Capítulo I

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≈ Antônio •

Por alguns segundos a Terra parou de girar. Respirei fundo algumas vezes sentindo minha mão tremer e o espasmo muscular se intensificar. Câncer. Eu estava com câncer.

— Antônio? Você quer uma água?

Meus olhos não conseguiam enxergar o médico à minha frente. Eu respirava fundo tentando focar minha visão mas era como se a minha pressão estivesse em queda brusca.

— Não doutor, eu... eu só preciso de alguns segundos.

Forcei minha respiração algumas vezes. Os sintomas se intensificaram nos últimos meses, mas, o medo fez eu postergar até o último desmaio, em meio ao tatame da academia, a busca por ajuda. A academia... minha carreira estava acabada.

Meus olhos marejaram e o ar parecia anormalmente quente. Eu só queria chorar. Sentar e chorar, implorando por mais algum tempo.

— Antônio, nós faremos o tratamento com uma equipe multidisciplinar. Linfoma de Hodgkins tem um alto índice de cura, nós precisamos manter o otimismo e a esperança. Apesar do quadro estar avançado, ainda temos uma boa margem de tempo.

Balancei a cabeça automaticamente concordando.

— Doutor, eu não gostaria que o senhor falasse para ninguém por enquanto. Gostaria do máximo de sigilo.

— Claro, temos sigilo garantido por médico e paciente, assim que você estiver pronto para iniciar o tratamento nós começamos.

— Obrigado, te vejo em breve.

Me despedi ainda desnorteado, meus espasmos, graças a síndrome de tourette, estavam cada vez mais fortes. Dirigi sem rumo pela rodovia, praticamente em círculos, durante mais de 2 horas, indo e voltando pelos bairros. Minha mente vagava como um flashback do início da minha infância até a atualidade. O sentimento de ter vivido muito pouco assolava meu coração. Fui parar no centro da cidade. O relógio já passava das 20 horas e a lua cheia proporcionava um belo cenário iluminando o céu.

Um bar lotado surge no fim da avenida e alguns jovens felizes me fazem sorrir. Um grupo de garotos dança uma musica agitada enquanto uma garota de cabelo azul filma tudo gargalhando. Estaciono o veículo e decido me divertir. Viver, uma última noite, antes do início do tratamento que mudará toda a minha vida. Entro em um que está parcialmente vazio.

— Oi, bonitão. Qual o pedido da noite? - a atendente questiona sorrindo.

— Duas doses de whisky por favor.

Ela concorda e serve a dose. Human de Rag'n Bone Man começa a tocar alto no som do bar e eu cantarolo baixinho sentindo as lágrimas queimarem meus olhos novamente. A sensação voltando a encher meu canal lacrimal. Uma gota pinga exatamente dentro do copo de whisky e eu seco o rosto tomando mais uma dose.

— Eu não sei o que aconteceu, mas... o fim pode ser um novo recomeço. Não chora não. - viro o rosto lentamente para olhar a dona da voz ao meu lado esquerdo. A loira sorri tomando mais um gole da bebida. A encaro por alguns segundos saboreando as palavras dela. Não consigo responder então apenas sorrio balançando a cabeça.

— Coloca mais uma dose, por favor?

A bartender serve o copo e quando olho para o lado a loira não está mais lá. Procuro pelo salão e não a encontro. Por alguns segundos imagino que tenha sido uma miragem ou algo do tipo.

Pago a conta terminando o copo e sinto minhas veias queimando com o último gole. A falta de familiaridade com o álcool fazem minha visão anuviar. Caminho para fora do bar e encontro a loira mexendo no celular.

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