Vozes Visíveis (A Ruela)

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       Demorarei para me mover. Para dar o primeiro passo. O caminho é escuro mas nele se divisa uma tênue luz em raios altos, ou, melhor, de média altura, em raios intermitentes.

       Na verdade creria que elas, as luzes, piscam baixas, quase rentes ao solo. Ou seriam no próprio solo? Espero. Espero para me mover. Espero saber quando darei o passo seguinte. E, se após este, haverá outros. Haverá? É de chão cinza este caminho, de pedra e poeira cinzas. É largo, e não distingo no escuro se há paredes que o divisam. Haverá paredes? Haverá caminho? Espero o próximo passo, se este houver. Depende de eu mover o pé, mas o pé vacila, tenta levantar-se pelo tornozelo mas o tendão do tornozelo me dá uma fisgada, uma pontada que dói.

       Mas não evito a dor, ela não é exatamente um problema, quero dizer "o problema". O problema maior é dar o passo em si, o segundo. Não evito a contratura e mesmo me fisgando dou o segundo passo. Ou espero para dá-lo. O segundo... depois haverá outro?

       Haverá outros, espero no escuro. Os raios intermitentes continuam, no solo, no solo. Piscam para mim como se me chamassem, como se sorrissem. Não temo a dor nem a alegria. Espero no escuro com os raios. Haverá o terceiro? Haverá? Darei o terceiro passo. Esperem.

Entre Sombras e FrutosWhere stories live. Discover now