Capítulo 6 - Uma conversa consigo mesma.

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Loenna puxou seu capuz para cima e se esgueirou por entre as ruínas dos subúrbios de Carmerrum, um local tão miserável que os olhos chegavam a sangrar. Eram garotos descabelados e sujos pedindo por comida, homens visivelmente esgotados que carregavam sacos de cimento de cima a baixo e mulheres que corriam de um lado para outro em uma feirinha sem clientes. Aquilo fazia o coração da garota apertar; Era um cenário horrível e desesperador.

Enquanto a assassina caminhava rumo ao seu destino, foi parada por uma criança. Uma menina de sete ou oito anos, magrinha e mirrada. Tinha cabelos louros e usava uma manta encardida.

Moça... ー Ela disse, com sua voz sôfrega. ー Você têm uma moedinha?

Loenna suspirou fundo. Guardava alguns trocados dentro do capuz. Retirou-o da cabeça, pegou as três moedas de prata que ali estavam e as entregou para a pequenina.

Tome. ー Loenna puxou o capuz para cima novamente. ー Espero que lhe seja útil. É tudo o que tenho.

A garota agradeceu, sorriu e correu para um adulto que sentava sozinho nas ruínas de Carmerrum, também pedindo dinheiro aos transeuntes. Loenna suspirou fundo; Como podiam eles, os Eran, os Kantaa e os Saphira, verem tudo isso acontecendo e não fazerem nada? Como podiam eles se preocuparem apenas com seus próprios projetos de poder, ignorando as milhares de pessoas que lutavam para sobreviver todos os dias?

E, quando alguém tentava reverter essa realidade, era violentamente massacrada por eles. Loenna bem sabia disso; Ela estivera no centro de uma dessas desgraças.

Dói, não doi? sua mente refletiu instantenamente. Era ela ali, a parte de sua consciência que ela queria ignorar. Aquele era um assunto dela com ela mesma; A única que compreenderia na totalidade suas indignações e súplicas.

Sim, dói, Ela admitiu para si mesma. Dói porque essa gente é gente como eu. Nasceram sem berço, assim como eu. Queria que todos tivessem a oportunidade de viver de maneira digna, mas só alguns podem.

E eu contribuo para tudo isso.

Imediatamente, assustou-se com aquele pensamento. Piscou algumas vezes. Que tipo de verdade inconveniente era aquela?

Não, não contribuo, ela disse para si mesma, mas não parecia acreditar em sua própria defesa; Era como se os repetisse aquilo apenas para se confortar. Afinal, eu só mato Eran, Kantaa e Saphira. Jamais coloquei as mãos em um dos pobres coitados que habitam Carmerrum.

Subitamente, Loenna desferiu um tapa contra si mesma. Não, Loenna, deixe de ser estúpida. Como você acha que eles perpetuam seu projeto de poder? Eles lutam entre si mesmos para se tornarem mais ricos e fortes. Não lutam contra nós porque nós somos irrelevantes. Contra nós, eles já venceram. Eu poderia usar meus dotes para o bem, mas eu os uso para servir aos poderosos.

O vento sibilou ao longe. Havia algumas pessoas passando pela rua, mas nenhuma delas parecia lhe dar atenção. Loenna estava sozinha com este pensamento desagradável.

Mas eles são mais fortes que eu, ela tentou se convencer. O sistema já está montado. Eu sou apenas mais uma engrenagem dele, e não alguém realmente relevante. Eu jamais serei... Jamais serei ela. O que faço, é porque preciso sobreviver. E eles tem dinheiro.

Seus braços tremeram; Sua mente já estava formulando outra resposta desagradável.

Por isso eu ajo como sua serva? Pensou, revoltada consigo mesma. Eu sou uma cadelinha dos Eran. O que me difere de um de seus cães?

Caos e Sangue | COMPLETOWhere stories live. Discover now