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     Horas depois, o resgate veio. Menos elegante e dramático que a aquela tenebrosa noite pedia, claro, mas chegou.

     Um Ford prata.

     Antes de qualquer comentário sarcástico, a exaustão vencera-me. Mergulhei no banco traseiro, se quer ateando o cinto. Fechei de imediato os olhos, o corpo úmido, as roupas pesadas em água.Suspirei, retirando os óculos e dobrando a armação. Afundei no banco desconfortável, permitindo o divagar insensato dos poucos pensamentos que me acometiam. Desejava, apenas, que o dia morresse e fosse esquecido.

        O que tinha me ocorrido àquele dado e estupido momento de insanidade, em achar que uma desconhecida merecia por qualquer dos motivos meu apoio e empatia?

        Inspirei.

        Sentia-me um traidor de meus princípios. Infiel a única promessa justa, cuja sanidade sustentava minha existência. Impuro. Covarde.

        Desejar, mesmo que fisicamente, outra mulher, mesmo depois de todos os malditos anos, parecia errado, como um crime. E agora, envolto em lucidez, tornava-me algoz de minha própria ganância.

        Como me redimir depois da sinceridade estúpida de minhas vontades, que enganavam-me, traiam-me? Traia-no!

        Meu amor era apenas dela, sepultado com ela, à espera.

Até o dia que fosse possível — se fosse possível— reencontra-la.

       Meus dedos correram ansiosos até o bolso interno do blazer, odiando-me cada segundo mais pelo comportamento inaceitável, pela punição que merecia.

        A aliança era gélida entre meus dedos, até morrer, no anelar da mão esquerda, como a algema, a corrente que parecia. E era assim que a paz retornava-me, atenuando a dor. Era daquela forma que desejava me sentir: preso a Carol, condenado a viuvez até o último dia.

        A reminiscência do sorriso de minha esposa, gentil e harmonioso, esbofeteou-me mais dolorosamente que qualquer golpe físico, esvaziando-me o ar dos pulmões.Aquela dor, ela latejava e nunca morria, retornava, viva e pulsante e eu a acolhia, sentido-a gota a gota, pois apenas assim tinha certeza de que Carol não era apenas uma de minhas fantasias.

       A dor, profunda e enraizada, era de fato tudo que me prendia a ela, capaz de lançar-me lucidez quando meu corpo era fraco. Eu a amava e a amaria até que meus ossos apodrecessem, enterrados, até o ultimo dos suspiros. E nenhum outra merecia aquela devoção, se não a minha Carol.

       Minha exuberante Carol.

       De olhos fechados, podia quase sentir o fulgor de sua pele esbranquiçada, a beleza de seus olhos verde esmeralda, de seu sorriso eclipsante. Perigosamente, recordei-a, investigando em minhas memórias um amor que vivia, uma mulher que vivera e era apenas minha, para todo o sempre. A liga metálica entre meus dedos pesava. Correntes, sim. Trazia-me o poder do cheiro de Carol, tanto que sufocar era fácil.

       Sexo era apenas necessidade. O desejo, esse não. E tudo que me despertasse interesse precisava ser erradicado.

Carol nunca seria esquecida. Nunca teria seu lugar usurpado. Enquanto eu me mantivesse fiel à sua memória, ela estaria aqui.

Mr. Bratv Nơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ