eu não creio que você fez isso

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Acordo cansado, mas é porque dormi tarde assistindo alguns programas. Estou meio mole, mas tomo um banho, lavo o cabelo e vou comer. Ontem à noite recebi o telefonema de um velho conhecido, Christopher, para que nos encontremos hoje e coloquemos o papo em dia, mas eu sei bem o que vai acontecer. É como se isso fosse um codinome, um sinal, uma pista para a verdade. Provavelmente iremos nos beijar mais do que falar.

Tornei-me um preguiçoso que dorme tarde e acorda tarde da manhã no fim de semana. E agora estou aqui, penteando meu cabelo como se precisasse gastar tanto tempo assim para ficar bonito para alguém. Acho que não quero ficar bonito para ele, eu quero ficar bonito para mim. Para quando eu me olhar no retrovisor do carro dele e me sentir majestoso. Para quando ele me beijar forte, empurrando-me contra o couro do banco, eu continue olhando pelo retrovisor: estou majestoso. E quando sobrar resquícios do lip tint em meus lábios, eu olhar pelo espelho do banheiro e concluir que ainda estou majestoso. É o porquê de eu estar alisando mais ainda meu cabelo.

Não daria tempo de hidratar, pois então dou uma adiada nesta rotina de care yourself. Checo a roupa, o cabelo, os olhos, a bolsa preta discreta que escolhi para guardar meus documentos e os demais objetos essenciais. No meu quarto bege, com a cortina sacudindo-se - confusa entre deixar a luz solar penetrar o quarto ou não -, tiro foto frente ao espelho comprido de borda dourada e posto para que eu me sinta majestoso. Porque hoje eu me sinto majestoso.

Enfio uma porção de ravioli para dentro e fico à espera dele, morrendo de tédio entre conversas que não tenho o mínimo de interesse em continuar - eu e minha mania de ser simpático contra minha própria vontade - e fotos respingadas de filtros. Quando estou tomando minha segunda porção de sorvete de menta, a campainha toca. Jesus, que demora.

- Se perdeu no meio do caminho, príncipe? - pergunto, assim que abro a porta. - Tem dois anos que não te vejo e vai simplesmente me dar um bolo?

- Olá para você e sua gentileza em cumprimentar os velhos amigos - abraça-me rapidamente, vindo ele mesmo fechar a porta de casa. - Você tá um bebê, Josh.

Um elogio bem superficial, mas é o que tenho para hoje.

- Você está esplêndido - sorrio. - Se cansou da Inglaterra?

- Mais ou menos. Vou ficar pela América por enquanto, já que meu contrato expirou e não tem um porquê para renovarem. Mas minha agência ainda está de pé comigo, então vou participar de alguns programas por aqui e talvez, com sorte, consiga entrar em alguma série ou ser o crush bonito no Vídeo Clipe de algum grupo feminino - vai contando enquanto andamos em direção ao carro que com certeza é emprestado.

Christopher é muito de momentos, então ele quer se importar em ser feliz agora e deixar o futuro nas mãos do seu eu futuro. Ele fez boas decisões na vida, de um modo geral, mas costuma se arrepender facilmente. Tentou culinária também, anos atrás. Quando eu estava nos últimos semestres, ele estava nos primórdios. Pediu ajuda a mim, visto que minhas habilidades eram um tanto conhecidas pelo campus. Decidi ser seu mentor e, quando estava tentando dar um jeito nele, a criatura decidiu trancar e se mandar pra Inglaterra, porque uma moça loira, bonita e com sotaque legal tinha dito que sua beleza era uma coisa única e que ele deveria trabalhar como modelo por lá.

Com isso, o tempo que eu ocupava com sua mentoria acabou sobrando para eu melhorar minhas habilidades e tentar me divertir um pouco. Era ressaca atrás de atividades acadêmicas e às vezes eu acordava com quem eu nem lembrava mais o nome. Festas universitárias são insanas, até hoje me lembro. E fui numa dessas que rolou algo entre eu e Chris, antes do coitado se mandar numa caminhonete alugada pela tal moça. Eu achei que era cilada, mas deixei ele viver. Que bom que teve sucesso, deixa-me mais aliviado.

thé et fleurs  ✰  Nosh  ❖  Now UnitedWhere stories live. Discover now