51ºCapitulo

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Levantei-me do meu lugar no sofá e caminhei até ao quarto em silêncio, os meus pés eram o único barulho na divisão quando me sentei no parapeito baixo da janela, havia um nó imenso na minha garganta, e a respiração do Harry do outro lado não me deixava concentrar na medida certa.

-Gostava de acreditar nisso.- Sussurrei, era difícil dizer as palavras sem que elas deixassem um gosto horrível na minha boca.

Ouve uma inspiração brusca e depois ouvi-o deitar-se, as almofadas a fazer barulho, e quase que o podia imaginar a passar o cabelo com força para trás. No entanto nada disso fazia o vazio parecer melhor, nada disso fazia a situação melhor, é difícil pensar positivamente em todas as situações quando não encontro uma solução para o problema, quando a luz está tão longe, e o túnel parece longo demais.

-Tu nem podes pensar numa desculpa Harry.- A minha respiração batia no vidro criando uma nebulosidade que deixava as luzes do exterior desfocadas.

-Não há uma desculpa para ser dita.- A voz dele era firme, mas conhecia-o bem demais, havia uma nota de medo por detrás de tudo.

-Não vou discutir sobre isso hoje.- Já estava a olhar para a cama, na esperança de poder desligar a chamada e enrolar-me sobre mim mesma e apagar.

-Posso ir buscar-te e falamos?- A pergunta dele surpreendeu-me.

-Não, estou em casa dos meus pais e não quero sair agora.

-Por favor não tornes isto mais difícil.

-Por isso é que acho melhor não te ver hoje, fazemos coisas estupidas quando estamos zangados.

-Amanhã continuarem assim, e depois de amanhã...tens que encarar o problema.- Ele praticamente cuspiu.

-Oh bom não é um problema meu, não fui eu que arrastei...- Fechei os olhos e respirei fundo.- É por isto que vamos falar amanhã ok?

-Não. Vou buscar-te agora.- O sinal indicava que a chamada tinha ido a baixo e apeteceu-me finalmente chorar, não tinha vertido uma única lágrima nas ultimas seis horas, mas agora que ele vinha apetecia-me chorar pelo resto da minha vida. Respirei fundo e calcei umas botas com atacadores, parecia ridícula no fato de treino e nas botas, mas pelo menos era um elemento neutro.

Sai para a sala e o meu pai já não estava lá.

-Foi dormir, amanhã viajamos.- De repente fez-se luz na minha cabeça, fechei os olhos com força e massageei as têmporas. Claro, eu também devia viajar amanhã e voltar domingo á noite, ou segunda muito cedo.

-Posso trocar a passagem para o próximo fim-de-semana?- Sussurrei.

-Claro querida, nós ainda vamos estar lá por essa altura.

Sentei-me ao lado da minha mãe e enrolei os braços á volta dela.

-Obrigada mãe.

-Não agradeças, o trabalho de uma mãe nunca fica feito.- Ri-me e ela beijou-me a bochecha antes de se levantar e ir para a cama, quando ouvi a luz do quarto ser apagada senti-me como a minha vizinha Macie, quando tínhamos quinze anos ela passava a noite toda fora, saindo quando a mãe adormecia. Agora eu era uma Macie.

O meu telemóvel vibrou e tive um instinto de parar o que estava a fazer, uma parcela de mim dizia-me que não, mas essa era a parte de mim que se sentia incorra lada pelo medo, pelo medo de se meter á frente do comboio e levar com a dor. No entanto uma parte de mim vislumbrava o final da tempestade, e se houve uma coisa que aprendi é que prefiro a dor rápida e crua, do que ser torturada lentamente pelas coisas.

Fechei a porta de casa com cuidado e agarrei nas chaves com mais força, enfiei as mãos nos bolsos do casaco coloquei o capucho na cabeça, o elevador levou a eternidade, mas pela primeira vez não tive medo dele, desta vez quase que preferi ficar lá dentro.

Vision 3 - The SentenceOnde histórias criam vida. Descubra agora