c a p í t u l o 07

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Três semanas passaram num piscar de olhos e quando o final da semana chegou trazendo uma semana de pausa na primavera fiquei imensamente grata, estava absurdamente exausta por tentar assimilar o novo método de ensino. Iris e eu nos aproximamos bastante desde o dia em que ela me defendeu do Heather & Cia., ela continuou sentando atrás de mim e comendo meu lanche mas não me incomodei com isso. Apesar de ainda ter muitas reservas e não querer me magoar outra vez, senti que poderia confiar na menina com olhos de ônix. Estranhei seu jeito no início, fiquei com o pé atrás até perceber que ela era uma das pessoas mais interessantes que eu já conheci em toda minha vida. Assumo que fiquei bastante assustada com o seu humor irreverente, inteligente, sarcástico, ácido e diferenciado, - como ela mesma definiu - mas também nunca dei tanta risada ou embarquei em conversas tão complexas ou malucas quanto as que nós tivemos. Ela é confiante e muito inteligente, isso ficou claro quando a professora de química pediu para ela levantar e resolver uma equação no quadro. Eu fiquei nervosa mas ela apenas sorriu e resolveu a equação enquanto explicava qual fórmula estava usando para chegar naquele resultado. Segurei uma risada quando Iris entregou o piloto com um sorrisinho de lado e voltou desfilando para o seu lugar.

Após a confusão que rendeu uma mancha roxa bastante dolorida, comecei a ficar na biblioteca durante os intervalos, Iris amava ler e o lugar era um paraíso durante a confusão do almoço. Passamos a maior parte do tempo falando dos lugares onde já vivemos e até consegui contar o que tinha acontecido com Jessica e Victor sem querer enfiar a cabeça num buraco de tanta vergonha. Ela não riu ou me julgou quando contei que tinha dormido com Victor sem estar namorando sério e ela me contou histórias hilárias sobre alguns meninos que já gostou. Enquanto conversávamos reparei que ela tinha uma tatuagem, talvez um nome, em seu pulso esquerdo que geralmente ficava escondido debaixo do uniforme ou os casacos que ela não tirava do corpo, quando ela viu que eu estava tentando decifrar o que era, dobrou a manga do blazer e mostrou a tatuagem de um nome escrito numa linha bem fina com letras cursivas. August. Passei o dedo pelo nome e ela pigarreou antes de começar a falar.

- Lembra quando nos conhecemos e Christy disse que eu não consegui salvar nem meu melhor amigo? - Assenti olhando em seus olhos, não me surpreendi quando vi mágoa, culpa e saudade flutuando naquela imensidão escura. - Ele foi a primeira pessoa que eu conheci quando cheguei aqui, pouco antes do meu pai assumir a diretoria do colégio. Ele era minha outra metade, sabe? Nossos gostos eram iguais em absolutamente tudo e precisávamos urgentemente da mesma coisa: criar raízes, ter um lugar para chamar de nosso. August se tornou meu porto seguro e eu o dele, desde o início sabíamos que pertencíamos um ao outro; simples assim. Com o passar do tempo percebemos que não nos gostávamos como menino e menina mas como irmãos, nossa tentativa de primeiro beijo foi patética, foi então que descobrimos que éramos companheiros de alma. - Ela contou, os olhos cheios d'água. - Éramos inseparáveis, fizemos planos que juramos cumprir assim que terminássemos o colégio, não existia espaço para mudança até que o inferno começou, ele tinha dezesseis anos quando contou para a mãe e o padrasto que gostava de meninos. O padrasto dele reagiu da pior forma possível, bateu tanto nele, tanto. - Ela diz fechando os olhos e deixando as lágrimas rolarem por suas bochechas cheias de sardas. Respiro fundo tentando controlar os sentimentos que estou sentindo. - Ele chegou na minha casa todo machucado, não me disse o que tinha acontecido em casa, ele falou que foi assaltado e naquele dia foi a primeira vez que ele mentiu pra mim. Ele voltou para casa como se nada tivesse acontecido e Derick, seu padrasto, começou a ameaçá-lo e dizer que não iria aceitar nenhum tipo de comportamento "pecaminoso ou promíscuo" debaixo do teto da casa dele.

- Mas e a mãe dele? - Perguntei passando a manga do blazer nos olhos para secar as lágrimas.

- Elene era uma ótima mãe até descobrir que o filho era gay. Ela ficou do lado do marido e contra o único filho, até hoje isso me revolta de um jeito que eu seria capaz de atear fogo numa casa com Derick e Elene dentro. Como o pai de August faleceu quando ele ainda era pequeno, ele só tinha a mãe. Não tinha ninguém por ele, só uma menina patética que achava ter a força necessária para ajudar o melhor amigo. Logo após a surra ele começou a mudar, aos poucos eu vi meu melhor amigo se fechar dentro de si mesmo e eu não consegui fazer nada para evitar isso. Ele estava triste e irritado o tempo todo. Nós brigamos feio, chegamos ao ponto em que ele quase me deu um tapa na cara, foi horrível. Pouco tempo depois ele começou a fumar, ele me dizia que o cigarro era sua válvula de escape e prometeu que não iria além daquilo, outra mentira. Logo depois vieram as bebidas e os remédios para ansiedade, não sei como ele conseguia mas o estoque era quase interminável. - Ela diz balançando a cabeça de um lado para o outro como se estivesse espantando as imagens de sua cabeça.

The Only Reason - HSWhere stories live. Discover now