Camila
Meu pai pega o telefone do escritório e disca o ramal da minha mãe. Ela está apenas a duas salas de distância, por isso eu ouço quando toca.
— Ela chegou — diz ao telefone.
O escritório do meu pai está igual à última vez que estive aqui. Uma chatice de matar. Alguns dos melhores amigos deles dão aula de história e a sala tem pôsteres fortes com frases legais como: "Quem não se lembra do passado está condenado a repeti-lo" e "A história é escrita pelos vitoriosos". O único pôster na parede do meu pai é uma foto em preto e branco de um sociólogo careca examinando os óculos.
Minha mãe fecha a porta e então se senta na cadeira ao meu lado.
— Por que você se atrasou para a escola hoje de manhã? — pergunta meu pai.
Eu sabia que isso iria acontecer. Quando Lauren e eu finalmente chegamos à escola, já estávamos dez minutos atrasadas. Eu tinha esperança de que, se a escola tivesse deixado um recado na nossa secretária eletrônica, eu poderia apagá-lo antes de os meus pais chegarem em casa. Mas parece que o telefone do trabalho deles está no topo da lista de contatos.
— Papai e eu damos muita liberdade a você — diz minha mãe. — Nós não obrigamos você a pegar o ônibus, mas esperamos que chegue à escola na hora.
— Sabemos que você não acordou atrasada — diz meu pai. — Você estava ouvindo música quando saímos para trabalhar.
— Peguei carona com Lauren — digo. — Perdemos a noção do tempo. Não vai acontecer de novo.
Meu pai batuca com os dedos no tampo da mesa.
— Você se esqueceu de olhar o relógio?
— Por que vocês perderam a noção do tempo? — pergunta minha mãe. — Lauren esteve no seu quarto?
Era disso que David estava falando. Antes de sair para a faculdade, ele me avisou que nossos pais ficam superprotetores quando chegamos a determinade idade.
— Ela não esteve no meu quarto — respondo, e não é uma mentira completa. Acho que Lauren nem atravessou a porta, depois que começou a rir da minha calcinha branca.
— Você esteve no quarto dela? — pergunta minha mãe.
Eu não devia ter que responder a essa pergunta. Eu nunca dei a eles qualquer razão para não confiar em mim, mas estão agindo como se eu precisasse dar um relatório de tudo o que eu faço.
— Caso vocês não tenham reparado, não sou mais criancinha. Consigo até atravessar a rua sozinha.
— Tem razão — diz meu pai. — E quando você era pequena, nós deixávamos você e Lauren dormirem uma na casa da outra. A diferença é que nós sabemos que você não é mais criança.
— Você é uma adolescente — diz minha mãe.
— É mesmo? — pergunto. — Uau.
Meu pai se inclina para a frente.
— Por que vocês duas se atrasaram para a escola?
Eu me recosto na cadeira e dou risada.
— Vocês querem saber se nós estávamos transando, certo?
A voz do meu pai é contida.
— Não foi isso que eu disse.
Minha mãe leva a mão ao peito.
— Vocês estavam?
Eu me levanto e coloco a mochila no ombro.
— Não, nós não estávamos transando. E só estou contando isto para vocês não terem um ataque cardíaco. Mas estão tirando conclusões demais só porque eu me atrasei alguns minutos para a escola.
— David nunca se atrasou para a escola — diz meu pai.
— E, no entanto — digo, erguendo a voz —, ele escolheu uma faculdade que fica a mais de três mil quilômetros de Lake Forest!
Minha mãe e meu pai se viram um para o outro. Não há mais nada a ser dito, por isso pego o meu skate e vou embora.
...
O homem com um chapeuzinho branco de papel me entrega uma casquinha com duas bolas de sorvete crocante. Seguro o sorvete com uma mão, coloco uma moeda de vinte e cinco centavos no pote de gorjeta e guardo o resto do troco no bolso. Levo meu skate para fora e me sento em um banco de madeira para tomar o sorvete, começando pelas beiradas.
Estou nervosa, pensando em quando vou ver os meus pais mais tarde. Apesar de eles terem metido o nome de David na conversa, eu não precisava ter dado a entender que ele se mudou para Seattle para ficar longe deles. Eu nem sei se isso é verdade.
Do outro lado da rua de quatro faixas, tem um shopping center pequeno com uma loja de gibi, um salão de cabeleireiro e uma loja de disco. Observo quando um conversível branco entra no estacionamento.
É o carro da Hailee! Ela se olha no espelho retrovisor e prende o cabelo em um rabo de cavalo, enquanto a capota vai fechando eletronicamente ao redor dela.
O telefone de Hailee está em um dos meus bolsos, anotado em um pedaço de papel rasgado. O celular dela deve estar no carro neste momento. No outro bolso, tenho moedas suficientes para fazer uma ligação. E, do lado deste banco, tem um telefone público.
Não, isso é ridículo.
Limpo os lábios com as costas da mão. Se eu ligar para Hailee e disser a ela que a estou vendo, ela vai achar que estou andando atrás dela. Além do mais, se Lauren tiver razão e Hailee estiver dando uma de difícil, então ela não vai atender o telefone. Vai esperar para ouvir o recado que eu vou deixar, mas não faço a menor ideia do que dizer.
Eu a observo passar pelo salão de cabeleireiro e abrir a porta da loja de gibi. Ela gosta de gibi? Legal!
Ela me deu o número do celular dela porque quer que eu ligue, mas e se for cedo demais? Ligar para ela neste momento pode estragar tudo. Se é para ficarmos juntos, precisa acontecer de um jeito natural. Subo no skate e vou me afastando, lambendo o sorvete para me distrair.
Ou, talvez, eu seja apenas covarde.
Na primeira esquina, dobro os joelhos e vou para a direita.
Se quisesse ir para casa, continuaria seguindo em frente.
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The Future Of Us
FanficÉ 1996, Camila e Lauren foram vizinhas por toda sua vida. Elas foram melhores amigas por quase todo esse tempo também - pelo menos até novembro do ano passado, quando Camila fez algo que mudou tudo. Tudo vem sendo estranho entre elas desde então, ma...