Capítulo 58: Envenenada.

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As horas passavam tão lentamente, como a noite que jamais terminava do lado de fora. Meu corpo estava rígido contra o chão frio, enquanto eu contava minha respiração e quantas vezes meu coração batia, ao mesmo tempo que minha mente parecia vagar por cada pensamento incompleto.

A rainha havia morrido, mas parecia que eu havia sido a verdadeira envenenada ali, porque estava de volta a uma cela. Estava de volta aos meus próprios pensamentos e pesadelos. Estava trancafiada dentro da minha mente solitária. Só haviam paredes de pedra e meu corpo frio e duro contra o chão.

Eu estava sentada com as pernas cruzadas embaixo de mim. O vestido parecendo apertar meu corpo e esmagar meu interior. Podia sentir o peso daquela adaga escondida ali, que os guardas não faziam ideia. Meus olhos estavam na parede, enquanto eu ouvia passos se aproximando atrás de mim, depois daquelas grades que me impediam de sair de lá.

—Era isso que você ficava fazendo quando estava naquela torre? —A voz do rei chegou aos meus ouvidos, me fazendo fechar os olhos e engolir o nó na minha garganta.

Estava esperando por Seth, mas ele havia aparecido apenas nos meus pensamentos.

—Ficava olhando para as paredes? Talvez falando sozinha? —Ele soltou uma risadinha, enquanto eu permanecia de olhos fechados. —Criando um plano na sua cabecinha de como acabar comigo? —Quando continuei sem responder, ele suspirou. —Eu estava certo no final das contas, você é esperta, mas não o suficiente. Talvez se não tivesse deixado Seth entrar na sua cabeça, teria ido mais longe.

—Você gosta de se ouvir falar, não é? —Comentei, umedecendo os lábios com a língua quando abri os olhos e o encarei por cima do ombro. —Um dia, vossa majestade, ainda irá se engasgar com a própria língua.

Ele soltou uma risada grave, fazendo meu estômago se contorcer e meu sangue ferver a ponto de virar brasas. Mas não deixaria ele me afetar. Não deixaria ele entrar na minha cabeça e bagunçar tudo que eu sabia. Eu entendia aquele jogo. Mais do que nunca, eu entendia.

—Sabe, eu entendo Seth ter escolhido você para ajudá-lo nisso. Você era herdeira perdida. Era fácil pra ele alcançá-la e trazê-la até aqui, entrar na sua cabeça e persuadi-la a fazer o que ele queria. —Falou, e eu permaneci olhando pra ele por cima do ombro, porque ele não fazia ideia de nada.

Percebi naquele momento que ele pode até ter criado Seth, mas ele não o conhecia de verdade. Ele não sabia quem era o filho bastando que havia estado ali esse tempo todo, aos olhos dele. E ele também não me conhecia. Ele não fazia ideia de com quem estava falando naquele momento.

—Seth sim é esperto. Ele foi esperto todos esses anos, usando a influência da mãe para que seus desejos fossem atendidos. —O rei esfregou o queixo, me lançando um olhar cheio de malícia. —Além do mais, olhe só pra você. Jovem, bonita, com um corpo visualmente delicioso e deve ser melhor ainda de se tocar. —Afirmou, fazendo meus lábios se enrugarem em nojo ao ouvir aquilo. Sabia de onde Zion havia puxado aquele lado podre. —Talvez, se você não tivesse feito aquilo com Zion, nós dois pudéssemos brincar juntos.

A comida chegou até minha garganta, enquanto algo frio e afiado cotava meu estômago e o fazia queimar. O rei sorriu mais ainda, provavelmente vendo a expressão de repulsa em mim.

—Não faça essa carinha, princesa. Você deve ter trepado com Seth até não aguentar mais, tenho certeza que poderia aguentar a mim também. —O sorriso malicioso dele ficou grande demais, enquanto eu desejava agarrar seu pescoço e o destroçar com minhas unhas. —Mas não gosto de mercadorias estragadas. Ainda mais daquele bastardo imundo. Ele está lá em cima, exibindo uma expressão de luto a todos. Agindo como se seu coração estivesse quebrado. Mas eu sei que ele só está esperando o momento certo pra me atacar. Mas não deixarei isso acontecer de novo. —Ele começou a se afastar, enquanto meus olhos o seguiam. —Você será enforcada ao meio dia. Aproveite suas últimas horas de vida.

Assim que ele sumiu, eu corri até o balde no canto da cela e vomitei tudo que havia comido aquele dia, sentindo meus estômago queimar como o inferno e minha garganta arder. Mas permaneci ali até meu estômago estar vazio e meu corpo trêmulo contra a parede.

[...]

Eu não dormi absolutamente nada. Todas as vezes que meus olhos ousavam se fechar, eu lembrava do momento que me arrastaram para fora do salão e Seth via o corpo da mãe. Ele a odiava. Ele a odiava mais do que odiava o próprio rei. Mas ele não conseguiu se mover quando a viu morta.

Ergui os olhos para o corredor quando ouvi um barulho, vendo um homem magrelo, usando roupas da cozinha e carregando uma bandeja de comida vindo na direção da minha cela. Seus cabelos longos estavam presos em um coque, enquanto ele me olhava com hesitação.

—Trouxe sua refeição, a pedido do rei. —Ele passou a bandeja por uma fresta embaixo das grades, ainda me olhando, com os olhos verdes arregalados. Então eu observei seus lábios se moverem, quase sem emitir sim. —Fiquem seguros e vivam, eu os encontrarei

Eu soltei uma respiração pesada ao reconhecer aquilo, me arrastando até aquela bandeja sobre o olhar atento dele. O elfo parecia pronto para aguardar que eu comesse para então ir embora.

—Qual o seu nome? —Indaguei baixinho, vendo ele olhar para o final do corredor, provavelmente onde os guardas estavam.

—Martin. —Ele quase não emitiu som.

Martin. Eu conhecia aquele nome. O amigo de Sarah da cozinha. Aquele que servia Zion e que lhe deu a poção do amor. Martin que também trabalha para os meus irmãos.

Comecei a comer, sentindo pouca vontade, mas não queria estar fraca. Não queria demonstrar fraqueza. Então comi tudo e bebi a água que ele havia trazido, empurrando a bandeja por baixo das grades para ele. Martin juntou tudo e se levantou, olhando para o final do corredor e ficando pálido.

—Vossa alteza... —Ouvi a voz estridente de um dos guardas. —O rei proibiu visitas a prisioneira... vossa alteza, espere.

—Quero todos fora! —Ouvi a voz de Seth, um pouco antes de ele aparecer, varrendo os olhos pela cela até me encontrar. —Fora, agora!

Martin correu para fora dali, parecendo assustado. O guarda tentou segurar Seth, mas ele se virou e o acertou no rosto, fazendo os outros guardas que vinham logo atrás hesitarem.

—Jamais toque em mim de novo ou tente me dar uma ordem! —Seth apontou para a saída, parecendo furioso. —Fora daqui!

Os guardas e retiraram tão rápido quando haviam chegado, enquanto eu ficava de pé e grudava nas grades ao mesmo tempo que ele. Seus lábios encontram os meus ao mesmo tempo que seus braços passavam por entre as grades e me seguravam como podiam, como se ele estivesse desesperado para me tocar. Como se por algum tempo ele acreditasse que havia me perdido.




Continua...

O Trono da Rainha Where stories live. Discover now