Capítulo 13 - Pôr do Sol

118 22 0
                                    

Marcela e Mônica estão dividindo uma das mesas de madeira brilhantes na cafeteria da escola. Existem outras 12 como essa, redondas e altas, e estão sempre cheias de adolescentes sentados ou em pé no intervalo das atividades.

O cappuccino de Marcela já esfriou e ela continua mexendo a pequena colher de plástico branca dentro da xícara de mesma cor. Ela não está prestando muita atenção no que a loira diz, mas a outra garota na mesa está.

Lisbete aceitou a ajuda de Mônica quando Marcela a convenceu de que seria a melhor decisão. Lis é muito boa em botânica, mas faltou nas aulas de planejamento e com isso toda a parte prática do projeto começou a se acumular. Elas têm uma comunicação travada, às vezes parecem que não são fluentes no mesmo idioma, mas parecem bem dispostas a se ajudarem. Marcela admira isso nas duas.

— Tu não achas, Ma? — perguntam. Marcela para de encarar a sua xícara e ergue os olhos para Lisbete. — A Mônica precisa conhecer teus amigos da outra escola.

Marcela olha para Mónica, que tem as sobrancelhas quase transparentes erguidas. Sua áurea mudou muito desde que começaram a frequentar esse lugar. As olheiras as redor dos olhos estão cada vez menos marcadas e ela sorri com muito mais frequência. O oposto vem acontecendo com Lisbete, o que faz com que o que Victor disse a Marcela pareça cada vez mais uma verdade.

— Sim, podemos marcar alguma coisa juntos — Marcela sussurra. — Meu irmão chegou na terça, nós vamos jogar RPG e assistir Moana na casa do Lucas no domingo. Acho que ele não vai ligar se você for.

Lisbete está sorrindo, mas Mônica se mantém neutra. Ela aperta os olhos abaixo do óculos, como se tentasse desvendar algum enigma.

— Vou perguntar pro meu pai se posso ir, mas acho que vou sim.

Marcela apenas assente e logo Lisbete e Mônica voltam a conversar sobre o planejamento do projeto, que precisará de mudanças bruscas se quiserem entregar o resultado que Lisbete prometeu para conseguirem o financiamento. Talvez Lucas tenha ido longe demais para um projeto de ensino médio, é o que Marcela pensa. Lucas tem uma imaginação bem fértil e o dom de comunicação assustador, o que o faz muito convincente, mas pouquíssimo prático. São essas duas coisas que, quando juntas, podem ser perigosas. É como se ele tivesse nascido com a alma de político, que pode prometer ideias mirabolantes e conseguir se eleger por fazer as pessoas acreditarem nessas ideias. Só que essas ideias permanecem no papel.

É o último dia de aulas do bimestre e Marcela segue contando os segundos para ir para casa e passar mais tempo com Carlos. A distância entre eles nesses primeiros seis meses do ano a machucam. Não foi culpa de nenhum dos dois, só ficou cada vez mais impossível eles encontrarem um horário no qual pudessem se falar. Com os pais e seus amigos, Marcela pelo menos tinha os finais de semana para abraçá-los, mas o irmão não. Marcela sente que a falta dele suga parte de sua vitalidade, ele é parte essencial de que ela é.

Ela está terminando de fechar a mala em deu quarto perto das 19h. Lisbete faz o mesmo na outra cama. Marcela tem certeza de que será estranho dormir longe de Lisbete por tantos dias depois de dividirem o quarto. Para o bem ou para o mal, Lis ajudou Marcela a encontrar um lar na escola nova e voltar para casa se apresenta como deixar sua outra casa para trás. É apenas por um mês, mas o ensino médio não dura para sempre e os pensamentos que cruzam a mente de Marcela é de como será quando ela fizer essa mala pela última vez.

— Você não vai usar esse short, está frio pra caramba — diz a voz feminina da terceira pessoa no quarto.

Elis é a irmã mais velha de Lisbete e Victor. Ao contrário dos irmãos, seu sotaque é quase imperceptível. Marcela a conheceu algumas semanas atrás, no meio da confusão onde Lis e Victor pararam de se falar. A voz dela é mansa e baixa, quase faz carinho nos ouvidos de Marcela.

— Vou levar — Lis determina, colocando o short jeans na mala preta.

Quando terminam de fechar a mala, Lisbete bate as rodinhas da mala no chão com força e suspira satisfeita. O som as malas sendo arrastadas pelo piso pode ser ouvido no andar de cima e no corredor aso lado, junto com vozes altas que geralmente são sussurros, e muitas garotas que contam os segundos para deixarem as dependências do colégio por algumas semanas. Pela janela cercada, Marcela observa a muvuca no pátio, quase tão terrível quanto aquela do primeiro dia. Os pais saem primeiro, deixando os filhos com suas malas no portão, e depois reaparecem dirigindo e brigam com os filhos que demoram para colocar as bolsas no porta-malas, mas a grande maioria tem motorista e nenhum deles têm um carro popular.

— Que horas seu irmão chega? — Elis pergunta enquanto acomoda a mala de Lisbete no porta-malas do Audi 2017 preto. — Certeza que não quer uma carona?

Marcela encara seu celular. Carlos disse que estava chegando 20 minutos atrás, deve estar parado no trânsito. Ela encara Victor, que já sentou no passageiro logo depois de colocar sua mala atrás, e ele acena para Marcela.

— Até agosto, 3 em 1! — Marcela sorri e balança a cabeça negativamente.

— Tem certeza que não quer ir no domingo? — Marcela pergunta.

Ela sabe que nenhum dos seus amigos gosta do Victor e que metade da responsabilidade é sua pela história que contou, mas Marcela não pode negar que quando Lisbete perdoou o irmão, ela em parte o perdoou também. Não confia nele, mas não nutre nenhum tipo de antipatia. Lucas, entretanto, poderia escrever uma carta de repúdio de 5 páginas sobre um cara que nunca sequer viu na vida. Ela queria que eles se conhecessem porque isso talvez amenizasse tudo o que aconteceu.

— Quer fingir que ela escola e todos nela não existem por 1 mês — confessa Victor, Marcela engole em seco.

— Até domingo — fala Lisbete, abraçando Marcela, que retribui apesar na mochila nas costas ser um empecilho.

— Última oferta de carona — Elis diz, fechando o porta-malas.

Marcela olha o celular de novo e depois a rua. Virando a esquina, ela encontra o carro cinza cuja placa decorou quando tinha 12 anos. Elis abraça Marcela antes de entrar no carro e dar espaço para que Carlos estacione bem na frente de Marcela.

O sorriso dele vai de orelha a orelha e ela imita seu gesto com as sobrancelhas.

— Atrasado — Marcela gesticula quando Carlos vem pegar sua mala preta enorme. Então se agarra na cintura dele, ignorando sua própria reclamação.

Marcela nem acredita que, de fato, sobreviveu 6 meses no novo colégio e nem em tudo que aconteceu até agora. Quando bate a porta do passageiro e coloca o cinto de segurança, tem vontade de chorar. Espera que Carlos se afaste mais do colégio, mas não consegue segurar mais quando o irmão para no farol vermelho e lhe pergunta se ela está bem.

Está? Marcela não tem de fato uma resposta. Tudo está ótimo e péssimo quase na mesma intensidade. Suas notas foram ótimas, mas ela mal viu seus melhores amigos. Ela ajudou Mônica a ser mais feliz, mas não responde as mensagens de Giulia desde que ela foi para a casa da Camilla e depois de sua avó. Ela sente menos saudade de casa, mas ainda é como se andasse todos os dias com um dos dedos da mão faltando e se Carlos fosse perguntado sobre duas coisas que aconteceram a ela nesses últimos meses, ele não saberia responder. Ela também não saberia responder quase nada sobre ele.

— Senti muito a sua falta — é a única coisa que Marcela diz. Carlos assente e aperta o ombro de Marcela.

— Sim, vai ser estranho morar em casa de novo — Carlos gesticula a resposta que Marcela não sabia que precisava saber. Ele dá partida no carro e ela observa o pôr do sol avermelhado e intenso devido à poluição da capital.

Pensa que então a vida é isso. As coisas continuam bem quando nada está bem, quase na mesma intensidade de beleza de um pôr do sol provocado pelas piores coisas que circulam no ar; Tóxica. A vida. Bonita. Também. 

⚢ Não Mate Borboletas Por Ela ⚢ [Completo]Tempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang