Fique

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Por um instante pensei em ficar ali, mas essa ideia sumiu na mesma velocidade e comecei a andar até a porta do quarto, a qual dava acesso ao corredor.

-Anne. Por favor. Deixe-me explicar.

-Se explicar? –olhei exasperara para o vampiro que continuava jogado. –Agora que estou indo embora? Se eu escolhesse ir daqui a cinco anos você esperaria esse tempo até resolver falar comigo de novo?!

-Era parte do procedimento... Eu era um conselheiro quando era humano, Anne. Todas as pessoas que tratei me odiavam, pelo resto das suas vidas.

A dúvida que se formou em minha cabeça era clara. Minha raiva se transformou em um grande ponto de interrogação. Ethan nunca havia me falado de sua vida humana.

-Por favor, apenas veja. –dizendo isso, ele levantou-se e logo estava a centímetros de distância de mim. Pegou minha mão direita e a colocou sobre sua pele rígida, em sua bochecha direita. –Por favor. –sua súplica soou quase sussurra. Então comecei a ver suas memórias. –De família eu apenas tive meu pai, que eu me lembre, e ele era um conselheiro admirado por todos os seus clientes, até que eles passassem pelo último estágio de superação. Ele fazia com que todos eles o odiassem, para que não baseassem a felicidade a ele. Meu pai me mandava ir vê-los depois disso, para se certificar de que eles estivessem realmente bem e eu ia contra minha vontade, porque além de não querer, eu sabia que eles estariam bem. Era um procedimento diferente, mas a margem de erros era mínima. Perdi meu pai aos meus dezessete anos. Eu não me lembro muito da nossa relação, como a maioria dos vampiros. Só sei que era forte. Assim que meu pai morreu por algo que não me lembro, assumi seus clientes por dever, usando os ensinamentos que aprendi com ele. Todos no final não queriam olhar para minha cara, mas desde que eu passasse a vê-los felizes, depois do pagamento, nada me importava. E estava funcionando. Era como um jogo. Eu me beneficiava do sofrimento dos outros, apenas por dinheiro. Por uma droga de dinheiro. Pode imaginar porquê nunca contei isso a você ou deixei que visse em minha mente? –“Phillip” era a resposta. –Nunca quis mesmo trabalhar com aquilo. Até que um dia eu fui transformado em um vampiro e, pela minha falta, um de meus clientes se jogou de uma árvore, com uma corda no pescoço... –Ethan tentou puxar algum ar para seus pulmões mortos, como se aquele simples gesto o ajudasse a continuar a falar. Ver ele daquele jeito estava me machucando também, mas continuei lendo seus pensamentos. –Depois de meses lembrando do rosto do homem que se matou, eu achei o vampiro que havia me transformado. Um completo desconhecido. O decepei com meus dentes e garras de tigre, e depois o queimei com uma frieza absurda. E Aro viu tudo. Foi aí que ele me persuadiu a entrar para os Volturi e eu aceitei. Mas depois de um tempo, minha mente começou a gravar os rostos das pessoas sendo mortas, o tanto de sangue humano em minhas mãos. Também comecei a imaginar as famílias delas, no sofrimento, no homem enforcado, e passei a arranjar maneiras de sair daquele clã infernal. Aro deixou e depois mandou me matar. Fugi. Logo em seguida eu soube dos Cullen, os procurei e nunca mais toquei em sangue humano. O resto você já deve saber. Quanto as minhas habilidades, eu não tenho certeza. Em alguns resquícios de memórias da minha infância, em uma viajem a trabalho, eu e meu pai avistamos um tigre branco, lindo, caçar algum animal, com destreza. Em outros, eu brincava de ser como ele... Mas, por tudo o que é mais valioso nesse mundo, Anne, eu não quero que me odeie. –fechei meus olhos e senti quando Ethan encostou sua testa a minha. Retornando as suas memórias, comecei a me ver nelas. Primeiramente na floresta, onde eu me lembro de ter visto, pela primeira vez, os seus olhos brilhantes. –Quando te vi, chorando naquela árvore, sob à luz da lua, eu admito que primeiro fiquei confuso. Você era como uma vampira, mas eu podia ouvir seu coração e ver suas lágrimas. Depois imaginei como poderia ser o seu sorriso. E então o que veio em minha mente foi “e se eu pudesse ajudá-la?”. Quando foi embora, eu sabia que queria te ver de novo, mas deixei isso de lado. Pensei que se te encontrasse, por acaso, ajudaria como poderia naquele instante. E eu passei a te encontrar na floresta, enquanto ainda me decidia se visitaria os Cullen ou não. Mas você nunca me viu, porquê eu ainda não queria. Anne, você chegou tão perto de mim como tigre, que eu não podia não me aproximar. Eu acreditei estar tão curioso, que queria ver cada detalhe seu. Foi quando descobri que você também era um lobo Quileute, o que me fascinou ainda mais. Então apareci lá na casa dos Cullen e o que eu falei para Carlisle era verdade. Eu só guardei a parte de ser o invasor que estavam procurando e de mexer naquela gaveta. –soltei uma breve risada, sentindo meu rosto estar úmido. –Anne, eu passei a querer te ajudar, não só como uma cliente, como eu costumava fazer. Eu passei a tentar te ajudar para te ver sorrir. Comecei a entender meu pai. Comecei a parar com as minhas hipocrisias. –desta vez foi ele quem riu brevemente. –Eu só penso em você... Essas duas últimas semanas foram as mais difíceis em séculos de existência. Eu vim aqui para te ver dormir todas as noites e em todas as vezes eu quis deitar ao seu lado. Eu me afastei porquê, como um bom conselheiro, só queria que ficasse bem, sem precisar de mim... E eu sei que aprendeu muitas coisas... Mas, por favor, Anne, precise de mim. Porque eu preciso de você. Eu preciso ver seu sorriso todos os dias. Não tem ideia de como fiquei quando soube que ia embora. Anne, eu preciso te ver todos os dias. Preciso... –então senti seus lábios nos meus e instantaneamente retribuí seu beijo. Havia o intenso desejo daquele toque nas duas semanas anteriores e, naquele instante, eu soube que Ethan também o sentia.

Momentos depois, do beijo fomos para um abraço apertado. Ethan mergulhava seu rosto em meus cabelos, no espaço entre meu pescoço e o meu ombro, enquanto eu deixava meu queixo apoiado no ombro esquerdo dele e, com minha mão direita, acariciava seus cabelos curtos.

-Fique. –ouvi a voz de Ethan, abafada pela posição em que se encontrava.

-Fique. –falei.

Não precisávamos de mais palavras do que aquela, para declarar nossa escolha.

Where I Go?Where stories live. Discover now