Trinta e oito: Guardas.

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Ao passar dos dias, Henry me ensinou cada vez mais coisas. Ele me mostrou como manusear uma espada e como posicionar um arco. Também me fez carregar sacos enormes de farinha para ter mais resistência. Tudo estava, finalmente, indo bem.

Até uma noite.

(...)

Acordei sendo chacoalhada pelo Henry que carregava uma expressão apavorada.

— O que foi? — eu perguntei, assustada.

Ele tampou a minha boca com sua mão e balançou a cabeça negativamente. O garoto fez gestos para que eu me levantasse da cama com cautela, enquanto pegava a trouxa que eu trouxe comigo do castelo. Ele colocou um pouco de comida e um cantil de água, de maneira rápida e desajeitada, e me entregou. Peguei a capa que Joana havia feito para mim outro dia e o segui. Henry me fez pular a pequena janela do quarto dele, logo ele veio atrás. Me fez rastejar junto à parede e apontou para o outro lado, me mostrando o motivo de tudo aquilo.

Guardas!

Arregalei os olhos e prendi a respiração involuntariamente, meu corpo ficou rígido como uma pedra.

— Cavalos — ele sussurrou o suficiente para que eu entendesse o seu plano.

Fomos, agachados, até o celeiro. Enquanto eu preparava Tempestade o mais rápido que conseguia, um guarda entrou no local. Me escondi atrás da minha égua, torcendo para que aquele homem fosse embora. Mas pela má sorte que tenho, ele cismou com a cela em que eu estava e acabou vindo em minha direção. Se ele chegasse mais perto, acabaria vendo que existia mais do que um simples cavalo ali. Me encolhi mais um pouco e espremi meus olhos, com medo. Contudo, quando ele tocou na madeira para abrir o pequeno cercado, Henry o acertou com uma pá, o fazendo cair desmaiado.

— Devem ter outros por aqui e ele já vai acordar, vamos logo com isso — ele pediu em um tom baixo.

Puxei Tempestade pela rédea até a saída e montei na mesma. Henry apareceu ao meu lado montado em outro cavalo.

— Se qualquer coisa acontecer comigo, não pare — ele mandou, mesmo sabendo que provavelmente eu faria o oposto.

Saímos sem correr com os cavalos para não chamar atenção, mas quando estávamos na entrada da floresta, um assobio alto e agudo vindo de um dos guardas das rondas, nos entregou.

Henry não hesitou em disparar uma flecha nele para lhe calar. Cavalgamos em disparada sendo seguidos por um pequeno grupo de guardas. Estávamos contando com o conhecimento do Henry sobre a floresta e com a luminosidade da lua. Porém, os homens ainda estavam muito perto da gente.

— Eu irei despista-los — ele avisou.

— Henry, não! — ainda tentei lhe convencer do contrário, mas ele sumiu na escuridão.

Me sentindo de mãos atadas, parei de cavalgar e desci da Tempestade para nos esconder atrás de algumas árvores. Observei os guardas enquanto os mesmos passavam por mim, sem perceber minha presença, e iam atrás da trilha que havia sido deixada por Henry.

Estava frio e as lembranças do dia em que fui molestada me fizeram congelar no meio do mato. Em minha cabeça, havia um conflito. Eu deveria ir embora, como o Henry pediu. A questão é que eu não podia fazer aquilo, não com ele que me acolheu e me salvou de tantas coisas. Ele precisava de mim e era a minha vez de retribuir.

— Vamos, Tempestade! — a chamei, montando em cima dela e saindo para seguir a trilha.

Eu cavalguei por, pelo menos, meia hora até encontrar algumas pessoas.

O grupo de guardas estavam reunidos e eles pareciam irritados com algo. Tomei uma distância segura para que eles não conseguissem me ver, mas que eu conseguisse escutar sua conversa.

— Achamos o cavalo, mas nenhum sinal dele — um deles anunciou e eu sorri. Henry havia conseguido escapar.

— Não encontraremos nada nessa escuridão e o foco não é o garoto, mas a princesa — outro retrucou. Estremeci.

— Podemos voltar quando o sol nascer — um homem careca sugeriu.

— O chefe não vai gostar disso — outro alertou.

Não fiquei para escutar o resto da conversa, eu precisava achar Henry o mais rápido possível. Quebrei a cabeça pensando onde ele estaria, até que minhas lembranças me deram uma resposta. O rio.

Sem hesitar, corri com Tempestade para o local.

— Henry! — sussurrei ao firmar meus pés no chão — Henry, você está aí? — perguntei um pouco mais alto.

Esperei por uma resposta, mas não a obtive. Frustada, dei as costas para montar novamente em Tempestade, foi quando escutei alguém pronunciar o meu nome. Virei o meu corpo na ponta dos calcanhares e esperei para ter a certeza de que minha mente não estava me pregando peças.

— B-bela! — ouvi novamente um chamado soando cortante. Era o Henry, eu tinha certeza, mas eu não sabia identificar de onde o som estava vindo.

— Henry, eu não consigo te encontrar — murmurei, irritada por minha visão ter sido limitada pela escuridão.

Ouvi uma batida num tronco caído, que estava na margem do rio, e corri até lá. Encontrei Henry agarrado ao pedaço de madeira, sua camisa estava manchada pelo vermelho de seu sangue e ele parecia fraco.

— Henry! — me posicionei ao seu lado — o que fizeram com você? — perguntei preocupada, verificando o ferimento. Era um belo corte em sua barriga.

— Eu vou ficar bem, foi superficial — ele disse com dificuldades — me ajude a levantar — pediu e eu o fiz.

Precisei ter forças para mantê-lo em pé, pois o mesmo cambaleava de um lado para o outro. Ele não tinha forças para ficar em pé por conta própria.

— Se continuar sangrando desse jeito, não vai sobreviver — eu concluí em voz alta.

— Eu sei — ele engoliu sua própria saliva — É por isto que deves ir.

— E deixar-te aqui? — perguntei incrédula — nunca! — exclamei.

— Eu serei um peso morto para você. Irei atrasa-la — ele disse sonolento.

— Eu não vou te deixar aqui, Henry — eu afirmei olhando firmemente em seu olhos. Ele assentiu, cansado.

Eu precisava estancar o ferimento ou ele morreria rápido. Por isso, rasguei a barra de minha capa e amarrei em torno de sua cintura, fazendo um forte nó que pressionava a ferida. Ele gemeu com a dor.

— Isso vai te dar mais um tempo — eu sorri, sem mostrar os meus dentes — agora, você sabe algum lugar seguro para onde eu possa te levar? — perguntei a ele que parou um pouco para pensar.

— A taberna de Jack — ele concluiu depois de um tempo.

— Tem certeza que podemos confiar nele? — perguntei com um pé atrás. Era muito arriscado.

— Absoluta — ele disse e eu assenti. Não por confiar no Jack, mas por confiar nele.

— Que seja o que Deus quiser — eu disse, o ajudando a montar em Tempestade.

Seria uma longa noite.

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Demorou, mas saiu!
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