35. a captura do inigualável ninja ruivo

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WILL

Sentado no sofá da sala de Damian na agência, Will suspirou pela décima vez seguida. Descascando com a unha o velho braço do sofá de couro negro, ele pensou em mil maneiras de fazer o amigo se calar, mas sabia que seria inútil. Damian andava de um lado para outro da sala envidraçada, esfregando as mãos.

— Hoje será o dia — disse ele. — Hoje será o dia!

Will fechou a cara, enterrando os dedos no braço do sofá.

— Você não entende, não é?

— Sem lamentações, William. Hoje será o dia em que, finalmente, você convidará Maria para almoçar.

Através das lâminas da persiana branca da sala, Will observou Maria trabalhar no balcão de cópias, carregando pilhas de folhas e abrindo a tampa da fotocopiadora. O suor de suas mãos mancharam o couro do sofá por um segundo.

Cerrando os punhos e ajeitando a postura, ele disse:

— Não quero mais. Já passou.

Will fez o melhor que pôde para manter a atitude distante e desinteressada, mas era impossível esconder suas emoções quando o nome de Maria surgia na conversa. A viagem havia terminado há dois meses e algumas semanas, e diferentemente de todas as expectativas, Will fugia do balcão de cópias.

Ele, que gostava tanto de palavras, sabia que as ilusões cobravam um preço alto pelo cultivo, logo, procurava evitá-las. Os momentos que dividiu com Maria na viagem foram ótimos, mas insuficientes para gerar uma relação de qualquer natureza. Fora um sorriso aqui, um cumprimento ali e um aceno ocasional na hora do almoço, Will evitava a companhia de Maria. Ali, na agência, era o chefe dela e nada mais.

Corado pelo olhar profundo de Damian, fechou a cara. Odiava ser encarado.

— As coisas estão bem assim — afirmou ele. — É o que basta.

— Três anos, Will. Há três anos você enfia vales da Casa do Waffle pela porta, compra a revista preferida dela e faz tudo o que pode para fazer Maria feliz. Mesmo assim, você nunca a chamou para...

— Nunca fiz essas coisas esperando algo em troca, Damian.

A frase saiu com um pouco mais de raiva do que necessário, mas Will não conseguiu se controlar. Damian era seu único amigo, e o único que sabia como destruir sua paciência como ninguém.

Sabia que há três anos, desde que vira Maria saindo para levar o lixo, fazia tudo por ela. Os cupons de descontos, a revista preferida, as encomendas "entregues por engano" e até o emprego eram apenas consequência do sentimento que o envolvia. Will queria que Maria fosse feliz, com ou sem ele.

De certa forma, saber que tinha o poder de trazer um sorriso ao rosto dela era muito melhor do que convidá-la para um encontro. Pelo menos assim ele tinha certeza de que não a decepcionaria. Ninguém fica triste com cupons da Casa do Waffle.

Damian, por outro lado, não parecia convencido. Erguendo uma sobrancelha e soterrando Will com aqueles olhos azuis, ele perguntou:

— Você não se sente... solitário?

O tempo todo.

— Não.

— Você vai precisar fazer melhor do que isso, campeão. — Damian riu, dando aquela piscadela sabichona que nunca falhava em deixar Will com uma carranca. Ele pegou as chaves do carro, ajentando alguns papéis sobre a mesa. — Vou almoçar com Amy. Talvez me atrase para a reunião.

Will esboçou o primeiro sorriso sincero desde que entrou na sala.

Naqueles dois meses, a aproximação dos dois era lenta, regada por almoços, jantares, sessões de videogame e pizzas das quais Will nunca falhava em marcar presença. Apesar da falta de jeito e de nunca usarem a terminologia correta, era fácil perceber que os dois eram pai e filha. Damian e Amy eram tão parecidos que chegava a ser cômico.

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