muito que seu pai tenha ido tão novo, com tanta coisa para fazer pelas pessoas e pelos alunos que ele tanto gostava.

Porque ele tinha que viver apenas para os outros, é claro.

- Palavras gentis, Sr. Duncan. Obrigada. - falei o mínimo possível, assim como fiz com todas as outras pessoas.

Havia uma droga de fila onde as pessoas nos cumprimentavam e declaravam suas condolências, mas quando quase tive um acesso de raiva e saí sem mais nem menos do lado da minha mãe, Jack veio atrás de mim e eu não vi mais nada.

Eu só queria sumir.

Começaram a nos olhar enquanto ele tentava me convencer a falar com o resto das pessoas, mas eu não ia falar com a cidade inteira. Não era culpa minha se eu não conseguia ser fria como ele e minha mãe. E agora o diretor da Mullins High School, que deu de ombros e me disse um "sinto muito" no segundo ano quando contei o que Christensen havia feito comigo, estava ali me dando os pêsames pela morte do meu pai.

Meu coração doía insuportavelmente toda vez que eu me lembrava que ele jamais estaria ao meu lado de novo, conversando, rindo, ou apenas em silêncio. A ficha caía aos poucos e a raiva de estar ali falando com todo mundo só crescia. Minha mãe queria fazer pose de família forte e unida, mas para mim aquela tarefa era impossível. Eu não conseguia engolir essa imagem que ela queria passar. Não mais.

O diretor do meu antigo colégio saiu de perto e eu nem sequer percebi. Minha mente não se concentrava em nada que me fizesse importar com algo. Nada valia a pena agora.

...

Flores de nomes que eu não me recordava e nem fazia questão. Terra. Uma garoa fina e chata acompanhada de um vento forte e congelante. Mais terra. Um padre rezando. Mais terra, e o corpo do meu pai indo embora de vez.

Sempre tive claro em minha cabeça que, mesmo que as pessoas morram, nós ficamos com suas boas lembranças, mas isso não era suficiente para mim. E doía muito. A dor podia ser invisível, mas os efeitos dela não.

...

...

Eu estava em meu quarto mais uma vez, deitada em minha cama, concentrada em apenas respirar e não chorar. Não era confortável estar ali, era silencioso demais porque o barulho da casa era meu pai. Deveria ser eu e minha cantoria, mas não. Minha mãe não admitia que eu cantasse pela casa, mesmo assim eu cantava quando ela não estava e meu pai amava. Sorri me lembrando de uma dessas vezes em que cantei e ele parecia um fã maluco no meio da multidão cantando junto e aplaudindo no final. Jerry Walker foi meu maior ídolo. E sempre será.

Meu pai era um homem bom, honesto, esforçado e iluminado. Estudou como um condenado para ser professor de História, pois sempre quis lecionar e levar seu conhecimento aos outros, ter um papel importante na vida de alguém. Era um aficionado por arte e colecionou livros sobre artistas do mundo todo e suas obras. As renascentistas eram suas preferidas. Porém nunca saiu da cidade para conhecer as famosas obras que conheceu pelos livros e pela tela do computador. Eu dizia que um dia iríamos juntos a algum dos museus famosos do mundo. Nem que fosse apenas um.

O AcordoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora