Capítulo 40 - Garotinha

2.7K 302 177
                                    


Ter que secar o cabelo no aquecedor do carro não é a melhor cena pós loucura/beijo/loucura que vemos hoje.

Tudo voltou a ficar cinzento de novo, e estranho. Como se fôssemos dois desconhecidos perguntando onde fica a praia quando estamos na beirada da praia. É como se eu estivesse compartilhando um carro com um mero desconhecido que me ofereceu carona na estrada. É como se Adam não fosse Adam e eu não fosse eu.

Somos estranhos novamente depois de tudo o que aconteceu porque sabemos que aquilo não poderia, nem em um milhão de anos, ter acontecido. É mais estranho ainda saber que estamos tão indiferentes um com o outro após estarmos tão dolorosamente perto um do outro. Éramos um só, conectados até nas batidas do coração e na forma como nos tocamos, agora não passamos de desconhecidos. Eu odeio isso. Odeio tudo isso.

Depois do beijo ele só me encarou por alguns segundos que mais pareceram anos, se afastou para fechar o capô e entrou no carro. Naquele instante pensei que ele fosse embora para sempre e que me deixaria na velha escuridão, ou que passaria com o carro por cima do meu corpo apenas para se livrar da sensação que sei que nós dois sentimos.

Mas ele só ficou lá dentro do carro. Parado com o motor e os faróis ligados. Esperando que eu finalmente saísse do estado de transe que me pregou no asfalto molhado. A chuva caía e caía, e fiquei lá. Por um bom tempo até me tocar que aquilo não poderia ser o meu para sempre. Entrei no carro e demos partida. E estamos em silêncio até agora.

É um dos silêncios mais desconfortáveis que vivenciei em toda a minha vida. Porém, pelo menos não é tão ruim quanto o que acontecia depois de um beijo com Colin, se é que ainda posso usar esse cara como um exemplo.

Quando o carro estaciona no outro lado da rua da galeria de artes que Adam se deu trabalho de olhar o endereço nos documentos de transações da empresa de Jim, estremeço pelo frio e por milhares de outros motivos. De outras sensações. É como estar de frente para o passado, lado a lado com o presente e de costas para um futuro incerto e cinzento.

Tenho medo do futuro mais do que tenho medo do passado, então concluo que o arrepio que senti não envolve o que farei quando descer desse carro. Até poderia simplesmente sair do jeep vermelho e resolver tudo, mas sinto uma necessidade estúpida de esclarecer as coisas com o garoto ao meu lado mesmo que o que tenho para dizer ainda esteja sendo formulado na minha cabeça.

"Eu..."

"Olha..." Adam fala no mesmo nanosegundo que eu, então nossas vozes hesitantes se misturam entre o couro dos bancos do carro e o ar morno que quase não sai dos aquecedores.

Nos calamos.

Nos olhamos.

"Pode falar primeiro." Dou passagem.

"Não, vai você." Ele se embola junto comigo.

Agora tenho certeza que nós devemos ficar calados. O silêncio era torturante, mas era bem melhor do que essa confusão de palavras e olhares envergonhados. Ele vai primeiro? Eu vou? Nós vamos brigar se essa conversa tomar um rumo de verdade? Eu quero brigar? Ele quer brigar? Se eu puder responder em meu nome, respondo que não. Não quero brigar com Adam, isso só me deixaria mais confusa.

"Eu falaria merda, então é melhor você começar." Adam se explica, e sei que é verdade.

"O que diria?" Questiono, escorando minha cabeça no banco. "Que só me beijou para que eu calasse a boca?"

Adam suspira quando repete a minha ação, "Eu a beijei porque queria te beijar. Sempre quis fazer isso todas as vezes que você me xingava ou ficava perto demais para que eu não pudesse resistir. E se soubesse que seria tão bom, teria feito antes. Teria feito milhares de vezes antes, até que eu ficasse cansado. Mas nunca vou me cansar de te beijar, nunca vou cansar de beijar o que é meu. "

Polos Opostos Onde histórias criam vida. Descubra agora