⚢ Não Mate Borboletas Por Ela ⚢ [Completo]

Capítulo 40 - Pais e Filhos

Setembro

Tantos sentimentos conflituosos tomam conta do coração e da mente de Marcela. Que ela odeia sua condição congênita e que não gosta de olhar seus pais, por colocar a culpa neles, quando seus problemas de saúde se agravam já é algo que sabemos bem, mas dessa vez parece ser pior.

Por um tempo bastante razoável, Marcela se esqueceu de que não é e nunca será como as outras pessoas. A realidade então veio para lembrar as limitações físicas que Marcela tem. Ao contrário de Carlos, não era uma opção segura e inteligente Marcela deixar o país.

É claro que ela não estava empolgada com a possibilidade, mas por alguns segundos cogitou que poderia ir estudar em uma universidade de fora ao lado de Giulia. Assim, elas poderiam ficar juntas caso o plano de Giulia ficar no Brasil não funcionem. Essa possibilidade agora está morta e enterrada a 7 palmos do chão, bem junto com a chance de seus pais a deixarem ir mesmo que ela quisesse.

Sua enfermidade a acompanhará em todos os anos de sua vida e ser assista por médicos sempre fará parte da sua rotina. Ela sente que está presa dentro de seu próprio corpo, trancafiada junto a algo que nunca teve a opção de negar.

- Boa viagem. - Marcela abraça seu irmão mais velho no aeroporto bem em frente à plataforma de embarque internacional. - Vou sentir saudades.

Carlos tinha adiado sua passagem para ficar com Marcela mais alguns dias, mas ele já tinha perdido uma semana de aulas e era hora de voltar à realidade que ele escolheu minuciosamente, e bem longe de sua família. Existe agora um pouco de mágoa no coração de Marcela, sentimento que ressoa de una certa inveja. Aquilo sobre sempre desejarmos aquilo que não podemos ter mesmo que não fossemos ser felizes de fato caso tivéssemos.

Marcela espera Bianca abraçar seu mais velho e depois mãe e filha assistem Carlos desaparecer depois da catraca.

- Você chora toda vez como se ele nunca tivesse ido - Marcela comenta, caminhando com os braços cruzados ao lado da mulher de terninho beje e scarpin preto que faz tec Tec no piso do aeroporto de Guarulhos.

- Nunca fica mais fácil - Bianca responde, encostando apenas a ponta de seus dedos no canto dos olhos para proteger a maquiagem. - Quando você tiver seus filhos vai entender.

Marcela teve vontade de rir. Filhos estavam, de forma definitiva, fora de seus planos para o futuro. Ela bateu a porta do carro e engoliu sua vontade de perguntar para a mãe sobre o intercâmbio. Nada mais foi dito sobre isso desde que Marcela saiu do hospital, mas a preocupação com ela sou triplicada a ponto do diretor autorizar que Marcela ficasse com seu celular durante o dia inteiro caso seus pais precisassem falar com ela. Nunca era algo urgente, mas sua mãe ligava pelo menos duas vezes durante o dia e seu pai uma, só para ter certeza de que nenhum dos sintomas havia voltado. Era uma preocupação verdadeira e que tinha seus motivos, mas irritava Marcela.

Talvez não irritasse tanto caso ela estivesse satisfeita com o resto das coisas em sua vida.

Começando pelo fato de que ela perdeu muito tempo fazendo os applications para ela e Giulia e acabou não estudando tanto para o vestibular quanto deveria, e agora eles estava quasse chegando e ela não poderia se sentir menos preparada para isso. No meio do furacão existem as provas no terceiro bimestre que ela está ficando na média ou abaixo dela, não importa quantas noites de sono esteja perdendo para estudar. Perder a apresentação final de Lisbete também a assombra até hoje, mesmo que sua colega de quarto tenha repetido diversas vezes que sua saúde era mais importante. Marcela continua se sentindo uma péssima estudante e amiga, as duas únicas funções nas quais sempre se orgulhou em ser boa.

- Mãe - Marcela está encarando Bianca dirigindo, essa não muda seu foco da rodovia. - Não vou passar no vestibular.

Confessar isso não deixa o peito de Marcela mais leve. O contrário acontece, na verdade, ela sente sua garganta travar e a vontade se chorar fica ali marinando enquanto ela espera a reação de Bianca. Sua mãe toma um longo e claramente desapontado suspiro antes de olhar para Marcela. Ela não diz nada, para o desespero de Marcela.