Capítulo 21

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As pessoas costumam falar que o sol vai nascer, quando elas querem dizer que as coisas ruins vão passar. Que a noite vai embora, que o novo dia vai trazer alegria, e paz, e resolução de conflitos. Que as nuvens funestas que escureceram a noite, serão varridas pelos raios vívidos do sol e que nada será empecilho para que a felicidade reine.

Para Alexander Lightwood, isso era, hoje mais do que nunca, uma imensa mentira. A morte, o inferno, a dor e a solidão, a vergonha... Nada disso respeita o dia. Nada disso pede licença e se retira junto com a noite. Muito pelo contrário. O sol cada vez mais alto no céu, e o silêncio opressor, seguido apenas pelos cascos dos cavalos contra a terra solta, e o barulho ofegante das respirações de... do... dele, e do Diurno. Tudo isso lhe parecia infinitamente pior que todas as noites de angústia que já tinha vivido.

Estavam voltando para Casa.

Quando o dia amanheceu, a vampira loira gritou em agonia. A beleza estonteante se desvaneceu, primeiramente em lascas de pele, depois em pó, até não restar nada. Os gritos de dor, o modo como ela tentou de todas as formas negociar para ser tirada de sob o sol, e a certeza final de que não seria atendida, seguida imediatamente pela multiplicação do desespero, faziam com que Alec sentisse de certa forma, compaixão pela morte cruel que ela sofrera.

O Diurno, por outro lado, tinha estremecido e se arrastado, sob o olhar atento de Izabelle, ensanguentado e ofegante, puxado a lâmina de sob a costela (Izzy não acertara o coração) e caído, trêmulo, aos pés da Lightwood.

Aos poucos os outros caçadores tinham chegado, e o silêncio instaurado na clareira era unânime. Ninguém se atreveu a dizer palavra. E perdurava até agora. Salvo algumas frases de comando de Alec, ninguém parecia ansioso para quebrar o silêncio.

Então, estavam voltando para a Casa. Mesmo tendo sido traído pelo seu feiticeiro, Alec estava relativamente em lucro. Conseguiram o intento da missão, em grande parte. Não sabiam do paradeiro dos outros do clã, mas o vampiro Diurno, amarrado pelas mãos, estava sendo obrigado a caminhar, puxado por Alec, que ia montado em Tempestade. Magnus Bane (como doía a Alec pensar em seu nome) estava em igual condição, puxado, com muito menos delicadeza, por Izabelle.

Agora que o chão se tornara menos íngreme, Isabelle estava instigando mais o cavalo que montava, e Magnus, arrastado atrás dela, sofria horrivelmente para conseguir se manter de pé. Alec fervorosamente reprimiu todas as vontades de pedir a ela que andasse mais devagar. Desviou o olhar quando Magnus se desequilibrou e caiu, de joelhos, sendo puxado assim mesmo pelo chão de terra solto, arranhões vermelhos aparecendo na pele morena, até que ele não conseguiu mais se manter nos joelhos e desmoronou, o corpo tombando no chão, os ombros torcidos pela corda, o rosto contorcido em puro desespero. Isabelle freou e olhou para trás, feroz. Os outros reduziram a velocidade.

- Levante-se - ordenou, ao que o feiticeiro, de olhos fechados, com grande esforço, voltou a se pôr de pé.

- Ele não vai sobreviver até lá - o Diurno disse. Todos o encararam, incrédulos. Ele deu de ombros - Eu sei a distância até lá. Ainda falta muito. Ele vai morrer.

Alec concordava. Se continuassem nesse ritmo, Magnus não sobreviveria. Ele sabia que Isabelle sabia disso. Ela bufou e desceu do cavalo. Magnus estava se esforçando para não demonstrar fraqueza, mas Alec sabia que quando ele sentia dor, mordia o lábio inferior. E seu lábio inferior estava sangrando. Queria descer do seu cavalo e gritar: PORQUÊ? Mas se queria sobreviver, não podia fazer isso. O cavalo no qual Magnus viera, Duque, estava carregando apenas uma caixa com os restos mortais de Camille (que se resumiam a joias, roupas e adereço de cabelo)

- Sobe - Isabelle ordenou. Magnus a encarou com os olhos nublados de dor e cansaço. - Eu disse: Sobe.

Todos observaram, enquanto ele se esforçava para subir em Duque, a expressão mudando para alívio, quando finalmente pode se apoiar em algum lugar. O Diurno não estava satisfeito.

Servidão e Liberdade || Malec Where stories live. Discover now