Capítulo 43 - Clichê

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A sensação de estar caindo nunca soou tão diferente quanto agora.

É mais do que não sentir mais o colchão contra as minhas costas, é como voar para fora da realidade que queima a minha pele. Estou suada. Estou exausta. Como se toda a minha energia tivesse se esvaído, dando a sensação de que eu não me importaria de ficar aqui deitada para sempre.

O rosto de Adam está escondido na curva do meu pescoço, seu corpo descansa em cima do meu quando percebo que sim, ele é pesado demais. Tento não me importar enquanto faço carinho em seu cabelo. Uma eternidade se passa quando o sinto beijar o meu ombro e sair da cama.

Adam me cobre com um lençol e eu caio no sono.

Talvez tenha se passado trinta segundos, um minuto, uma hora, um ano ou até outra eternidade. Bom, eu não sei. Mas quando acordo, ainda está escuro lá fora. Tomo um banho, troco de roupa e coloco uma colcha de cama limpa no colchão.

Ando até a varanda, me escorando na estrutura da porta, "Pensei que tivesse ido embora."

Adam me olha da cadeira em que eu estava sentada antes, "Por que?"

"Você está quieto."

"Você me deixou quieto e cansado. A culpa é sua, não acha?"

"Me desculpe." Digo ao dar de ombros, mesmo quando não vejo motivos para me desculpar.

Adam também não os vê quando um sorriso malicioso enfeita o rosto bonito, "Ah, não se desculpe. Não por isso."

É como se tudo isso não fosse verdade. É como se eu estivesse sonhando e a qualquer momento pudesse tropeçar no sonho e cair da cama. Nada disso parece real quando as coisas ficaram tão incompreensíveis de repente. Tudo desabou e foi reconstruído. Nós fizemos isso. Não foi fácil passar por cima de tanto ódio e rancor. De tantas pessoas e de tantas brigas que sempre nos afastaram.

Foi difícil, mas não significa que as dificuldades já passaram. Sei que a nossa família, ou pelo menos uma boa parte dela, vai lidar com isso como se já fosse esperado. E finalmente a profecia de Evelyn iria se concretizar. Karen vai surtar quando chegarmos em Hill Davis com aliança e tudo que temos direito.

E agora me parece engraçado pensar na reação das pessoas da escola. A forma como alguns ficarão confusos com a mudança de comportamento que parece repentina, mas não é. Nem sempre gostei de Adam, a verdade é que a maior parte da minha vida foi destinada a odiá-lo. E continuo odiando cada centímetro do rosto milimetricamente perfeito e a sua arrogância e o seu jeito infantil e a babaquice e teimosia. São tantos e ́ s que às vezes me perco neles achando que nada disso, de nós, vai dar certo.

Daniel vai surtar, vai se animar e dizer que me avisou como sempre costuma dizer mentalmente, já que nunca o permito, também mentalmente, que ele me diga isso. Em contrapartida, tem a Dylan. Pensar em seu nome causa arrepios nada gloriosos. Ela não gosta do irmão. A Lockwood mais nova guarda muita mágoa. Ele não estava lá por ela quando precisou, quando as dúvidas ficaram incessantes demais para poder suportar sozinha. E depois da morte de Evelyn, tudo ficou pior e os meus vizinhos se perderam.

Sei que Adam estava de luto. Sei que estava caindo na própria fossa com direito a tudo que possa ser dito como ruim. Mas o seu irmãozinho mais novo não era mais o seu irmãozinho. E Adam devia isso a ela naquela época, e ainda continua devendo.

Conversamos um pouco, nos beijamos um pouco mais na cadeira reclinável até os nossos celulares tocarem. Os sons diferentes se espalham pelo quarto ao mesmo tempo. Encaro Adam, ele me olha de volta, igualmente confuso.

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