11. as luzes néon do preconceito

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LARA

A viagem pela Carolina do Norte, o Estado Do Calcanhar De Piche — há muito Lara havia desistido de tentar entender todos aqueles apelidos que os americanos davam aos estados — estava tranquila. A tarde dava lugar a um céu de azul escuro, carregado com nuvens cinzentas e Lara queria, mais do que tudo, tomar um banho e esticar as pernas. O silêncio no carro era estranho e, pelo retrovisor, ela espiou as filhas cochicharem no banco de trás.

Giorgia e Alessia faziam planos — em italiano, que orgulho — para o destino da cartela de tatuagens das Princesas que Will encontrara debaixo do banco. Ela sorriu para as meninas e se ajeitou melhor no banco do carona. O rádio estava desligado, e fora o som dos cochichos e risadinhas, ouvia-se apenas o murmúrio do ar-condicionado e dos grunhidos de Damian.

Intrigada, Lara deu uma boa olhada no vizinho. Ele olhava de um lado para outro da estrada e coçava a barba por fazer. Sua camiseta cinzenta estava amarrotada, e os olhos injetados lhe davam a aparência de um daqueles mendigos malucos que anunciam que o fim está próximo.

— A maldita pousada de Will não chega nunca — reclamou ele, dividindo a atenção entre o GPS e a estrada que escurecia. — Eu só preciso chegar. Eu só preciso chegar.

Lara riu e se virou para a janela.

— Qual é a graça? — perguntou ele.

— Você sempre repete as coisas quando fica nervoso — respondeu ela. As sobrancelhas de Damian se ergueram. Ela deu de ombros. — Quando surtou antes do acidente, você repetia a mesma frase como se fosse uma velha...

— Certo, Lara, já entendi. Muito obrigado — Um pequeno sorriso atacou o rosto de Damian, que voltou à procurar pela pensão. Virando a cabeça um pouco para trás, elevou o tom de voz para falar com os outros: — Se alguém avistar a Pensão do Rob Alegre, já sabem o que fazer.

— Por que tudo na América tem de ser alegre? — A voz rouca e monótona de Amy veio lá de trás. Lara sorriu. — Taco Alegre, Rob Alegre. Que país carente e hipócrita.

— E você está aqui há três dias. — Maria riu. — Imagine para quem está há mais de dez anos.

Damian franziu o cenho, virando o rosto para Lara.

— Vocês estão aqui há tanto tempo assim?

— Doze anos — respondeu ela, na esperança de que o assunto fosse liquidado.

— Doze anos nessa porcaria de país para viver com menos de quinhentos paus por mês — reclamou Maria. Lara desviou os olhos ao sentir que Damian prestava mais atenção em suas bochechas vermelhas do que na estrada. — Sonho americano é o meu...

— Se aquela coisa cheia de luzes néon cor-de-rosa for a Pensão do Rob Alegre — interrompeu Amy —, então acho que chegamos.

Na noite que caía, a Pensão do Rob Alegre se parecia mais com um clube barato de strip-tease do que uma parada honrada para viajantes. Uma placa de néon cor-de-rosa com a caricatura assustadora de um homem de barba sorridente indicava a entrada para a pequena pensão. Feito uma criança que recebe um saco de doces, Damian estacionou debaixo de uma árvore e desceu. Apoiando-se na janela, ele disse:

— Vou conseguir os quartos! Já volto.

Antes que Lara pudesse intervir, ele saltitou pelo estacionamento, sumindo atrás das portas da pensão. Ela virou o rosto para frente, pensando. Se não conseguia pagar por um quarto antes, quando tinha dois empregos, agora que havia perdido o bico de garçonete no pub do Sr. Lee, seria impossível. E Maria não faz nem ideia. Se a irmã achava ruim viver com menos de quinhentos dólares por mês, ela com certeza não gostaria de saber que o dinheiro diminuiria ainda mais. Preciso encontrar outro bico e contar para ela. E rápido.

Sete Lugares | ✓Where stories live. Discover now