07. o sol da paternidade

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LARA

Depois de duas horas encarando a traseira do Volvo no Túnel Holland, Lara viu, pela primeira vez, Jersey City, Nova Jersey. A placa vermelha com o sol em dourado na saída do túnel era quase mágica para ela, que desde que pisara na América nunca deixara Nova York e seus arranha-céus. Os carros buzinavam, os bombeiros e policiais faziam o melhor para ordenar aquele trânsito caótico, mas para Lara tudo parecia certo porque, depois de tanto tempo, finalmente estavam a caminho de Gérard.

E quando chegarmos lá, tudo será perfeito. Lara sorriu ao pensar no marido, na surpresa dele ao ver as crianças saindo do carro, ao vê-la correr em sua direção. O cenário perfeito de felicidade.

Gérard havia se mudado para Miami há quatro anos para trabalhar como motorista, e só falava com a família pela internet — que Maria conseguia roubar de Damian — através de e-mails porcamente escritos e conversas entrecortadas pelo computador. Ele vivia dizendo que o trabalho era sofrido, mas que assim que possível voltaria com dinheiro, porque agora trabalhava de motorista para uma madame ricaça que dá até salmão para os cães, Lara!

Lara não se importava tanto com o dinheiro de Gérard, mas a vida seria mais fácil se ele enviasse dinheiro para as garotas e se ela não precisasse se equilibrar entre o emprego de caixa de mercado e garçonete de pub para sustentar a casa. Lara sabia que Gérard não contribuía porque ganhava pouco, porque eu também tenho de me sustentar aqui, minha bella, dizia ele. Maria o chamava de stronzo, mas Lara sabia que, se pudesse, o marido estaria ali com ela e não em outro estado ganhando a vida.

Ela observou a aliança de bronze na mão esquerda e o coração se aqueceu no peito. Em breve estaremos todos juntos, e ele vai me ajudar a sair dessa, Lara repetia a si mesma desde que aprontara as mochilas das garotas para a viagem. Pelo canto do banco, Lara viu Maria encostada no vidro e desviou os olhos assim que a irmã mais nova sorriu em sua direção.

Preciso contar, meu Deus. Lara girou a aliança no dedo, pensando em como diabos abordaria o assunto com Maria, quando sentiu a mãozinha de Alessia cutucar seu ombro.

— Sim, querida? — perguntou ela.

— Preciso fazer xixi, mamma.

O sorriso de Lara sumiu.

Procurando por auxílio, ela olhou para Damian. Ele tinha aquele olhar de quem nada enxerga no rosto cansado e mal barbeado. Se Lara estivesse certa — e ela possivelmente estava — Damian não ouvira o pedido de Alessia pelo banheiro. Passaram por um posto de gasolina. Alessia se contorceu.

— Mamãe...

— Não vamos parar — disse ele.

Lara virou o rosto para Damian. O tom de ordem foi tão claro que ela ficou em silêncio, engolindo as palavras grosseiras feito fogo em brasa.

Ela dissera a Amy que ele não era um stronzo, mas por mais que tentasse ver o lado bacana de Damian, Lara começava a pensar o contrário. Talvez a garota estivesse certa. Talvez ele não passasse de um americano imbecil.

Pararam no farol vermelho. Ela olhou para trás, procurando por apoio. Lá do fundo, o Sr. Greene entregou uma garrafa à Maria sem erguer a cabeça.

— O que é isso? — perguntou a irmã.

— Para... Alessia fazer... xixi.

— Ela é uma menina, cara. — Maria franziu o cenho, atirando a garrafa no chão. — Meninas não mijam em garrafas.

Ele se recolheu com as bochechas coradas e voltou a assistir o joguinho de Amy.

Lara se virou, o sangue fervendo. Por que ninguém nunca a ajudava? Damian dirigia com os ombros curvados.

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