Prólogo

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O filho de Abraão foi assassinado.

Ele tentou se salvar, é verdade. O menino correu o quanto pôde, para o mais longe possível. Os galhos da floresta arranhavam seu corpo, arrancando seu sangue. Os passos dos soldados, ao seu encalço, soavam fortes, determinados a matá-lo; a arrancar sua cabeça fora e levar como prêmio para o rei.

A neve quase o impedia de levantar os pés e dar o próximo passo em direção ao território que poderia salvar sua vida. Mas a mesma estava em um jogo de xadrez, onde ele não bateu o xeque mate, e agora estava a um fio de ser derrotado.

Entretanto, acreditava que seu esforço valeria a pena. Salvaria sua vida, a vida de sua família... não é? Ele não poderia morrer. Não seria certo que morresse. Ele não estava pronto para perder sua vida, ainda era jovem demais para que parasse de respirar; para que entrasse em um sono profundo e não fosse mais capaz de acordar.

Nos braços do garoto, agarrada ao seu peito, a menina de cabelos ruivos apenas segurava o choro porque sabia que o irmão a protegeria. Ela acreditava nele e sabia que o maior objetivo daquele homem era salvar sua vida e salvar-se a si mesmo.

Mas o filho de Abraão não teve tempo de alcançar seu destino. Ele não teve tempo de pôr os pés para fora de Arthora, não pôde salvar sua família. Antes mesmo que algo ocorresse, a espada do oficial do rei desceu, e o sangue do filho de Abraão jorrou pela floresta, manchando a neve branca.

E a garota, que estava nos braços do irmão, não teve tempo de gritar. Não teve tempo de nem mesmo perceber o que estava acontecendo, antes que, de seu coração, jorrasse sangue, tão vermelho quanto pétalas de rosas.

E quando o sangue deles mancharam a terra, foi a última vez que o Imperador foi realmente visto.

* * *

Anos depois – Nova Sulman (território tomado de Arthora)

A corte estava reunida quando o oficial trouxe mais duas cabeças com o orgulho reluzindo de seus olhos ambiciosos.

— Como o senhor pediu, meu rei — anunciou — mais duas cabeças dos arthorianos que decidiram desobedecer suas leis.

O rei sorria, feliz com sua vitória.

Ao seu redor, a corte olhava espantada para as cabeças, jogadas aos pés do rei.

— Parece que é realmente capaz de fazer o que eu ordeno — relatou o rei, deliciando-se em sua vitória. Este levantou-se do trono, e caminhou até as cabeças, agarrando-as pelos cabelos.

Ao lado do trono do rei, a rainha e seus três filhos permaneciam de pé, um pouco mais atrás do trono, que reluzia a ouro puro. Ouro roubado dos arthorianos. E a princesa, herdeira desse mesmo trono, não conseguia deixar de pensar em quem seriam aquelas pessoas. Mães? Irmãs ou filhos? Ela detestava quando era obrigada a assistir àquilo.

— É uma honra. Há algo mais que possa fazer, meu rei?

— Há sim — disse o rei. — Eu descobri, por meio de terceiros, que em minha corte existe um traidor. Alguém que está do lado dos arthorianos, e que os ajuda e os apoia sorrateiramente, pensando que eu jamais descobriria.

A herdeira do trono, a mais velha de três irmãos, se remexeu, desconfortável. Ela sabia o que viria a seguir. Se preparou por muito tempo até que seu pai descobrisse sua traição com a corte, a qual já não se considerava mais fazer parte. E prometera a si mesma que não mentiria sobre o que acreditava, não mentiria sobre a Verdade.

Arthora | A Queda de Um ImpérioOù les histoires vivent. Découvrez maintenant