Capítulo II

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Dizer que eu estava assustada seria certamente um eufemismo errôneo, estava petrificada. Nunca havia visto alguém como aquele homem, se era mesmo um homem. Seu olhar me percorreu, e, estranhamente, cada centímetro do meu corpo se arrepiava, se era por medo ou outra coisa, até aquele momento eu não sabia.

- Será que posso mesmo?

- Seres das terras são algo realmente intrigante, não acha?- disse ele, de forma lúcida. Seus olhos admiravam o céu, parecia sentir uma saudade, como se há muito tempo não o visse.

- Se me acho intrigante? Certamente não. Talvez entediante.

- Homens e suas guerras sem sentido, sim, é entediante. Mas suas limitações racionais e egoístas são intrigantes por certo.- debochou, se sentindo superior, se assim posso dizer.

Não estava gostando do rumo desta conversa, porque desconhecia seu rumo. Por algum estranho motivo, sua presença me causava um desconforto, mas não necessariamente ruim, era um despertar. Ao chegar mais perto, pude sentir o cheiro de água fresca em sua pele, era ótimo. Seus adornos brilhavam com a luz da Lua, eram ouro? Não fazia ideia, porém eram lindos.

De repente, percebi eu que estava encantada demais, me sentia enfeitiçada, como se sua aura me puxasse para um outro lugar, um lugar a que ele pertence. Não, algo estava realmente errado.

- Saia de perto, Jaci.

- Jaci?- ele respondeu, aproximando-se ainda mais.

- Sim, Jaci. A Lua. Não me lembro da história, mas não quero me tornar vitória-régia.- ok, certamente você, caro leitor meu, deve achar que sou louca, ou no mínimo deveras aleatória. Contudo, tente se colocar no meu lugar, estava nervosa, meus pensamentos misturados às palavras, e a lenda da Vitória-Régia foi a primeira coisa que me veio à mente como medida de comparação.

- Não te transformarei numa vitória-régia, se é isso que te preocupa- disse, rindo de mim. Sua gracinha estava já me irritando- Poderia pensar num camarão, que tal?

- O quê???- meus olhos deviam ter saltado porque ele passou a gargalhar, e infelizmente, sua risada também era reconfortante.

- Calma, humana, não farei tal coisa. Ainda.- sorriu levemente- Só queria saber o que está fazendo em minha praia, nunca vejo ninguém por aqui.

- Sua praia?- disse eu meio cansada, ele demonstrava certa rigidez sobre o que pensava, o que era quase insuportável- Pelo o que estou vendo ao redor, não há placas com seu nome...- agora era eu quem estava se aproximando. Caramba, eu só queria lavar os pés e dormir. Era pedir demais?

- Namor. Me chame assim.

- Ok, senhor alado, não há nenhuma merda de placa aqui, por que, então, minha presença o incomoda?- o apelido parecia ter o irritado, mas não o bastante para evitar um pequeno sorriso.

- Não incomoda. Mas não entendo. Todos têm medo desta praia, a evitam, justamente por minha causa, ou melhor, pelas lendas que inventam. É curioso ver um de vocês por aqui.

- Melhor ir se acostumando então, pois continuarei por aqui por um bom tempo.

Logo após afirmar, olhando-o fixamente para demonstrar que estava dando um ponto final à conversa, me virei. Só pode ser um sonho, pensei, por isso passei a voltar para casa. À essa altura, estávamos na parte rasa do mar, onde as pequenas ondas borbulhantes batem, finalizando seu rumo. Foi então que ele agarrou meu pulso, mas, num rápido reflexo, fiz a água ao redor de sua mão queimar. Ele a retirou de mim no mesmo momento.

Pronto, eu deveria ter previsto. Sempre evitei para que ninguém percebesse minha afinidade, acho que este é o termo adequado para essa peculiaridade até este instante, à água. Mas, por algum motivo inexplicável, não pude me conter perto do senhor alado, ou melhor, Namor. Ainda sim, esta era parte da minha vida que eu queria guardar para mim apenas, algo especial e único que eu com certeza temia, porém também admirava, assim com el... Não. Devia me lembrar que era somente um sonho ridículo sobre um homem do mar com asas. Viu? Soa loucura pura.

Fiquei encarando-o, e recebi o olhar de volta... Ele estava encantado? Surpreso?

- Mas o que...- disse, de forma admirada, queria saber mais?

- Não. Esqueça isso. Tchau.

Saí em disparada, eu vim justamente para ter meu sossego, minha paz. Não seria ele a mudar meus planos. Entrei em casa, fechei e tranquei as portas. Sonho ou não, era melhor garantir. 

O Mar de Talokan // MarvelWhere stories live. Discover now