Capítulo 1

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 Confronto... 

Arrumei mais uma vez o vestido simples, era florido e um um tom vermelho animador que parecia dar cor a mim. Não precisei olhar no espelho para saber que olheiras, profundas pelas noites sem dormir enquanto vigiava as máquinas do lado de fora, marcavam meus olhos. Calcei as sapatilhas meio gastas, eram confortáveis e me sentia como se andasse descalça com elas — o que provavelmente iria acontecer se não comprasse sapatos novos logo.
Eu ia fazer algo arriscado então precisava aparentar tranquilidade mesmo que por dentro estivesse um turbilhão de emoções.
Olhei pela janela, os construtores ainda estavam lá, parados como urubus à espreita. Gelei só em pensar na destruição da minha casa. Eu não podia deixar isso acontecer, não no lugar que eu cresci, que era a última memória dos meus pais e de todo o esforço que fizeram para erguer meu lar.
Caminhei até a cômoda e peguei meu celular, disquei o número de Tyler e aguardei até que ele me atendesse, o que só aconteceu depois de alguns toques.

- Bom dia, gata. – Falou com uma voz aveludada, tentando imitar de forma fajuta algum ator dos filmes antigos de Hollywood, o que resultou em uma risada minha. Meu melhor amigo tinha o dom de deixar as coisas mais leves mesmo em momentos críticos.

- Está me esperando na outra rua? –Questionei com um sorriso tranquilo no rosto mesmo que meu coração batendo descompassado me entregasse por completo.

- Sim, estou, quer dizer... Estamos. Sinto muito, Chloe, mas Derek implorou para que o deixasse ajudar, prometo que ele não vai interferir em nada e iremos recuperar sua casa desse velho maldito que a roubou nem que eu precise quebrar todos os ossos dele. – Decretou com a maior calma possível, como se não tivesse feito uma ameaça e sim um pedido para o jantar.

- VOCÊ O QUE?! – Talvez eu estivesse exagerando, mas não era algo simples de lidar, eu e Derek havíamos namorado durante alguns meses, porém buscávamos coisas diferentes, a separação foi algo turbulento e com a morte dos meus pais junto, tudo se tornou mil vezes pior. Para piorar minha situação, por algum acaso do próprio capeta, ele era primo de Ty e muitas vezes arrumava uma forma de tentar me encontrar, o que sempre resultava em eu fugindo de sua presença como o diabo foge da cruz.

- Podemos dizer que eu não tive tanta escolha.

Depois de uma breve despedida, desliguei a ligação totalmente perdida e sem saber o que fazer.
Derek não era má pessoa, apenas não aceitava muito bem as coisas. Podia lembrar com perfeição todos os seus detalhes, o cabelo preto bagunçado lhe dava um ar rebelde, a jaqueta de couro que sempre estava em seu ombro fazendo chuva ou sol o destacavam um pouco, mas seus olhos negros que o diferenciavam na multidão; eram turbulentos e tempestuosos mesmo naquela cor tão neutra.
Não queria o encontrar, muito pelo contrário, manter distancia era o mais sensato, pois, olhar para ele era como olhar para o passado, o que eu não queria de forma alguma fazer.
O tirei de meus pensamentos, já estava começando a me atrasar. Andei com cuidado até a porta de entrada, fechei-a em silêncio, ainda que por dentro minha mente estivesse gritando e saí.
Os construtores me encararam com desprezo — provavelmente achavam que eu estava dificultando seu trabalho e que aquilo não levaria nada, se o tal Ares havia concordado em conversar, eles que reclamassem com ele — os encarei de volta na mesma intensidade, podia estar mal, mas não iria abaixar minha cabeça.
Caminhei pela rua, tentando não esbarrar nos estudantes da Universidade de Nova York que pareciam procurar algum café para descansar e conversar, algo típico de Greenwich Village, até uma pequena transversal entre dois prédios antigos que levava ao pequeno parque em que marquei o encontro com Tyler.
Eu não era uma dama indefesa que precisava ser salva, mas ele insistiu tanto para ir que foi impossível lhe dizer não.
Meu sorriso sumiu aos poucos ao ver os dois encostados no Impala 67, que mais parecia ter sido pintado naquele mesmo dia. Derek fumava um cigarro com um sorriso galanteador no rosto, os olhos sérios pareciam ver todo o desespero que eu tentava esconder e só queria sumir de sua vista. Tyler mexia em seu celular com uma expressão de desagrado e sabia que ele estava perdendo em algum jogo.
Eram primos, mas poderiam ser facilmente chamados de irmãos a julgar pela aparência que tinham.
Havia poucas diferenças. Meu melhor amigo era alguns centímetros mais alto e um pouco mais musculoso, além de ter uma pequena cicatriz acima da sobrancelha que a maioria das mulheres achava ser sexy, penetrantes íris esmeralda e uma barba impecável, o que o deixava ainda mais atraente para elas, isso se ele de fato gostasse delas.
Assim que a fumaça chegou ao meu nariz comecei a tossir descontroladamente, olhei sugestiva para Derek, que acabou por revirar os olhos, dar uma última tragada, jogar o cigarro no chão e o pisar até a brasa apagar. Agradeci mentalmente, pelo menos ele não tinha raiva o suficiente de mim para tentar me matar asfixiada com aquilo, ou só estava planejando um jeito mais doloroso de fazer isso, nunca se sabe...

Ares - Um Boxeador MafiosoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora