Capítulo 11 - Não procure aquilo que não quer saber

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Seu celular não vibra tantas vezes no meio da madrugada por uma boa notícia.

Exatamente as 1h45 da madrugada do dia 6 de junho de 2017, o ombro de Marcela foi tocado e logo depois chacoalhando por uma Lisbete sem um pingo de paciência e quase sonâmbula de tanto sono.

- O Lucas quer falar com você - balbuciou e largou seu celular com Marcela, que se sentou em uma mistura de cansaço, surpresa e medo.

Ela encarou a chamada em andamento no celular de Lisbete enquanto sua colega de quarto se enfiava completamente debaixo das cobertas.

- Me diz que é uma coisa muito importante - sussurrou desgostando da própria voz. Ela deitou de novo e fechou os olhos com o celular no ouvido direito.

- É uma coisa muito importante. - Lucas tinha uma voz muita acordada para o horário. - Os pais da Giulia estão aqui em casa. Vocês são as duas únicas do grupo que não recebem as mensagens e o Sérgio não sabe de nada.

- Não sabe de nada do que? - Marcela lutava para se manter acordada e odiava o gosto em sua boca.

- A Giu sumiu.

Marcela abre os olhos. Estava quase dormindo, mas seu coração palpitou mais forte.

- Eles vieram ver se a Giu tava aqui e me perguntar se eu sabia de alguma coisa. - Lucas continua.

Marcela se senta e seu peito sobre e desce mais pesado abaixo da camiseta branca. Os cobertores escuros antes cobrindo seus pés são retirados e ela anda depressa e descalça até o banheiro. Como o celular de Lisbete no ouvido e o seu em mãos, ela liga o wi-fi.

- Ela falou com você? Cara, eu tô surtando. Ela não me disse nada! - Lucas parece de acabado de fechar uma porta atrás de si. - A  Giu tá com você?

- Claro que não! - responde, se irritando com a demora para conectar seu celular à internet.

- Ela não te disse nada?

- Eu tô tentando descobrir. Foi um dia muuuito longo, eu fui dormir antes das nove horas - argumenta, sentando-se no vaso.

As mensagens começam a chegar aos montes em seu celular, mas nenhuma delas é de Giulia. Marcela pergunta onde ela está, mas essa mensagem nem ao menos chega em Giulia.

- Acha que ela desligou o celular? - Marcela pergunta, um silêncio é o que recebe. - O que os pais dela falaram? O que eles fizeram?

- Eles parecem bem preocupados com ela.

- Não foi isso que eu perguntei! - Marcela percebe que sua voz se excedeu e tenta controlar a respiração. - Como ela sumiu?

- A mãe dela foi no quarto e ela não estava lá.

- Já falaram com a tia dela?

- Quem?

- A tia dela, Lucas! Como ela pode só desaparecer de casa assim? Eles falaram com a tia dela?

- Eu não sei! - Lucas é quem fala alto dessa vez. - Você acha que eu sei o que tá acontecendo? Só me pediram pra tentar saber se ela tá com você. Não tá, não é? - Marcela percebe que agora não é só Lucas quem está escutando-a falar.

- Não, não está - Marcela sussurra. A mão está tão escorregadia que é difícil manter o celular no ouvido. - Ela não falou nada pra ninguém? Isso é impossível.

- Ela perguntou se a tia dela sabe de alguma coisa - Lucas diz, falando com alguém.

- Foi a primeira pessoa com quem falei - Hélio responde. Marcela engole em seco. A tia pode ter mentido, não pode?

- Fomos lá, ela não está com a Cecília - Márcia completa a informação.

Não pode ser.

Mais silêncio. Marcela desliga, não tem nada ali para ela. Encara a luz do banheiro, depois seus pés, se pergunta como Giulia pensaria. Sim, ela com certeza desligaria o celular, mas não é burra. Não é nem um pouco burra.

Ela larga os dois celulares no banheiro e vai até a janela. Encara bem as grades, depois segura nelas e balança, essas nem se mexem. Marcela queria conseguir sair, ajudar a procurar Giulia, mas por onde começaria? Isso não faz o menor sentido.

Não consegue se sentar. Tem quase um raio de energia percorrendo o seu corpo e Marcela começa a andar de um lado pro outro no pequeno espaço do quarto iluminado apenas pela lua.

Nenhum dos amigos sabe onde Giulia estava. Nem sua tia favorita. Não é possível que Giulia esteja na rua tão tarde. Choveu tanto hoje, quase como no verão, com trovões e raios. Por que ela faria isso?

Marcela leva as duas mãos ao rosto. A vontade de chorar vem crescendo depressa. Está assustada e ao mesmo tempo um voz fica repetindo em sua cabeça que ela deveria ter mandado mensagem. Ela estava com o celular o tempo todo hoje, deveria ter perguntado para Giulia como ela estava se sentindo. Deveria ter perguntado se precisava de alguma coisa. Deveria ter mandado pelo menos um vídeo engraçado.

Ela para na frente da janela de novo. Odeia que não possa sair, mas mesmo sem as grades como ela chegaria no térreo sem quebrar uma perna? Como pularia o muro alto sem ser vista? É impossível sair da gaiola que seus pais a colocaram.

O piso parece mais frio agora.

Volta para o banheiro, pega o seu celular e tenta ligar. Caixa postal.

Ela quer gritar. Aperta os olhos com força, assim como os lábios, e tenta de novo, mas já sabe a resposta. Tenta de novo e de novo, mais de dez vezes, como se em algum momento isso fosse melhorar.

Marcela já não sabe se está mais preocupada ou irritada com Giulia agora. Como ela pôde fazer algo assim?

Já passa das 3h30 quando ela se senta na cama. O sentimento não vai embora e as conexões não fazem o menor sentido.

Então, ela lembra de alguém.
Marcela não pensa duas vezes. Ela entra no Facebook de Giulia e logo encontra quem procurava. Ela está online. Marcela recua por alguns segundos. Se estiver errada, isso vai ser muito estranho.

Marcela liga. Sente que iria definhar se não ligasse. Cada som da ligação chamando parece mais alto e perturbador. Ela não atende.

Tenta de novo. Precisa. Precisa fisicamente.

- Alô? - A voz reconhecida pergunta do outro lado. Marcela estava pronta para perguntar sobre Giulia, mas não é necessário. - Sim, ela tá aqui.

Marcela engole a preocupação e o sentimento que vem agora é pior. Escuta o barulho do celular sendo passado de uma mão para a outra. Nem respira. Seu rosto está se contraindo de forma involuntária.

Não é possível. As lágrimas vão rolando mais e mais, Marcela não consegue ver mais nada.

- Desculpa, eu deveria ter te avisado - é a voz de Giulia do outro lado. Ela parece bem. Parece bem demais. - Escuta... Eu não tinha pra onde ir e...

Marcela desliga. Ela encara a foto de perfil da garota para quem ligou.

Em uma praça qualquer, com o chapéu espalhafatoso, o delineador rosa e roupas que parecem terem sido escolhida de forma aleatória. Marcela não sabe o que fazer com a informação de que Giulia está com Camila.

Ela só consegue sentir e é o mesmo sentimento que teria se alguém tivesse acabado de cuspir em sua cara.

⚢ Não Mate Borboletas Por Ela ⚢ [Completo]Where stories live. Discover now