105ºCapitulo

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O pânico na minha garganta começa a sufocar-me e a única coisa que posso absorver á minha volta é a maneira como o Harry olha para mim, sem reação, os olhos esbugalhados e a mente a mil. Não quero tirar os olhos dele, talvez um piscar de olhos e ele foi-se. Continuo sem acreditar, ela devia estar aqui, eu devia ter recebido uma mensagem da farmácia. Abano a cabeça e olho para o meu colo, onde as minhas mãos tremem. Quem é que quero enganar? Não está aqui, e nem têm estado aqui por quase duas semanas. O Harry vira-se de costas e o pânico estala-me na garganta outra vez, a minha mão envolve-se no seu pulso enquanto quase que sou puxada da cama e ele vira-se para mim rapidamente.

-Onde é que vais?- Pergunto. Pela primeira vez em anos a minha voz parece tão frágil e partida.

-Á farmácia.- Ele diz-me enquanto abana a cabeça.

-Não posso tomar nada, ia matar...- Meu Deus como é que fui tão burra? Os meus olhos enchem-se de lágrimas pela primeira desde que a ficha me caiu e depois largo-o.

-Eu sei que não podes tomar nada agora, vou comprar testes.- Ele diz-me de forma brusca e agarra na carteira.

Ele está zangado? Porque é que parece tão zangado comigo? Eu também estou zangada comigo, como é que me esqueci? O medo de ter que enfrentar a consequência da minha imprudência deixa-me paralisada. Passei estas últimas semanas tão entalada em trabalho que nem me apercebi da mensagem? Será que sou assim tão negligente ao ponto de nem sequer poder tomar conta do meu método contracetivo? Porque é que sinto que acabei de arruinar alguma coisa enorme? É como se todas aquelas fantasias de ter filhos com o Harry se começassem a transformar em pesadelos, um monstro sem cabeça. Eu não sei tomar conta de mim, como é que posso tomar conta de uma criança? Uma criança...um bebé.

-Não quero.- Acabo por dizer. Ver o teste de gravidez só ia tornar o meu medo mais real. Isto devia estar a acontecer daqui a anos, não agora.

Ele vira-se para mim e os olhos verdes brilham, há alguma coisa mal, neste momento existem um monte de coisas mal, mas a maneira como ele olha para todo o lado menos para mim faz-me suspirar de medo. Ele já não me quer?

-Não é uma decisão tua de qualquer das maneiras.- Ele cospe e sai do quarto. A porta fecha-se com tanta força que salto no meu lugar.

A maneira como ele falou... ele falava assim comigo antes não falava? Não me consigo lembrar muito bem, lembro-me de me sentir esmagada pelas palavras zangadas e ácidas, mas é só um borrão agora, ele conseguiu substituir todas as más memórias por novas. Palavras doces e gestos carinhosos, nada daquilo que um dia foi. De repente o meu cérebro cai em queda livre e sinto as barreiras de antigamente voltarem ao sítio, e em vez de me sentir bem em partilhar as coisas com ele, sinto-me como se voltasse a ter dezoito anos e a única coisa que podia fazer era defender-me da brusquidão dele. É uma decisão minha...

Levanto-me e agarro no casaco, mas quando tento abrir a porta ela está fechada, volto a tentar e grito por ele. Mas nada. Forço a maçaneta mais uma dúzia de vezes e depois paro, encostando a testa á madeira fria.

-Fica aí, eu volto em dez minutos.- A voz rouca sussurra e bato na porta com força, raiva a forçar-se pelos meus poros.

-Não faças isto a sério Harry.- Abano a cabeça.

Isto está a fazer-me perder o controlo. Estamos a regredir, a voltar anos atrás. Como daquela vez em que ele saiu e me deixou presa dentro do apartamento, ele estava obviamente assustado, e eu também. E agora? E agora estamos assustados outra vez. Merda, muito assustados, sinto como se houvesse um buraco negro no meu estomago.

-Tu estás zangada.- Ele diz-me.

-Sim, tu não?

-Um pouco.

Vision 3 - The SentenceOnde histórias criam vida. Descubra agora