Capítulo 29 - Um homem arrependido

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Com licença. — Chamou um homem de cerca de 35 anos; baixinho, careca, maltrapilho e cujos óculos grossos estavam completamente embaçados. Ele parecia derrotado, desanimado, acabado, abandonado. Apenas mais um bêbado perdido no meio do bar. A senhora pode me ver mais uma dose, fazendo favor?

Era a quinta dose de cachaça do homem, notou Soraya. De todos esses anos em que administrava sozinha aquele pequeno bar, havia identificado alguns espécimes que ela preferia tomar distância; Um deles era o do típico homem que bebia demais e arranjava confusão com seus pares antes de ir embora.

Este homem em específico não estava acompanhado e não parecia nada agressivo, pelo contrário: Estava incrivelmente triste, entregue à bebida como sua única companheira, soava amargurado e infeliz. Possivelmente mais um caso de abandono pela mulher amada, arriscou.

De qualquer forma, pouco importava para Soraya o quanto o homem bebia ou a razão de suas mágoas, desde que ele pagasse o que consumia e não arrumasse confusão no bar.

Ainda com o cigarro na boca, Soraya abriu uma nova garrafa de cachaça e a despejou no copo do homem melancólico. Anotou algo em um bloco de papel e o homem agradeceu, tomando mais um gole da bebida. A desgraça era visível em seus pequenos atos.

Senhor? — Não havia forma educada de dizer ao homem que temia suas possíveis rusgas, mas ela podia ao menos saber com quem estava lidando. Posso tomar conhecimento de como se chama?

O homem tirou seus óculos e limpou os olhos.

Rhemi, minha senhora. — Disse ele. Rhemi Gaspez.

Soraya arregalou os olhos. Aquele nome era conhecido dela, ah se era. Mas aquele que o devia carregar não usava o sobrenome Gaspez, usava o sobrenome...

Imediatamente, Soraya deu um tapa no rosto do homem. Rhemi levantou-se, confuso, pronto para dizer alguma coisa, mas a dona do bar se pôs na frente:

Jamais ouse carregar este sobrenome. — Seu rosto estava tão vermelho quanto a palma de sua mão. Rhemi ainda apalpava a mancha vermelha no rosto, extremamente confuso. Você o renegou aos oito anos de idade, quando foi reclamado pelo seu pai.

Naquele momento, tudo passou a fazer sentido para Rhemi; Seus olhos se esbugalharam, a respiração pesada de Soraya entregava tudo.

Mãe? — O próprio Rhemi era incapaz de processar a informação; Depois de tantos anos, tanto tempo, reencontrar-se com a própria mãe era a última coisa que passava pela sua cabeça. Nem mesmo em seus sonhos mais visionários isso fora possível. - Achei que estivesse morta...

— Eu forjei minha própria morte, porque perdi você e não queria perder Gillani. — Soraya tentava transparecer confiança, mas tremia da cabeça aos pés. Eu fiz isso para protegê-la. Agora, me diga, por que você carrega o sobrenome que renegou? Você é um Saphira agora, não é?

Os olhos de Rhemi se encheram de lágrimas. Ele não parecia muito disposto a falar sobre isso.

Eu não sou mais um Saphira. — E, tristonho, encarou o chão. Eu renunciei ao sobrenome e a família. Tomei decisões as quais me arrependi, entendi que a riqueza me corrompeu. Não quero mais ser um Saphira, quero retornar de onde saí.

Soraya encarou Rhemi com um olhar piedoso. Ele poderia ter renegado suas origens há tantos anos atrás, era verdade, mas sua dor parecia tão sincera... A marca azul em seu braço estava coberta de cicatrizes, era como se ele houvesse tentado retirar o símbolo da família a sangue frio, escarificando a pele. Parecia arrependido, com um pesar enorme. E quanto ao que ele havia feito no passado... Afinal, em seu lugar, quem não faria o mesmo?

Caos e Sangue | COMPLETOWhere stories live. Discover now