56.

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(Ian)

Eu mal podia respirar quando os olhos de Dorian e Katherine se encontraram. Primeiro, porque o silêncio espectral era como holofotes para a cena que parecia desenrolar-se em câmera lenta, segundo a segundo, como uma bomba relógio. Depois, porque eu podia sentir, praticamente ver crescerem, as faíscas de eletricidade entre os dois, quando o mundo se abriu e engoliu a todos nós, num buraco profundo de dor, mágoas e escuridão.

Porra, Ian, leve-a embora daqui. Mesmo que seja carregada!

É impossível disfarçar meu desconforto, porque eu a aproximo de mim, porque meu corpo todo se inflama e vibra.

Katherine troca um olhar comigo. Está assustada.

— Eu estou aqui, amor. — Sussurro para ela. — Qualquer um deles precisaria carregar meu corpo antes de tocar você.

Toda tribuna parecia assistir imprecisa os movimentos hesitantes, em completo êxtase e perplexidade.

Aquelas paredes. Pratos. Pessoas. Eu jamais imaginaria voltar a vê-las. E Não havia qualquer detalhe fora do lugar. A mesa de jantar e os talheres de prata, a vodka e o frio, tudo aquilo conhecia, tinha o cheiro do lustrador de Pinho e no corredor extenso ao lado muitos olhos observavam-se, repletos de repudia. Nem mesmo os objetos sagrados em prata e ouro, espalhadas por todo a casa como aliança fiel de meu clã com a igreja ortodoxa, pareciam mais prevenir o mal.

O que eram as salas de julgamento, hoje fedia putrefa a morte, cheiro usual do destino quando puxa a linha do ponto caseado e vê o tecido se unir em um só como uma grande tela.

— Desculpem-me o atraso. — Anunciei, puxando uma cadeira para Kath, e cavalheiro, acomodando-a.

Ela esboça um agradecimento.

É uma deusa vestida na porra de um vestidinho que valia um carro.

E eu daria minha vida pelo direito de toca-la.

Mas não posso.

Engulo em seco.

Pelo que fiz, jamais merecia redenção.

Encarei um velho gordo ao seu lado, que se atrapalha e cambaleia para longe, a fim de me dar lugar. Eu conhecia o tom impositor que usei: frio, forte. Eu conhecia o medo flutuando sobre os olhos dos demais, porque aquele respeito eu tinha cultivado durante anos de servidão fiel, escrita a sangue e mão firme. Eu conhecia aquele silêncio mortal, disfarçado de submissão.

Sorri o meu melhor sorriso, tomando a mão gélida e suada de Kath nas minhas, escondendo  sua insegurança.

Cada graça de um toque seu, mesmo que não intencional, era minha redenção, um lembrete das portas sempre fechadas no paraíso.

Dói observá-la. Dói não merecê-la.

Um arrepio subiu-me vindo da espinha ao cerebelo, eletrificando meu corpo com voltagens viciantes de adrenalina. Ao mesmo tempo que encarando meu ego face a face, estava o pavor, fazendo meus dedos apertarem contra os de Kath, quase como se ela pudesse desaparecer a qualquer segundo.

Demonstrar: eu não o faria. Contudo, cada célula nervosa de meu corpo estava direcionada aos gestos de respiração e olhares de Kath, desesperado para tomar-la nos braços e arrasta-lá para longe e nunca mais voltar. Nunca mais encarar meu passado, meu irmão, meu antigo eu.

Surge em minha mente o prazer de tê-la em meus braços. Ela sorri e diz meu nome com raiva fingida. Seus lábios são intensos e entrecortam sua respiração. Luto para não beija-la. Espero que ela me beije. Peço esse beijo com desejo, com devoção. Ela recua.

Mr. Bratv Dove le storie prendono vita. Scoprilo ora