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Encontrei um píer de madeira depois de alguns dias em Álix. Fui com Aaden. Havíamos trabalhado bastante naquele dia, e ele percebeu o quanto eu estava distraída. Dessa vez, era um rio, que desaguava no mar do leste, em direção a uma ilha habitada por descendentes de gigantes; os rafflesianos. Eu não sabia o que eles eram, exatamente.

Ouvi dizer que, em uma das Eras Antigas, eles costumavam saquear Álix, Tuorc e Arthora, os reinos que os cercavam. Talvez fosse por isso que Zylia estava tão na defensiva no dia em que a conheci, mesmo que não tivéssemos o tamanho de um gigante.

Imaginei a possibilidade de eles estarem no rio e nos verem, mas era longe demais e seria uma coincidência e um azar muito grande. Aaden disse que as fronteiras não eram cruzadas com Rafflésia havia séculos e que a ilha onde estavam os separavam da gente. Talvez um pouco depois da escravidão dos arthorianos, o conflito diminuiu até ser escasso. Portos não entendia o motivo, mas talvez seja apenas porque os gigantes gostavam de pegar no pé de seus vizinhos.

Confesso que fui pesquisar um pouco depois e descobri que era apenas uma brincadeira de mal gosto. A maioria deles eram gente boa, mas eu ainda não colocava muita confiança.

— Ainda está me devendo aquela dança — comentou Aaden de repente.

Eu revirei os olhos.

— Eu te dei uma dança.

— Uma dança sem música não é uma dança — explicou.

— Hum. Bem, nesse caso, acho que ainda vou te dever por um bom tempo.

Ele riu.

— Tudo bem. Mas vou te cobrar até você cumprir.

— Ótimo. — Reparei que eu estava sorrindo. O que não acontecia fazia alguns dias.

Depois que o treinamento começou, acabei ocupando minha cabeça com muita coisa que envolvia o passado – mais do que o costume – e não deixei que nada me distraísse. Não fui capaz disso.

Por isso, comecei a fazer outras coisas. Passei a tarde no campo, fui visitar os estábulos, explorei a casa de Zylia onde estávamos hospedados – que inclusive, era enorme. Demorei cinco dias para ver tudo –, joguei xadrez até vencer Hale, cozinhei de novo, conheci alguns faunos, que de quebra estavam de mau humor e saí com as meninas. Até então, tudo estava sendo usado de auxílio.

Por um momento, olhei para Aaden. Ele ainda vestia o uniforme de soldado, feito de tecido preto e grosso, mas que não parecia ser quente. Ele estava debruçado sobre a cerca e seu cabelo marrom escuro caia de lado. Os músculos estavam tensionados, mesmo que Portos parecesse tranquilo.

— Achou algo interessante em mim? — ele perguntou sem nem olhar para ter certeza se eu o encarava.

Não sei se deveria me sentir ofendida. Nem se deveria corar.

— Não. É só que... — vamos, ache uma desculpa — nunca vi soldados como você em Uxtan.

Não era mentira. Nunca tinha visto mesmo, porém ainda era uma forma de desconversar.

— Como eu? — Desta vez, ele franziu o cenho e virou-se para mim. — O que quer dizer?

— Tão próximos de um líder a ponto de discutir com intimidade — expliquei, agradecendo aos céus por achar algo que colasse. — Ou que vestem preto e ajudam peregrinos descendentes de escravos a se esconder.

— É o nosso dever.

— Eu sei. Mas em Uxtan, as coisas andavam diferentes. Os soldados eram como marionetes e os líderes como assassinos. Nada era tão leve quanto aqui, nem mesmo o ar.

Arthora | A Queda de Um ImpérioDove le storie prendono vita. Scoprilo ora