sixty four

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Alguém berrou do lado de fora da minha janela e me fez acordar.

A última coisa de que me lembro é minha mãe colocando a cabeça para dentro do meu quarto por volta das onze. Eu não disse nada quando ela deu um beijo na minha bochecha e fechou a porta.

Estico a mão para a mesinha de cabeceira e aperto a parte de cima do meu despertador para acender os números vermelhos. São só 23h20.

Desta vez, a voz não é tão alta.

— Segure firme.

Será que é Normani?

Tiro as cobertas e caminho até a janela. Quando olho para fora, cubro a boca para não dar risada. Normani está com a testa colada na tela da janela do banheiro de Camila. Está segurando uma folha de papel contra o vidro. Tem mais alguém no banheiro, iluminando um recado com uma lanterna. Felizmente, o binóculo cor-de-rosa ainda está na gaveta de cima da minha escrivaninha.

Arraste o traseiro para a rua em 3 minutos pq nós vamos sequestrar você!!!

Quando baixo o binóculo, Normani acena e tira o bilhete da janela.

— E é sério! — grita.

Dinah aparece à janela com a lanterna acesa embaixo do queixo. O que ela esta fazendo ali? E o universitário?

— Nós duas estamos falando sério!

Quando Dinah e Normani saem, Camila vai até a janela. Ela não diz nada, mas sorri e dá de ombros. Dinah a tira do caminho, encosta o pulso na janela e aponta para o relógio.

Faço sinal de positivo, me enfio em uma roupa e desço a escada na ponta dos pés.

...

A caminhonete de Normani está estacionada na frente de casa e ela está sentado atrás da direção. Dinah se espreme ao lado dela e Camila está do lado de fora, segurando a porta aberta para mim.

Ela dá um sorriso tímido quando entro.

— Vai ficar bem apertado — diz Normani.

Camila entra depois de mim, mas a porta não fecha toda.

— Vocês precisam se apertar — diz Dinah.

Eu me espremo contra Dinah o máximo possível. Camila desliza até nossos corpos se tocarem do ombro ao joelho.

Quando ela bate a porta para fechar, Normani engata a marcha e a caminhonete dá um solavanco para a frente. Camila estica o cinto de segurança antes de entregar para mim. Coloco em cima de nós duas e prendo a fivela.

— Para onde estamos indo? — pergunta Camila.

Ela não teve nada a ver com isso? Dou uma olhada em Dinah, mas ela continua olhando para a rua com um sorriso.

— Só tem uma coisa de que a gente precisa agora — diz Normani.

Ela e Dinah dão socos no ar e gritam:

— GoodTimez!

...

Nunca estive na GoodTimez Pizza depois de fechar, o lugar fica em um silêncio fantasmagórico. Normani digitou o código de segurança à porta e acendeu algumas luzes. Felizmente, não ligou a música disco.

Em poucos minutos, Normani e Dinah já estão em uma competição acalorada em uma partida de Pac-Man. Dinah agarra o joystick e grita: "Engulam esta, fantasminhas!", toda vez que come uma bolinha de força. Ela está usando o moletom de Camila, mas não vou perguntar se achou alguma coisa no bolso. E nem por que ela está com Nomani, pelo visto as duas se entenderam. Isso quer dizer adeus carinha da faculdade, adeus Lindsay.

Eu me afasto do fliperama e sento em um dos reservados para comer. Depois de um tempinho, Camila desliza para o assento à minha frente.

— Nós temos amigas estranhas.

— É verdade — digo. — Mas Normani é mais estranha.

— Vou ter de fazer essa concessão — concorda ela. — E, no entanto, tenho a sensação de que o sequestro foi ideia de Dinah.

— Você também teve que fugir sem seus pais verem?

Camila balança a cabeça.

— Elas convenceram meus pais a me deixar ficar na rua até à uma.

— Não acredito!

Passamos um minuto sem dizer nada, mas não ficamos sem jeito. É bom estar com Camila mais uma vez. Mesmo que ela esteja com Hailee, ainda podemos ser amigas.

Camila dá uma olhada na direção do videogame. Está na vez de Normani no joystick e Dinah pula de um lado para o outro e grita:

— Peguem ela, fantasminhas, peguem!

— Tem uma coisa que preciso contar para você — fala Camila, enquanto passa o dedo em um amassado no tampo da mesa.

— O que é?

Ela respira fundo e solta o ar devagar.

— Se você quiser, posso falar primeiro — digo. — Porque preciso contar uma coisa para você também.

Ela sorri.

— Eu iria adorar se você falasse primeiro.

— Sumiu — digo. Dou uma olhada em Dinah e Normani, ainda absorvidas no jogo de Pac-Man. — Nós não podemos mais entrar no Facebook.

Camila se inclina por cima da mesa.

— É mesmo? Como foi que isso aconteceu?

— Hoje à noite, daqui a quinze anos, cancelo a minha conta — digo. — Originalmente, eu só ia mudar a senha, mas a coisa toda desapareceu como se nunca tivesse existido.

Camila se recosta, obviamente atônita com a notícia.

— Agora é sua vez — digo.

Ela coloca as duas mãos na mesa. O rosto dela está corado das bochechas às orelhas.

— Diga logo, Camila.

— Eu não sei o que vai acontecer no futuro — diz ela. — E, agora, acho que nenhuma de nós duas vai saber. Mas resolvi que não vou ficar com Hailee.

Não sei como reagir.

— Nunca pareceu certo — prossegue ela e então olha para mim. — Ela nunca foi a pessoa certa para mim.

Uma bola de plástico azul bate na lateral da cabeça de Camila. Nós duas olhamos para a piscina de bolinhas. Dinah já está lá e Normani está entrando pela abertura na rede.

Depois de mergulhar, Normani grita:

— Venham! Menos conversa, mais lançamento de bolinhas!

Dinah joga um monte das bolas das cores do arco-íris para cima.

Camila olha para mim e nós duas sorrimos. Nós nos aproximamos e olhamos através da rede. Dinah e Normani estão esticadas, ocupando a área entre os escorregadores. Eu entro primeiro e afundo até os joelhos, Camila cai depois de mim. As bolinhas sobem e mudam de lugar ao nosso redor, cobrindo a gente até o peito.

Dinah joga uma bola amarela para mim e eu pego.

— Quando foi que nós tiramos aquela foto nossa aqui? — pergunta ela.

Penso na minha cópia daquela foto, no momento rasgada em pedacinhos no meu diário. Um dia vou colar os pedaços com durex.

— No ano passado — diz Normani. — Ainda tenho a minha no armário da escola.

— Eu também — Camila diz. Ela joga outra bola cor de laranja no peito de Normani.

Dinah joga outra bola amarela para cima de mim. Eu pego e jogo para Normani; em seguida, volto a colocar o braço no meio das bolinhas. Quando faço isso, meu dedinho toca na lateral da mão de Camila. Estou prestes a afastar, mas, em vez disso, deixo minha mão onde está.

Um momento depois, Camila coloca o dedinho dela por cima do meu.  

The Future Of UsWhere stories live. Discover now