Seguir em frente

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Tia Laura e eu decidimos que o velório da minha mãe seria fechado. Apenas parentes e amigos mais próximos poderão entrar no salão de tamanho mediano e se despedir. Foi a saída que encontramos para preservar nossa família e a imagem da minha mãe, uma vez que sua morte se tornou um dos assuntos mais comentados na mídia brasileira e neste exato momento centenas de abutres estão atrás de uma única foto para publicar.

Sentada numa salinha isolada da capela, tento me distrair com o celular. Noto que meus fãs enviaram milhares de palavras de consolo através das redes sociais e subiram uma tag linda no twitter, o que faz com que, por um momento, eu me sinta realmente abraçada por cada um. Infelizmente não é o suficiente para amenizar a dor que estou sentindo. Eu perdi meu chão, praticamente um pedaço de mim. Mensagens carinhosas podem ser reconfortantes, mas jamais a trarão de volta.

Deixo o pequeno aparelho de lado e paro para pensar nos últimos anos da minha vida. Desde que fiquei famosa, aos 17 anos, eu simplesmente não parei. Toda semana eu tinha eventos, ensaios, idas ao estúdio para gravar músicas. Depois vieram os shows, mais eventos, ainda mais ensaios. Houve um tempo em que cheguei a passar três meses sem pisar em casa. Os compromissos foram ficando cada vez mais freqüentes, até que consegui ultrapassar as fronteiras do Brasil, consolidando minha carreira internacional.

Toda a minha família ficou orgulhosa, claro, era a realização de um sonho. Mas então, precisei me mudar para os Estados Unidos. Foi quando minha vida, que já era corrida, se tornou uma verdadeira maratona. Se antes eu mal conseguia ver mamãe, Belinha e tia Laura, passei a mal conseguir falar com elas também e acabamos nos distanciando até certo ponto.

No total, contando desde o início da carreira até o momento, foram três anos. Eu perdi praticamente três anos da vida da minha mãe. Só no último ano, por estar vivendo em LA, perdi o nosso natal em família, a festa de ano novo, o dia das mães, os aniversários. Tudo por fama, dinheiro e popularidade. Tudo para estar entre as melhores, no topo das paradas. Agora que ela partiu, sinto como se nada disso tivesse valido a pena. Para chegar onde cheguei, perdi momentos de valor incalculável. Jamais poderei recuperar o tempo perdido, não importa o que eu faça.

- Any? - ouço Belinha me chamar. Pega de surpresa, tento secar as lágrimas que inundam minha face.

Minha irmã acaba de entrar no cômodo onde estou e se aproxima, parando ao meu lado. Seu rosto está abatido, os olhos encontram-se extremamente vermelhos e inchados. Imagino que meu rosto esteja da mesma forma, mas pela primeira vez, eu não ligo. Minha aparência é a coisa menos importante no momento.

- Sim? - respondo num fiapo de voz.

- Tia Laura pediu para que eu te chamasse. Está na hora do enterro. Vamos sair em 5 minutos.

- Tudo bem. Diga a ela que estou indo.

Assim que ela deixa a sala, ergo minha cabeça e encaro o teto amarelado na tentativa de que as lágrimas cessem. O efeito é justamente o contrário. O fluxo se torna ainda mais intenso, chegando a embaçar minha visão.

Duas semanas depois...

Ainda é madrugada quando meu avião pousa em Los Angeles. Parece estranho, mas me sinto bem em estar de volta. É hora de seguir em frente, afinal.

Antes de partir, pensei em trazer Belinha e tia Laura para viver comigo agora que seriam só as duas, mas elas se recusaram. Minha irmã era apegada demais a sua escola e seus amigos para deixá-los, enquanto minha tia tinha seu emprego, sua própria vida. Foi por isso que acabei voltando sozinha.

- Any! Aqui! - Josh grita e acena para mim. Mesmo de longe, posso ver que ele está sorrindo.

Caminho pelo aeroporto a passos rápidos, empurrando o carrinho com as minhas malas. Quando finalmente nos encontramos, o loiro me abraça tão forte que acaba me erguendo.

- Estou feliz em ver você! - ele diz com o rosto entre os meus cabelos. - Senti saudade.

- Também senti saudade. - nos soltamos.

- Desculpe por não ter voltado ao Brasil para o enterro da sua mãe. Acabei perdendo o meu passaporte e o novo não ficou pronto a tempo. Como você está?

- Considerando o fato de que passei pelo pior momento da minha vida, acho que agora estou um pouco melhor.

- Parece um bom começo. - ele segura minha mão. - Vem, vou te levar pra casa.

Depois de me ajudar a guardar minha bagagem no porta malas de seu carro, Josh dirigiu calmamente até o meu apartamento. Para a minha surpresa, tudo estava na mais perfeita ordem. Havia até um buquê de flores em um vaso, na mesinha de centro da sala.

- Que lindas! - sorrio admirando as tulipas vermelhas. - Quem mandou?

- Ninguém, na verdade fui eu quem trouxe. - o loiro se aproxima. As mãos estão enfiadas nos bolsos da calça jeans. - Quando você avisou que estava voltando quis fazer algo para te animar, então pensei que flores seriam uma boa ideia. - ele dá de ombros, parecendo tímido. - Você gostou?

- Eu adorei, Josh. Obrigada. - pouso minhas mãos em seus ombros e lhe dou um selinho demorado. Ele enlaça minha cintura.

- De nada. - seus lábios se curvam num sorriso. - Quer que eu prepare algo pra você comer?

- Não precisa, não estou com fome agora. - balanço a cabeça. - Quero apenas tomar um banho e descansar.

- Certo. Vou ficar aqui caso precise de mim, tudo bem? - ele indica o sofá.

- Tenho uma ideia melhor. - umedeço os lábios. - Me espera no quarto? Acho que um pouco de carinho vai me fazer bem.

Your Love Saved Me • BeauanyWhere stories live. Discover now