Capítulo 5 - Um lugar para crianças órfãs (Flashback)

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Carmerrum não era o país mais agradável do mundo para duas crianças órfãs que não tinham sustento e cuja única moradia estava marcada pelos Eran, com um defunto em putrefação se decompondo há mais de dois meses. Defunto esse que um dia fora a amada Gara Nalan, mãe de Quentin e Loenna Nalan.

Os gêmeos já haviam completado onze anos, e neste pouco tempo sem sua genitora já haviam definhado até seus rostos e corpos se tornarem cadavéricos. A maneira com que Quentin tinha de lidar com a fome era pedindo esmolas para os transeuntes que ali passavam; Estes geralmente fechavam a cara e seguiam seu caminho de forma a ignorar completamente o garotinho maltrapilho de onze anos, mas algumas almas boas agraciavam-no com algumas moedas de prata. A cidade dos Saphira era onde os ricos eram mais generosos (Ou, melhor dizendo, menos mesquinhos) e por isso era para lá que os gêmeos haviam se dirigido.

Já Loenna não era nem um pouco carismática. Assustava as pessoas com sua expressão carrancuda e seu jeito pouco delicado tornava as coisas mais difíceis. Não, ela definitivamente tinha outros meios de obter comida, ainda que estes envolvessem os meios menos higiênicos possíveis.

E era exatamente o que a garota estava fazendo naquele momento, mergulhando na lata de lixo de um restaurante Saphira, buscando por restos de comida aproveitáveis que ela pudesse se alimentar. Achou um pudim que havia sido jogado fora quase inteiro e um sanduíche em que estava demarcada a primeira mordida, mas parecia em bom estado.

Esses ricos... ー Murmurou ela. ー Sempre desperdiçando comida.

E seguiu remexendo nos restos de um outrora banquete que os Saphira haviam rejeitado. Era possível retirar muita comida dali, pensou ela. Partiu o sanduíche ao meio, comeu metade e guardou a outra metade para Quentin. E se mexia dentro da lata, buscando algo para complementar seu almoço...

Ei! ー Uma voz pode ser ouvida. ー O que está acontecendo?

Loenna imediatamente se pôs em alerta. Esgueirou-se para fora da lata do lixo e vislumbrou, com seus próprios olhos, uma madame muito bem vestida e maquiada. Era uma Saphira e Loenna pôde identificá-la como tal porque trazia o símbolo da família em seu antebraço direito; Na mão esquerda, carregava uma vassoura.

Saia daqui, menina! ー Disse ela. ー Você está atrapalhando o meu negócio.

Eu só estava procurando comida. ー A garota não era de muitas palavras. ー Vocês desperdiçam muita e eu estou com fome.

ー Vou ter que expulsá-la daqui? ー A madame deu uma dolorida vassourada em Loenna. ー Xô! Xô!

Loenna protegeu a cabeça das vassouradas e saiu correndo em direção a um beco escuro para esquivar-se dos golpes da madame. A mulher chegou a persegui-la e golpeá-la ainda por uma boa parte do trecho, como se a menina fosse um animal inoportuno e não uma criança com fome, mas desistiu quando percebeu que Loenna não iria tornar a atrapalhar sua paz.

E, após a correria, só restou a Loenna respirar fundo. De fato, aqueles ricos eram todos maus. Desperdiçavam comida e não deixavam uma menina com fome se alimentar sequer de suas sobras.

Quentin estava do outro lado da rua pedindo dinheiro a quem passava. Alguns depositavam dinheiro na caneca que ele tinha, outros passavam reto fingindo que o moleque não estava ali. Era um garotinho de onze anos, magro, mirrado e delicado que precisava de moedas de prata para sobreviver... Como alguém podia negar algo a ele?

Pessoal! Pessoal! ー Loenna aproximou-se de Quentin. Era assustador ver a marca de seus ossos por trás da pele pálida; Seus lábios já não tinham cor e ele provavelmente seria desmontado na primeira brisa. ー Me dá uma moedinha, pessoal! Eu sei dar uma cambalhota. Me dá uma moedinha que eu dou uma cambalhota.

Caos e Sangue | COMPLETOWhere stories live. Discover now