Capítulo 43 - Tempo perdido

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.•**•..•**•..•**•..•*KAYA*•..•**•..•**•..•**•.

   Acordei cedo. Apesar da noite incrível, eu levantei frustrada. Estava cansada, precisava dormir mais um pouco mas minha filha não esperava. Coloquei-a no colo, amamentei-a e cantei para ela. Eu amava nossos momentos juntas. Qualquer ruído que ela produzia - que não fosse ligado a cocô - me deixava encantada. Mesmo quando eu sentia dor, tristeza, raiva... tudo se acalmava quando ela colocava aqueles olhinhos brilhantes em mim.

   —Vamos tomar um banho, hum? —Falei, enquanto tirava a roupinha dela. —Você tá um fedorzinho só.

   Ela sacudiu as pernas em resposta, fazendo meu coração bobo derreter. Enchi a pequena banheira, peguei o sabonete e posicionei-a em meu braço. Delicadamente, passei o dedo em sua pele; morria de medo de machucá-la. Eu ainda não acreditava em tudo aquilo: minha filha em meus braços, tirando de mim toda aquela frieza e brutalidade. Ela veio em um momento turbulento, destinada a me salvar.

   Eu já secava Dalila quando ouvi uma agitação no lado de fora da tenda. Ouvi alguém entrar na minha humilde residência. Descobri que era Rainara.

   —Kaya? —Ouvi sua voz abafada.

   —Aqui! —Respondi detrás da cortina.

   Ela surgiu com um sorriso alegre no rosto, a voz embargada. Não lembro quando a vi tão feliz.

   —Acabou, Kaya! Acabou!

   —O que acabou? —Perguntei, deitando Dalila em minha cama para vesti-la.

   —A guerra, querida! Estamos livres!

   Quando dei por mim, estava quase gritando de felicidade. A guerra acabou! Abracei Rainara e beijei minha filha. Meu peito pulou, sorri e agradeci aos anjos. Até que, num ímpeto, minha mente clareou.

   —Espera, como acabou? Eles aceitaram o tratado?

   —O que importa, Kaya? Estamos livres! —Ela disse e saiu, saltitante.

   No lado de fora, música e gritos de felicidade enchiam o ambiente. Me perguntei como todos estavam se sentindo, o que pensavam. Perdemos muito com a guerra: mães e pais perderam filhos, filhos perderam pais e mães; amigos enterraram uns aos outros, apoiaram-se e lutavam para não enlouquecer. Os reis controlavam-nos, seus pobres peões, a fim de alcançarem seus objetivos. Nos odiávamos sem nenhum motivo. Não sabíamos pelo quê lutávamos mas lutávamos mesmo assim. Na verdade, sabíamos pelo que lutávamos. Era por nossa vida, pelo básico. Pequenas coisas eram grandes vitórias para nós. Mais um dia vivos, mais um pacote de comida, mais uma garrafa de água, menos uma ferida.

   Terminei de vestir minha filha e tomei-a em meus braços. Segui para o lado de fora, a fim de ver a festa que havia começado. Mulheres agruparam-se no centro do pátio, dançando e sacudindo as saias de seus vestidos. Os sorrisos em seus rostos e seus cantos me fizeram sorrir comigo mesma. Puxaram os homens para dançar e eles também ostentavam sorrisos cheios de dentes. Rainara batia palmas no ritmo da música, os cozinheiros pararam tudo para participar da festa e tocar instrumentos, batucar. Os soldados relaxaram sem deixar os postos, observavam as moças dançarem enquanto fofocavam.

   Eu estava absorvida pela imagem e pelo som, cantando baixinho para Dalila a canção que os tambores e violas determinavam, quando braços quentes me envolveram. Preparei-me para gritar mas reconheci as mãos de Ethan. Ele deixou um beijo na região entre minha orelha e meu pescoço, fazendo-me arrepiar.

   —Não acredito que estamos livres, Kaya —Pude sentir o calor de suas palavras em minha orelha.

   Não sei por que mas lágrimas encheram meus olhos quando ele falou isso, me abraçando. Eu estava tão feliz que estava prestes a chorar. Encostei a cabeça em seu ombro.

Os Dons de Lithia: Entre o Amor e a Guerra Onde histórias criam vida. Descubra agora