29 Preciso dizer adeus

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Voltei!!!
 
Divirtam-se!!!
 
 
 
O dia em Metrópolis tinha começado com o céu azul. O vento gélido continuava a circular por todos os cantos, mas os dias nublados pareciam ter dado uma trégua.
 
Do lado de fora da casa de Alex e Sam, Lena estava quase no meio do quintal olhando para o nada. Estava parada ali já havia um bom tempo tentando compreender tudo o que aconteceu em seu vida nos últimos três meses e em especial na noite anterior. Sua vida, desde que se entendia por gente, já era um completo caos, mas parecia que as coisas escalonaram rápido demais em pouco tempo.
 
Finalmente, pela primeira em anos, estava livre. Não era uma liberdade que a qualquer momento podia ser tirada, assim como aconteceu quando Lizzie tinha dois anos, era sua liberdade total. Era a liberdade que a dava a chance de retornar às rédeas da sua vida.
 
Era emocionante e assustador ao mesmo tempo.
 
Por mais que estivesse extremamente pensativa com tudo isso, não foi o suficiente para não sorrir quando escutou passos atrás de si. Sabia quem era. Era a pessoa que fazia seu coração bater mais forte.
 
— Eu acordei e não te encontrei na cama — Kara disse a abraçando por trás. — Achei que você tinha fugido de mim.
 
— Às chances disso acontecer são quase nulas.
 
Kara começou a distribuir beijos no seu rosto enquanto a inclinava para o lado. Havia muitas coisas que adorava na vida, mas nenhuma delas se comparava a demonstrar como gostava de dar todo o carinho que Lena merecia.
 
— Porque está aqui sozinha a essa hora da manhã? — perguntou quando parou sua sessão de beijos.
 
— Eu acordei e não consegui voltar a dormir. Como não quis te acordar, vim aqui tomar um ar e pensar um pouco.
 
— E o que está pensando?
 
— Só agora caiu a ficha que Lex estava com uma arma apontada para a minha cabeça e estava disposto a atirar — suspirou. — Eu sabia que ele me odiava, e você já havia me dado provas que ele vinha tentando me matar. Só que é assustador saber que ele faria aquilo com as próprias mãos. Quer dizer, é mais assustador do que já era.
 
— Eu não deixaria ele atirar. Eu atiraria nele antes.
 
— Eu sei que faria isso — jogou a cabeça para trás a apoiando no ombro esquerdo de Kara. — Agora estou livre. Chega ser assustador.  Não que eu quisesse permanecer a vida inteira seguindo o que me dizem, longe disso, mas é que pra quem sempre esteve presa, se dar conta que não está mais, assusta. Você me entende?
 
— Entendo. E isso é complemente normal. O que seus pais e seu irmão fizeram, te afetou de muitas formas. Só muita terapia e o tempo pra superar isso. Mas sei que você vai assumir todo o controle da sua vida. Você é mais forte do que pensa, é mais corajosa do que pensa, é mais incrível do que pensa — deslizou seu nariz delicadamente pelo pescoço totalmente exposto. — Você é uma mulher maravilhosa. Uma mãe maravilhosa. Uma amante maravilhosa — sussurrou a fazendo rir. —  Você vai saber o que fazer com a sua liberdade.
 
Respirando fundo, Lena concordou lentamente com o que ouviu de Kara. Precisaria mesmo de tempo e de muita terapia para entender melhor que agora era completamente dona de si. Não havia mais chantagens. Não havia mais ameaças. Não havia mais medo. Havia ela, Lizie, Kara e um mundo que queria desbravar ao lado delas.
 
— Agora não preciso fingir que faço parte de uma família. O que é triste, pois sempre desejei do fundo do coração uma.
 
— Eu já te disse uma vez e vou repetir — antes de dizer, virou Lena para ficar de frente para ela. — Eu posso ser sua família se quiser. Na época que eu disse isso, eu nem sabia sobre a Lizzie, mas nós três podemos ser isso. Além disso, desde que você queira permanecer ao meu lado, o que é meu também passa a ser seu. Eu tenho uma irmã mais velha turrona e superprotetora que eu sei que gosta de você. Ela só nunca vai admitir. Também tem a falsa esposa dela que é a melhor amiga que alguém pode ter e ela vai adorar fazer minha caveira pra você. Eu também tenho minha mãe e aposto que ela vai te amar assim que te ver, pois você ama a filha favorita dela — Lena riu com o que ouviu. — Essa pode ser sua família. Pode não ser do jeito que você queria, mas pode ser sua.
 
— Eu ainda acho que morri e fui para o céu para encontrar um anjo como você — deslizou as mãos pelos braços de Kara e então a olhou nos olhos. — Nem sei como te agradecer por tudo. Sempre tive problemas de confiança, ainda mais depois do que Andrea fez. Fico feliz por ter confiado em você, e você não ter estragado isso.
 
— Não tem que me agradecer por nada. Nós tínhamos um plano juntas e fomos uma dupla incrível. Você confiou em mim, e eu em você. E enquanto eu estiver ao seu lado, não quero quebrar isso que criamos, quero fortalecer mais e mais — seus lábios se curvaram um pouco. — Você que é meu anjo, é o meu bem, é o meu bebê coala, é a pessoa que mais amo. Depois da Lizzie, claro. Você é a melhor pessoa que eu podia encontrar na vida.
 
Toda vez que Kara demonstrava que tinha afeição por Lizzie, Lena se derretia um pouquinho mais por ela.
 
— E você é o meu amor. O primeiro, romanticamente falando. E espero que seja o último, pois quero ser essa pessoa pra você.
 
— Queremos as mesmas coisas.
 
Grudando seus lábios, Kara se sentia totalmente preenchida de sentimentos bons. Agora sabia que não precisava mais ser imprudente ou se colocar em risco para se sentir viva. Bem ali nos seus braços tinha alguém que fazia isso da forma mais amorosa possível. E era por querer seguir adiante que achava que estava na hora de finalizar alguns ciclos.
 
— Você sabe que eu te amo, não sabe? — Kara perguntou finalizando o beijo. — E que meu coração é inteiramente seu.
 
— Sei.
 
— Eu queria que você fizesse uma coisa comigo — levou as mãos até os cabelos escuros os jogando para as costas de Lena.
 
— O que? — perguntou curiosa. — Não vai me levar para pular de paraquedas, não né?
 
— Não, mas um dia vou te convencer de fazer isso — analisou o rosto de Lena antes de voltar a falar. —  Eu... eu finalmente conclui o caso mais complicado da minha carreira. Eu consegui cumprir o que te prometi e logo você vai estar com a Lizzie. Quando isso acontecer, estarei em paz e feliz por não ter decepcionado vocês — apertou os lábios. — Só que antes, eu preciso dizer adeus a algumas coisas e, uma em especial, eu queria que você estivesse comigo.
 
— Estarei com você.
 
— Então depois do café, a gente vai fazer isso.
 
— Você vai ter que me emprestar suas roupas — sorriu. — Eu vim pra cá só com a roupa do corpo. Curiosamente, você me empresta muito as suas roupas.
 
— Adoro ver você com elas — segurou sua mão e começaram a caminhar para dentro de casa. — Ontem, um bom tempo depois que você dormiu, Alex veio me entregar algumas roupas suas. A mansão vai ficar alguns dias interditada, então ela se lembrou desse detalhe que esquecemos.
 
— Eu não lembrei de nada. Só queria sair de lá e ficar perto de você.
 
— Eu não lembrei pelo mesmo motivo — se inclinou um pouco para o lado para dar um beijo no rosto de Lena. — Vou fazer um reforçado café da manhã para você já que faz horas você não come.
 
— Tão cuidadosa.
 
— Com as pessoas que amo, eu sou. E eu te amo.
 
Como havia dito, Kara realmente fez muitas coisas para Lena comer. Tudo o que sabia que ela gostava dedicou seu tempo preparando.
 
Enquanto andava de um lado para o outro na cozinha, Lena a assistia concentrada e sorria toda vez que seus olhares se cruzavam. Quando estavam juntas, tudo sempre parecia mais leve, mas dessa se sentiam quase flutuar.
 
Lex estava errado, Kara não a dava migalhas de afeto. Kara, desde que se conheceram, foi atenciosa, carinhosa e protetora. Se rendeu a ela a ponto de contar seus segredos por ela ser um combo completo de pessoa amável.
 
Podia ter quebrado a cara. Podia ter contado seus segredos e seus medos, e Kara usar isso exclusivamente para por um fim na sua investigação e prender o real assassino de sua falecida esposa. Se depois de tudo, tivesse descoberto por Lex quem ela realmente era, seu coração seria quebrado em mil pedacinhos. Mas Kara teve consideração o suficiente para não fazer isso e para ser sincera sobre tudo.
 
Uma vez, viu nos olhos de Kara a solidão e tristeza que também havia em si mesma. Talvez esse tenha sido o ponto de ignição das duas para tudo acontecer. Pode ter sido rápido, mas foi fácil. Fácil como o amor deveria ser.
 
Queria tê-la conhecido anos antes. Porém, se Kara tivesse entrado na sua vida anteriormente, mesmo que com uma identidade secreta, poderia acontecer das coisas não serem como foram. Foi o que cada uma passou nesse tempo que nem sabiam da existência uma da outra que as fizeram ter sensibilidade para o que encararam.
 
De todo jeito, o importante era o que estavam vivendo agora.
 
O café da manhã foi tranquilo e feito num silêncio bastante confortável. A conversa era muito mais no olhar do que nas palavras.
 
Alex e Sam não se juntaram a elas, pois ainda estavam dormindo por terem chegado tão tarde. Ainda assim, Kara também preparou o café da manhã para elas.
 
Embora não conhecesse muito bem a cidade de Metrópolis, Kara sabia para onde estava indo quando pegou um dos carros da garagem e, depois de passar numa floricultura, seguiu pela estrada principal.
 
Lena imaginava onde aquele trajeto iria levá-las e as flores só davam mais indícios de que seus pensamentos estavam certos. Mas, ao invés de perguntar para Kara qualquer coisa, a deixou livre para falar quando quisesse.
 
Por ser domingo, as estradas aquela hora da manhã não estavam lotadas. Em menos de uma hora, atravessaram os portões do memorial de Metrópolis.
 
Estacionando o carro, Kara o desligou virando a cabeça para o lado buscando os olhos verdes que tanto amava.
 
— Se sente incomodada com isso?
 
— Não. Você não havia me dito que ela estava enterrada aqui.
 
— A família dela é daqui. Eu... eu nunca tive coragem de vim — revelou com um pouco de pesar. — Eu até tentei no dia, mas nem consegui sair de Nova Iorque.
 
— Tudo bem — pegou a sua e levou até os lábios beijando o dorso. — Eu entendo. Não é fácil.
 
— Você voltou para ver sua mãe? — seus olhos estavam um pouco marejados.
 
— No tempo em que eu morei na Irlanda. Só consegui ir uma vez. Fui porque sentia que precisava me despedir. Quando ela morreu, eu era muito nova e não entendia nada disso.
 
— É — suspirou pesadamente. — Eu preciso me despedir. Acho que nunca consegui fazer isso porque sempre me senti em dívida com ela.
 
— Ainda se sente assim?
 
— Quando matei a Mercy, a culpa continuou. Achei que me vingar com as próprias mãos faria diferença, mas não fez. Eu gostaria que ela tivesse me contado o que estava fazendo — ficou um pouco pensativa. — Ontem, quando prendi seu irmão, um peso enorme saiu das minhas costas. Depois que você dormiu, fiquei pensando muito sobre isso e então me dei conta que... eu fiz o que podia. Espero que ter concluído esse caso, a dê um pouco paz onde ela está, pois finalmente sinto que estou próxima de encontrar a minha. E, embora você já me tivesse por completo, preciso me despedir pra seguir sem olhar pra trás.
 
Assentindo lentamente, Lena continuou segurando a mão de Kara. Compreendia o que ela estava dizendo, não deveria ser fácil passar dia a pós dia se culpando por uma coisa, procurando respostas e não chegar a lugar nenhum.
 
Nunca duvidou dos sentimentos de Kara e de sua sinceridade. Nem mesmo achou que ela a estava usando para tampar o buraco que Lucy Lane deixou na sua vida. Entendia a delicadeza da sua situação e ficava contente que ela estivesse preparada para uma despedida.
 
Quando desceram do carro, Kara imediatamente procurou pela mão de Lena. Na outra segurava as flores que havia comprado. Para não perder tempo perambulando por aquele lugar, pediu informação sobre onde estava a lápide daquela que um dia chamou de esposa.
 
Embaixo de uma árvore, estava escrito numa pedra quadrada de mármore o nome de Lucy. A frase logo em baixo registrava que ela era amada por muitos.
 
Soltando a mão de Lena, Kara se agachou colocando as flores ao pé lápide. Do bolso de seu casaco, tirou a aliança que havia guardado por todo esse tempo a colocando ao lado das flores. Ao se levantar, passou seu braço esquerdo ao redor de Lena, sem a olhar.
 
— Os gregos antigos diziam que quando os deuses amam alguém o leva jovem desse mundo — disse com a voz um pouco embargada.
 
— É nisso que você acredita? — Lena a abraçou pela cintura e a encarou.

— Não sei se acredito em algo assim, mas também não sei se desacredito totalmente — olhou para Lena. — Ela foi embora cedo não foi? Ela era amada aqui, mas mesmo assim foi levada desse mundo.
 
— Ela foi tirada de forma cruel daqui. São coisas diferentes, embora sigam uma linha tênue.
 
— Pode ser — voltou a olhar a lápide. — Durante muito tempo perguntei a qualquer deus que possa existir o motivo de ter sido ela. Fiquei com raiva, chorei e praguejei aos quatro ventos. Quando ela partiu, me senti perdida. Eu não sabia o que fazer. Pensei em desistir de tudo. De tudo mesmo. Conforme os meses foram passando, cada vez mais eu percebia que estava me acostumando com uma vida sem ela e isso me deixou frustrada. Achei que estava traindo a memória dela.
 
— Está pensando nisso agora? — sua expressão era de curiosidade.
 
— Não. Eu sentia isso por que a amava e, quando o amor sessou, isso se estendeu pelo sentimento de culpa. Sempre vou lembrar dela com carinho, mas agora as coisas são diferentes — voltou sua atenção para Lena e então sorriu. — Obrigada por estar aqui comigo. Você é a única pessoa possível com quem eu faria isso.
 
— Eu estarei sempre aqui por você.
 
Deixando um beijo nos lábios de Lena. Kara olhou para o nome de Lucy uma última vez e disse seu adeus mentalmente.
 
Assim que passou com o carro mais uma vez pelo portão do memorial, Kara respirou fundo e seguiu adiante.
 
Estava contente por ter feito o que fez e por Lena ter estado ao seu lado. Alex, Sam e até sua mãe já a tinham oferecido para fazer aquilo com ela, mas sentia que tinha feito com a pessoa certa.
 
Esperava do fundo do coração que os deuses não a amassem a ponto de tirá-la da vida das pessoas que eram importante para ela. Por três longos anos, ficou remoendo toda a dor, raiva e arrependimento que podia enquanto buscava respostas, que deixou de lado muitas coisas por isso.
 
Conhecer Lena a fez voltar para realidade. Uma realidade de que podia ser feliz de novo, podia se apaixonar, amar mais uma vez e que podia fazer planos com outra pessoa sem se sentir mal por isso.
 
Foi difícil dizer adeus, mas conseguiu e se sentia bem por ter conseguido. Agora se dedicaria a Lena e Lizzie. Elas eram seu futuro e não havia nada que não fizesse por elas. As amava de todo coração e mostraria isso enquanto tivesse chance.  
 
Estava tudo diferente na sua vida, mas agora sentia que, finalmente, as coisas estavam começando a se encaixar em seu devido lugar.
 
O  ciclo mais doloroso de sua vida, havia acabado de ser enterrado e, assim como Lena, tinha a sua total liberdade.
 
 

:)

The BodyguardWhere stories live. Discover now