NY Talent

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Eu nunca me sentia pronta para enfrentar o que estava por vir. No fundo eu sabia que teria que ir com medo e só então estaria livre da sensação de algo apertando meu coração envolvido por angústia. Cantar numa competição que valia um prêmio em dinheiro, e uma quantia assim tão alta, era demais para mim. E eu havia colocado pressão demais em mim mesma, mesmo tentando ignorar que esse dia chegaria.

E chegou.

A noite de sexta-feira para sábado foi terrível. Revirei na cama por diversas vezes, a mente viajando entre as mazelas da vida em Mullins e nossa falta de dinheiro, até o dia anterior, quando eu estava no hospital com o coração quase saltando do peito de medo e angústia com Steve numa mesa de cirurgia entre a vida e a morte.

Era muita emoção a ser controlada, mas eu precisava me concentrar.

O concurso aconteceria durante a tarde, então eu teria tempo suficiente para tentar descansar e até visitar Steve pela manhã. No entanto, eu não contava em ter sono para dormir apenas após as quatro da manhã, o que me fez dormir demais e acordar tarde. Além de precisar do dinheiro e estar mais bagunçada que meu dormitório, eu ainda tinha o risco de me atrasar.

Corri até a lanchonete mais próxima e comprei o combo mais barato de café da manhã, porém comi só a metade de um waffle e bebi metade de um chocolate quente. O restante não cabia no meu estômago junto da minha ansiedade. Voltei ao dormitório, tomei um banho e então parti para a saga de encontrar uma roupa adequada.

Tentei inúmeras combinações e acabei com a segunda tentativa, um vestido branco e rodado, que ia até os joelhos. Ele era de uma delicadeza com seus detalhes em renda que sequer parecia ser uma peça minha, mas era. Olhei-me no espelho e soltei os cabelos. Eu precisava cortá-los em algum momento, estavam longos demais, mas para hoje estavam ótimos. Calcei um par de sandálias rasteiras, respirei fundo e saí.

Entretanto, antes mesmo de sair do campus, voltei correndo e peguei minha bolsa com o celular e documentos que estava sobre a cama. Respirei fundo e me olhei mais uma vez no espelho. Eu estava a caminho de algo que podia ser o grande passo da minha vida. Era assustador. Eu conseguia ver isso no meu próprio reflexo. Mas algo na esperança de que a pequena chance que eu tinha poderia dar certo me deu forças e a capacidade de sorrir sozinha antes de sair de novo.

Quando entrei no táxi temi o pior dos congestionamentos, mas quinze minutos antes do evento começar eu já estava em frente ao prédio. A arquitetura entregava uma construção bastante antiga, mas linda. A moça com uma prancheta e uma caneta em mãos, logo na entrada do prédio e com uma fila à sua frente, checava os nomes listados e liberava a passagem dos candidatos. Por um minuto temi não estar entre os vários cantores que pareciam muito mais profissionais do que eu, uma caipira perdida em Nova York.

Eu precisava ser otimista. Steve não estava comigo, então eu precisava acreditar em mim.

Falei meu nome e a moça sorriu para mim e me desejou boa sorte antes de liberar minha entrada. Em seguida peguei meu papel com meu número de identificação, que eles logo colaram sobre meu vestido, na barriga, e me senti engraçada como um dos candidatos que vi diversas vezes na televisão, no American Idol.

Quando eu pensava que os candidatos haviam acabado, surgiam mais deles. Ficamos numa fila gigantesca por um tempo que não contei, mas que pareceu muito longo. Alguns faziam exercícios vocais, outros puxavam conversa e eu só fiquei quieta no meu canto, o mais discreta possível. Estava nervosa demais para poder puxar conversa ou ainda exercitar a voz na frente de tanta gente.

Finalmente abriram a porta e a fila começou a andar. Quando entrei e me deparei com o interior do teatro fiquei embasbacada. O palco brilhava como o sol com seus holofotes, e para a competição, apenas o setor inferior estava disponível, mas era possível ver os dois setores acima desse. Os detalhes dourados nas cadeiras vermelhas eram de um luxo que eu jamais imaginei ter acesso.

O AcordoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora