Capítulo 02 - Lane Claire

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Flashback...


Na infância, minha brincadeira favorita era esconde-esconde. Como toda criança da minha idade, eu passava o dia brincando com meus amigos. 

Naquele dia, eu fui até a casa de Selena, nós tínhamos oito anos e estudávamos. Os pais dela não estavam em casa, então deixaram uma lista do que nós não deveríamos fazer.

Como Selena também gostava de esconde-esconde, foi essa a brincadeira que escolhemos. Assim que ela fechou os olhos e começou a contar, eu corri para um cômodo perto dali e me escondi dentro de um armário, o único móvel no local. A janela estava fechada e a luz apagada, fazendo tudo ficar escuro.

Tudo o que ouvi depois disso foi o som de um grito. Alguns segundos depois, ouvi a mesma voz pedir repetidamente por ajuda. Era Selena, só podia ser ela, e não parecia estar distante. Abri uma pequena fresta da porta do armário e a vi se contorcendo no chão. Fui até ela.

— Selena? Está tudo bem? — perguntei em um sussurro. Foi então que eu vi: sangue, por toda sua perna direita — O que aconteceu com sua perna?!

— Lane! Chame alguém! Corra o mais rápido possível, por favor! — ela me agarrou com uma de suas mãos e apertou, como para me fazer ir mais rápido.

Eu não consegui, fiquei paralisada, olhando para ela. Eu era só uma criança, não estava entendendo nada. Escutei passos e me virei em direção a porta, havia um homem lá. Ele tinha uma faca em uma mão e na outra uma mala.

— Quem é você?! — ele gritou, olhando para mim.

— Eu sou... Lane. Amiga da Selena. — eu estava com medo, muito medo.

— Droga! — ele praguejou, parecendo não falar comigo — Qual seu sobrenome, Lane?

— Adams. Lane Claire Adams.

— Adams? — ele parecia um pouco confuso, mas sorriu e me olhou novamente — E qual sua idade, querida? — a voz dele me fez arrepiar.

— Tenho oito anos.

— Está bem. Preste atenção no que vou te dizer, ruivinha. Não conte para ninguém o que você viu. E não chame ninguém, o pai da Selena está trabalhando e logo vai chegar, ele sabe o que fazer e sabe quem eu sou. Mas você não pode contar para mais ninguém que eu estive aqui. E não pode gritar também, ok? Se souber que você contou de mim para alguém, sua perna ficará como a da sua amiguinha, está entendendo? Vai doer muito. — sentindo as lágrimas caírem, eu assenti — Você não vai sair correndo, está me ouvindo? Você não pode. — ele pegou nos meus braços e me levou até o armário.

— Eu não vou. Por favor, não me machuque.

— Eu não vou te machucar, por enquanto. Só quero ter certeza de que não vai correr e contar para alguém sobre mim. — ele olhava dentro dos meus olhos e apertava meus braços com tanta força que pensei que iriam se quebrar — Aliás, gostei dos seus olhos, são verdes como os de meu falecido avô. — de repente ele virou o rosto, fechou a porta e a trancou.

Consegui ver através do buraco da fechadura: ele foi até a porta e então parou, como se tivesse se lembrado de algo. Andou de volta até Selena e começou a arrastá-la para meu "esconderijo". Abriu novamente a porta e a jogou lá dentro. Então tirou alguns panos e cordas da mala e amarrou nossos braços, pernas e bocas, logo fechando a porta do armário e trancando-a novamente.

— Cuidado com o bicho papão!

Estávamos amarradas no escuro e não havia como gritar. Como iam nos encontrar ali?

Eu entrei em completo desespero. Me joguei contra a porta do armário, pulei, tentei desamarrar as cordas, puxar o pano da minha boca, mas tudo em vão. No fim, me sentei ao lado de Selena. Ela chorava baixinho enquanto tentava estancar o sangue de sua perna com as mãos. Então, de repente, ela ficou em silêncio. Por um instante pensei que ela estava desmaiada, ou até morta, mas ela começou a chorar compulsivamente. Sem saber o que fazer, deitei e chorei junto.

Eu só queria não ter entrado naquela casa, naquele quarto, naquele armário.

A Selena ficou bem, se é isso que você está se perguntando. Ela perdeu bastante sangue, mas o pai dela chegou a tempo. O que a salvou foi o rastro de sangue que ficou no chão quando ela tentou correr para se esconder daquele homem.

Foi assim que tudo começou. Todos os meus medos, traumas e problemas entraram na minha vida assim como eu entrei naquele armário. Aquele maldito armário escuro.

Dias atuais...

Eu sempre quis fazer balé. Até que um dia, quando eu tinha 14 anos, resolvi me inscrever nas aulas. No começo foi difícil me adaptar, mas minha vontade de aprender sempre foi maior. Assim como meu otimismo sempre foi maior que todos os meus problemas e medos. Eu deixei de ser apenas uma criancinha pequena e medrosa, passei a usar meus medos como desculpa para ser mais forte. Meu único medo, ou trauma, que ainda permanece é o medo de escuro. Desde aquele episódio que vivi na casa de Selena tenho o pensamento de que coisas ruins acontecem no escuro. 

A Máfia Entre NósOnde as histórias ganham vida. Descobre agora