Ex e atual

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Eu estava jogada na cama, meus fones de ouvido explodindo com uma playlist de blues enquanto eu encarava o teto, pensando na vida. Na minha vida, na verdade, e no que eu estava fazendo dela. Fazia mais de uma semana que eu não ia às aulas e provavelmente estava prestes a receber uma notificação. Bolsistas tinham uma enorme lista de coisas a se cumprir, e ir às aulas era o mínimo para qualquer um, mas muito mais para mim.

Pensei em como eu estaria em cinco anos. Se tudo seguisse seu curso natural e eu me formasse e me tornasse advogada, não seria feliz. Provavelmente seria uma daquelas pessoas que perdeu um tempão da vida na universidade e sequer gosta de sua profissão ou nem a pratica.

Eu não queria ser essa pessoa.

Tentei me ver em dez anos e desisti mais rápido do que respirei. Era impossível. Fechei os olhos e deixei o blues me levar com seu solo de guitarra ao mesmo tempo melancólico e sexy e a visão apareceu. Era fácil. Em cinco ou em dez ou em quinze anos eu queria estar num lugar que me dava medo de querer e me decepcionar: o palco.

O público tinha sua importância de reconhecimento, mas não era nele que eu focava. Era o estar sobre o palco, à vontade, cantando, sorrindo, vivendo. Era sobre a minha estrada para ser feliz.

Porém a música parou e meu celular começou a vibrar, xinguei mentalmente quem quer que fosse o culpado dessa interrupção, mas relaxei quando vi o nome de Steve na tela.

- Oi, Steve.

- Oi, tudo bem?

- Sim. Qual é o plano de hoje? - sorri com a hipótese, mas já estava cansada só de imaginar se era realmente isso que ele queria falar. Eu queria poder tirar férias do assunto "Natalie".

- Acho que nenhum. Só liguei pra dizer que está oficialmente inscrita no NY Talent. Aliás, é daqui três semanas. Talvez seja hora de ensaiar um pouco.

- O quê?! - praticamente berrei, mas só notei depois de dizer. - Três semanas?

- Sim, três semanas. Está preparada?

Eu podia apostar que ele estava rindo de mim, ou no mínimo se segurando para não rir.

- Claro que não. - fiquei sentada na cama e tirei os fones de ouvido, encostando o aparelho na orelha então. - Como me inscreveu? O prazo de inscrições acabou há semanas, não?

- Tenho contatos.

- E como posso confiar nesses contatos? Como vou saber se estou realmente dentro do concurso. Posso chegar lá e dar com a cara na porta e você não terá cumprido sua parte no acordo.

- O que vai fazer se isso acontecer? - havia divertimento em sua voz e eu sabia que estava realmente dentro da competição.

- Eu te mato. - ouvi sua risada e não segurei a minha, como sempre.

- Não precisa se preocupar, mas se algo der errado vai poder se vingar na mesma hora, pois estarei lá.

- Deixe-me adivinhar, seus contatos importantes lhe darão passe livre para entrar no concurso.

- Não, não vou entrar com você, mas estarei lá. E a final será no dia seguinte, aberta ao público, e também estarei lá porque tenho certeza que vai passar.

Lá vinha ele com seu otimismo excessivo. Eu não me sentia bem com isso.

- Não devia ter tanta certeza disso, sou apenas mais uma caipira amadora.

- Eu sei que quer evitar uma enorme decepção, mas devia confiar mais em si mesma. Cadê a mal humorada e explosiva de sempre pra mudar esse ânimo?

O AcordoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora