Prólogo

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Estou sentada na cadeira do hospital e aqui está bem cheio, a saúde pública no Rio De Janeiro é um caos mas ainda bem que existe, eu jamais teria dinheiro para pagar um hospital particular, infelizmente é muito caro e nem metade da população conse...

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Estou sentada na cadeira do hospital e aqui está bem cheio, a saúde pública no Rio De Janeiro é um caos mas ainda bem que existe, eu jamais teria dinheiro para pagar um hospital particular, infelizmente é muito caro e nem metade da população consegue ter acesso, muitos reclamam do SUS mas sem ele não teríamos nada, muitos morreriam sem ter uma pequena ajuda e chance de melhorar.

 Abaixo a cabeça e fecho meus olhos enquanto faço uma oração bem baixinho pedindo para Deus salvar meus pais, eles são absolutamente tudo na minha vida e são as únicas pessoas que tenho. Meu coração está dilacerado com tantos sentimentos ruins mas preciso me manter forte para aguentar tudo que está acontecendo mesmo com o medo se fazendo presente me deixando aflita e com o sentimento de impotência por não ter o que fazer.

Semana passada eu fiquei em casa e eles foram comprar lanche, meu pai foi com seu carro antigo mas que ele ama e infelizmente sofreram um acidente, outro automóvel com vários meninos bêbados dentro colidiu com o dele fazendo o carro capotar os deixando em coma, soube o que aconteceu horas depois, meu pai ficou preso nas ferragens e o corpo da minha mãe praticamente esmagado. Não consigo explicar meu desespero  na hora, meu mundo desabou, parecia que o chão tinha desaparecido e eu cai em um precipício de onde não conseguiria sair.

Isso já faz uma semana!

Uma semana que não durmo, não como direito, estou com os sentimentos embaralhados e não consigo fazer absolutamente nada, só quero eles aqui comigo, isso é tão injusto, por causa de irresponsabilidade dos outros eles ficaram nessa situação. Quando assumem o volante, principalmente jovens, só pensam em si mesmos, na diversão e esquecem que tem outras pessoas a sua volta querendo apenas voltar para casa, que tem família e uma vida inteira  pela frente que pode finalizar ali em segundos por pura falta de empatia e cuidado.

— Bom dia. — Olho para cima e vejo o homem baixinho de cabelos grisalhos usando um jaleco branco, reconheço logo sendo o médico que cuida deles e levanto na mesma hora completamente nervosa, minhas mãos estão suando de tanto nervoso e ansiedade para ter novas notícias.

— Bom dia, meus pais acordaram? — Pergunto com a expectativa me corroendo e com uma pontinha de esperança florescendo em meu peito.

Seu semblante muda imediatamente ficando com uma feição de tristeza e eu entendo na mesma hora o que aconteceu mas não quero acreditar, não pode ser o que estou pensando, eles não me deixariam aqui sozinha, meus pais sempre disseram que cuidariam de mim para sempre e agora me abandonaram? A vida deles acabou do nada e nunca mais vamos nos ver?

— Eu sinto muito mas a pancada foi muito forte e os dois não resistiram, nós tentamos de tudo, fizemos o possível e até o impossível para os salvar, eles lutaram até o fim e foram fortes mas... — Ele pausa e respira fundo antes de completar o que quer dizer. — Espero que fique bem!

Nesse momento eu desabo caindo de joelhos no chão, deixando as lágrimas escorrerem sem que eu possa controlar, a dor é intensa e vai até o fundo da minha alma me destruindo por inteira. Eu perdi as únicas pessoas que eu tinha, os amores da minha vida, os meus maiores exemplos e partes de mim!

Já faz um mês do pior dia da minha vida, naquela semana só eu fui ao enterro que as pessoas do hospital me ajudaram a fazer, sofri tudo sozinha, ver eles dois sendo enterrados juntos me destruiu por completo, é como se eu estivesse morta por dentro

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Já faz um mês do pior dia da minha vida, naquela semana só eu fui ao enterro que as pessoas do hospital me ajudaram a fazer, sofri tudo sozinha, ver eles dois sendo enterrados juntos me destruiu por completo, é como se eu estivesse morta por dentro. Ver o caixão fechando foi a pior parte porque ali, apenas naquele momento percebi que nunca mais os veria e que a partir dali estaria realmente sozinha no mundo.

Agora não teria mais os beijos de boa noite da minha mãe e os de bom dia do meu pai, não jantaríamos juntos para contar como foi nosso dia e comentar sobre planos para o futuro. Não iríamos mais a praia nos fins de semana e nem teria mais o incentivo deles dizendo o quanto sou inteligente. Não teria mais absolutamente nada!

Não sinto fome, já perdi mais de dez quilos, tenho olheiras em baixo dos olhos por não conseguir dormir, estou literalmente parecendo um zumbi, minha vontade de viver foi embora juro com os dois e sinceramente, não sei porque ainda estou aqui apenas respirando.

Perdi a casa que a gente morava até porque meus pais não deixavam eu trabalhar, era apenas estudar e estudar, tenho apenas dezessete anos e eles queriam que eu realizasse todos os meus sonhos então não tive dinheiro para pagar o aluguel e fui despejada, jogada na rua apenas com duas mochilas com algumas coisas minhas e dos meus pais que peguei de lembrança. A dona da casa foi extremamente cruel, ela sabe de tudo que estou passando e mesmo assim fez isso comigo mas sinceramente, não me abala porque já estou mal o suficiente.

Agora estou deitada na calçada de uma padaria sobre um lençol que trouxe na mochila, observando a cidade a noite, as pessoas passam me olhando de forma estranha e devem pensar sobre o que eu faço na rua, devem achar que sou viciada em drogas ou algo do tipo, mas nada disso me importa, nada me dói mais do que perder meus amores e tenho muitas coisas para me preocupar ao invés dos olhares de julgamentos ou comentários desnecessários.

Durante esses dias sofri tentativa de assalto e até ameaçaram me estuprar dizendo que eu era linda e gostosa, senti uma repulsa tão grande, um enjoo subindo até minha garganta e depois voltando, fiquei completamente estática e sem saber o que fazer ou até mesmo dizer mas por sorte um carro de polícia estava passando na hora e me salvou daquela situação embaraçosa e horrível que me deixou mais traumatizada.

Aqui é um verdadeiro teste de sobrevivência, todos os dias presencio coisas que ficarão em minha mente para sempre, pessoas catando lixo por não ter o que comer em casa, outros roubando por ter ficado viciados em drogas sendo que antes tinham uma vida boa. É triste ver o quanto alguém pode se perder na vida, não julgo porque não sei o passado de cada um e o que viveram, apenas lamento por essa realidade tão cruel e espero que um dia possam melhorar e realmente viver bem.

— Oi. — Desperto dos meus pensamentos ao ouvir uma voz e olho para o lado vendo uma mulher de pele branca, cabelos negros assim como seus olhos, usando roupas e jóias que parecem ser caríssimas. Ela sorri e eu permaneço séria tentando pensar no porque desse contato repentino, eu nem a conheço e desconfio de todos, confesso que morro de medo e permaneço sempre em estado de alerta.

— Oi. — Respondo com a voz baixa, praticamente sussurrada.

— O que está fazendo aqui? Está muito frio e a rua não é lugar de meninas lindas como você. — Ela continua sorrindo e tenta tocar em meu rosto mas me afasto, estou achando tudo muito estranho e meu subconsciente praticamente grita para eu ir embora e a deixar ali mas não faço isso.

— É a única opção que tenho, não se pode ter tudo na vida né. — Ela balança a cabeça concordando.

— Sim, mas eu tenho uma proposta para te fazer.

Ela começa a me explicar tudo e eu apenas fico escutando cada detalhe pensando nas possibilidades, se realmente vale a pena ou não mas eu não tenho outra saída, essa é minha única opção apesar de ser absurda, é isso ou continuar aqui dormindo ao relento, sem tomar banho e me alimentar.

— Você aceita? — Ela pergunta ao terminar de explicar tudo e eu infelizmente só tenho uma resposta para isso.

— Sim, eu aceito!

E foi ai que o inferno começou!

Todas as suas versões [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now