Capítulo 28: A realeza nunca é confiavel.

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Estávamos em algum ponto do bosque das fadas. Algumas coisas no reino eram fáceis de serem reconhecidas, mas outras pareciam diferentes demais pra mim. Seth estava me guiando por um caminho de pedra, enquanto minha mão descansava no seu braço e eu observava as árvores e arbustos floridos ao nosso redor, com os pássaros cantando.

Fitzy estava a alguns metros a nossa frente, parecendo vasculhar a floresta em busca de algum problema. Haviam outros dois guardas mais atrás de nos. Mas todos estavam longe o suficiente para que pudéssemos conversar sem ser ouvidos.

—Me lembro que o antigo território dos elfos era parecido com esse bosque. —Seth murmurou, arrancando a folha de uma árvore e a observando na palma da sua mão. —Alguns antigos diziam que os elfos tinham uma certa ligação com a floresta e as águas. Que éramos ligados diretamente a elas. Nossos primeiros ancestrais andaram pelos mundos espalhando as sementes que deram origem as florestas que hoje tomam conta de todas as dimensões.

—Você acredita nisso? —Indaguei, observando a folha que estava na mão dele voar para longe até se depositar no chão. —Na ligação com a floresta.

—Sim, eu acredito. Sempre me senti muito mais livre e forte quando estou em um lugar como esse. Como se a floresta estivesse falando comigo. —Ele deu de ombros, parecendo pensar longe. —Tem muitas coisas que são inexplicáveis, não é? Somos mortais, ligados à natureza, mas sequer pensamos nela como nossos ancestrais faziam.

Olhei para Seth, observando seus olhos varrerem cada canto daquele lugar, antes de nosso caminho de pedra se transformar em uma pequena ponte de madeira que passava sobre um riacho. Fitzy já havia atravessado ela quando eu e Seth colocamos os pés na mesma.

—Pode ir, Fitzy. Nos encontramos daqui a pouco no vilarejo. —Seth afirmou, e Fitzy apenas assentiu com a cabeça, fazendo uma reverência com um sorriso pequeno antes de entrar no bosque e desaparecer.

—Onde ele vai? —Indaguei, enquanto nós dois atravessávamos a ponte. Agora só restava aqueles dois guardas atrás de nós, alheios a qualquer coisa que fazíamos.

—A mãe de Fitzy mora aqui no bosque das fadas. Em uma casinha um pouco afastada do vilarejo. —Seth parou no meio da ponte, se virando para observar a água que corria pelas pedras. —Ele vai visitá-la e depois nós encontrará.

—Ela vive sozinha? —Ele balançou a cabeça que sim. —E o pai dele?

—Está morto. —Seth me olhou, antes de simplesmente dar de ombros e voltar a andar, me obrigando a acompanhá-lo.

[...]

O pequeno vilarejo no bosque das fadas era em sua maioria, como eu esperava, elfos. Poucos humanos viviam ali, parecendo se esconder nas sombras quando viram o príncipe, como se estivessem com medo o cruzar o caminho dele. Alguns evitavam olhar até mesmo pra mim enquanto faziam reverências quando passávamos.

—Veja... —Seth indicou o céu, onde eu pude ver  a sombra do que pareciam milhares de fadinhas voando no céu, vindo para o vilarejo. —O que sabe sobre essas fadinhas?

—Minha mãe gostava contar que elas eram seres de grande sabedoria e que podiam viajar pelos mundos usando somente sua magia. —Falei, olhando para todas aquelas pequenas criaturas quando elas voaram por cima de nós, deixando cair alguns pozinhos sobre nossas cabeças, enquanto falavam umas com as outras em outra língua. —Elas costumam ajudar aqueles que merecem e que tem boas intenções.

—Isso. Exatamente isso. —Seth concordou, enquanto nós dois nos virávamos para ver pra onde as fadinhas estavam indo. E Seth soltou uma risada alta e genuína ao meu lado quando a maioria delas pousou em Fitzy. Na sua cabeça, ombros, braços e em qualquer canto que pudessem ficar, enquanto ele permanecia imóvel e surpreso.

—Parece que elas gostaram de você. —Comentei, quase sorrindo ao ver a expressão tranquila no rosto, diferente do que sempre exibia quando estava no castelo. Talvez a visita que fez a mãe o fez bem.

—Venha, vamos entrar em uma das lojas. —Seth chamou, voltando a me guiar pelas ruas.

Entramos na primeira loja, decorada com tapetes e lenços, além de pedras brilhantes que variavam entre todas as cores que eu poderia imaginar. Seth se afastou de mim para falar com Fitzy na porta, enquanto eu caminhava pelo local e via os tapetes e lenços bordados, que parecia ter vida própria. Além das pedras que eram vendidas como pingentes.

—Gostou de algo, vossa alteza? —Uma voz feminina indagou ao meu lado. Me virei, absorvendo primeiro os cabelos volumosos, castanhos e encaracolados. Antes de ver a pele negra e os olhos claros que me observavam. Ela não deveria ser muito mais velha que eu. Era uma humana, talvez no auge dos 22, 23 anos.

—É você quem faz os lenços? —Indiquei os mesmos, observando os olhos dela desviarem dos meus para os tapetes.

—Não. Eu apenas os coloco a venda e fico com uma pequena parte do que é ganho. —Ela deu de ombros, passando a língua nos lábios. —Não estamos acostumados a receber visitas da realeza aqui.

—O príncipe queria me mostrar o reino. —Falei, sabendo quem eu precisava ser ali. —Não sou daqui. Então não conheço absolutamente nada.

—É claro. O rei jamais permitiria que o filho se casasse com uma humana daqui. Mas uma de Castylha e ainda com os pés na realeza? Faz total sentido. —Afirmou, em um tom que certamente não soava agradável.

—Isso a incomoda de alguma forma, senhorita...?

—Lena. —Ela abriu um sorriso duro, enquanto eu ficava imóvel e sequer respirava ao ouvir ela dizer aquele nome. —Meu nome é Lena. Não me incomoda. Só estou falando o que penso. O rei está buscando a aliança com os outros reinos. Como um reino elfo, ele precisa de garantias, certo?

Olhei pra ela por alguns segundos, absorvendo a visão da humana que estava na minha frente, falando tão abertamente com a realeza com alguém que faz parte dela. Falando abertamente sobre algo que ela luta contra, por baixo dos panos.

—Tem razão. Ele precisa de garantias. —Concordei, umedecendo os lábios com a língua.

—E é por isso, vossa alteza, que a realeza nunca é confiável. —Ela sorriu pra mim, exibindo os dentes alinhados e brancos. —Eles fazem o que está ao alcance deles para ficar no poder.

—Todos fazem, Lena. Não só elfos, como humanos também. Temos excelentes exemplos por aí. —Afirmei, dando de ombros. —Mas estamos falando sobre lenços e não sobre a realeza.

—Claro. —Ela riu, enquanto eu percebi o quanto aquele jogo entre humanos e elfos estava ficando interessante. —Estamos falando sobre lenços.

[...]

Não esperei muito quando voltamos ao castelo. Fiquei feliz pro Seth não citar mais a conversa da noite anterior, tinha certeza que não seria mais tão racional como fui da primeira vez. Não queria pensar naquilo, porque tinha certeza que deixaria a raiva falar mais alto.

Então quando voltei para o quarto pedi que Sarah me arranjasse um frasco pequeno. Ela fez isso seu perguntar o porquê, mesmo que parecesse completamente curiosa sobre o meu pedido. Quando voltou com o mesmo, eu peguei de volta a adaga que havia ganhado de presente, fazendo um pequeno furo dolorido e latejante na ponta do meu dedo, antes de deixar o sangue pingar dentro do frasco.

—Preciso que vá até aquela bruxa de novo. —Falei, observando os olhos de Sarah fixos no que eu estava fazendo. —Entregue isso a ela e algumas moedas. —Fui até meu armário, pegando algumas moedas do saquinho que Seth havia me dado e então fui até onde Sarah estava e entreguei os dois a ela. —Peça para que ela prepare uma poção do amor.

—O que vai fazer? —Sarah arregalou os olhos, ficando um pouco assustada.

—Vou fazer o general se apaixonar por mim. —Afirmei, vendo Sarah estremecer ao ouvir aquilo. —Então vou arrancar cada informação que conseguir dele.



Continua...

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