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- Emily, será que você pode me ouvir? - os berros do outro lado da porta do banheiro feminino continuava a me perguntar a mesma frase estúpida de 20min atrás. As minhas mãos estavam começando a doer, mas me recusava a tirá-las da madeira fria da porta, me recusava a deixar que ele entrasse e me dissesse mais mentiras. Carter Grayson havia enviado um e-mail para todo o colégio. Ele havia manipulado todas as palavras que eu havia dito sobre a família, sobre nos mudarmos para Chicago... Sobre o motivo por eu ter tentado me matar. Ele escreveu E NO FIM DAS CONTAS TODOS ESTAVAM CERTOS, A GAROTA COM CABELO ENSEBADO QUERIA UM POUCO DE ATENÇÃO... UM POUCO DA MINHA ATENÇÃO. Eu sou uma idiota. Acreditei que o cara-que-não-sabia-quem-eu-era havia visto algo em mim, algo que o fez querer ser meu amigo, mas no fim das contas eu estava errada. Estava errada porque Carter não queria ser meu amigo, ele nunca quis ir até a minha casa e me fazer sorrir. Ele queria, de algum modo repugnante, ter como provar que havia me feito contar o que me levou aquele grito de desespero. - Por favor, você pode me ouvir?
- Vá embora! - grito entre as lágrimas. Ele contou a todos que você admitiu ter tentado se matar por causa dele, porque você não conseguia sua atenção. Joan confirmou a história, disse que ele esteve em sua casa ontem. A voz de Clarice me estapeia outra vez. Quando ela me mostrou o e-mail, quando os meus olhos pararam de derramar as incontáveis lágrimas de toda a minha existência, meus pés se moveram antes do meu cérebro. A garota de cabelos escuros até tentou me segurar, mas no instante em que meus olhos encontraram o sorriso perfeito de Carter Grayson, que estava sentado ao lado de Alison, meu corpo surtou. Meus dedos se fecharam em punho, meu cotovelo tocou o peito de enchimento de Clarice e meu braço correu para frente fazendo com que meu punho acertasse o nariz perfeito do garoto. Ele berrou comigo, perguntou se eu estava ficando louca e me segurou pelos pulsos quando tentei lhe bater mais uma vez.
Eu nunca havia brigado antes. Nunca havia batido em ninguém - não que me lembre - e nunca havia me sentindo tão mal por tê-lo feito. Foi Alison Prescott quem devolveu o soco que eu havia dado. Sua mão esquerda se espalmou contra minha bochecha direita fazendo com que meu rosto virasse por tamanha a força que ela aplicou. O seu ex-namorado, namorado, eu não faço a mínima ideia do que eles são, a segurou pelos cotovelos e a afastou de mim. Naquele momento eu corri. Corri porque sabia que se continuasse ali iria chorar, ou iria parar na direção por ter batido em alguém. Quando a porta do banheiro se bateu atrás de mim pensei estar segura, mas então ouvi a voz irritada de Carter chamando o meu nome e aqui estou eu: trancada no banheiro feminino com duas garotas desconhecidas me encarando como se eu fosse uma completa maluca. E talvez eu seja maluca. Talvez eu tenha ficado maluca quando deixei Carter entrar no meu quarto, talvez eu tenha ficado maluca quando comecei a lhe contar sobre toda a minha vida. FICAMOS MALUCAS, FICAMOS MALUCAS POR AQUELES OLHOS CASTANHOS, a pequena eu chora encolhida em um canto. Eu a chamo de pequena Lizzie McGuire2 da Emily, porque me faz pensar no seriado. É um nome ridículo, mas é melhor do que chamá-la de consciência alfineteira. Você quer dizer que... Que toda a St. Augustus recebeu isso? Eu a questionei assustada. E provavelmente toda a Chicago Ems... Está no facebook, twitter... Está em todos os lugares. A lembrança da voz rouca de Clarice faz com que a mini Lizzie abra seu caderno e anote um grande BABACA ao lado do nome de Carter.
A porta estremece contra as palmas das minhas mãos me fazendo piscar os olhos para afastar as lágrimas. Se ele tentasse entrar eu iria chutar onde mais dói. Iria fazer como naqueles filmes de comedia e iria chutá-lo com força suficiente para fazê-lo ir parar no hospital!
- Emily? - a voz abafada de Jay faz com que eu afaste as mãos. - Sou eu - sua voz carinhosa me esquenta mesmo do outro lado da porta. Aperto os lábios. - Eu só queria que você soubesse - meu melhor amigo soa um pouco mais perto. - Você não está sozinha, eu estou aqui. Eu estou aqui por você, Emily - Jay indaga, e mesmo tendo uma porta para nos separar posso vê-lo com a testa encostada contra a madeira, posso vê-lo de olhos fechados tentando me alcançar. A menina de cabelos castanhos sentada no chão se levanta como se houvesse visto um fio de lucidez no meu rosto. - Por favor, abra a porta.
- Você deveria ouvi-lo. - a garota ao lado, a de cabelo de garoto, indaga com um sorrisinho falso nos lábios. Aperto o maxilar. O meu coração palpita contra meu peito, minhas mãos adormecem rapidamente e meus pulsos doem me fazendo apertar os braços ao lado do corpo.
- Por favor, Emily... - sua voz pede uma última vez, antes da porta se abrir com um rangido alto. Os olhos castanhos do meu melhor amigo se apertam contra o sorriso sem dentes que ele moldura no rosto. Seus braços se abrem e quando enterro meu rosto na curva do seu pescoço esconde de todas as outras pessoas que o cercam. Os curiosos, porque a St. Augustus não seria a St. Augustus senão tivesse alunos curiosos e fofoqueiros, sussurram coisas entre si e até riem.
- Emily? - o murmurinho abafa o som rouco que escapa de algum lugar. Por um instante penso ter escutado a voz de Jay chamar o meu nome, mas quando seus lábios se afastam da minha bochecha percebo que seria impossível ele ter me chamado se estava depositando um beijo contra minha pele molhada pelas lágrimas. - Emily!
- Oh não - gemo enfiando o rosto contra o pescoço de Jay. - Me tire daqui. - imploro.
- É claro que tiro - Jay sussurra apertando as mãos contra minhas costas. As pessoas se aglomeram atrapalhando nossa passagem, mas Jay berra que irá processar cada um dele se não saíssem da nossa frente. Escuto os murmurinhos risonhos debochados atrás da gente, mas não me importo. Não me importo com os "ei Emily, você realmente tentou se matar por causa de Carter Grayson". Não. Eu não tentei me matar por causa de Carter Grayson. Eu nunca tentaria me matar por causa de um garoto metido a esperto.
- Emily...
- Cara - escuto a voz de Patric logo atrás da dele. - É melhor não...
- Emily - sua voz se aproxima, e até sinto seus dedos me puxando pelo cotovelo, mas Jay o barra com seu braço. - Cara, me deixe falar com ela um instante.
- Sem chances - meu melhor amigo rosna com raiva. - Você não vai humilhá-la novamente.
- Eu não fiz isso! - Carter vocifera dando um passo para frente. Jay me vira em seus braços me fazendo ficar totalmente contra suas costas. - Você sabe que eu não faria isso com você.
- O pai dela é advogado - Jay estala com sua voz séria. - E se continuar a importunando faço questão de ser uma de suas testemunhas quando o processo bater na sua porta. - ele ressalta antes de abrir a porta do carro para mim. Pode ser coisa da minha cabeça, mas quando a porta se fecha posso ler um enorme EU SINTO MUITO saindo dos lábios mudos de Carter.
A primeira coisa que vi quando a porta se abriu novamente foi o rosto preocupado da minha mãe. Ela estava do lado de fora, usava seu suéter azul e a calça jeans que eu havia lhe dado de presente. Seus pés descalços correm em minha direção e seus braços se envolveram nos meus ombros. Foi por causa de um garoto? Foi por amor que tentou se matar? Ela perguntava enquanto me escoltava para dentro de casa. Choraminguei um pequeno: não foi por isso, juro que não foi por isso, mas ela simplesmente me ignorou. Papai estava em casa. Ele afastou a minha mãe e pediu para que ela parasse de agir como uma completa lunática, pediu para que ela olhasse um instante para mim e talvez assim percebesse que eu nunca faria algo tão ruim comigo mesma por causa de um garoto qualquer. Ele me colocou no colo naquela manhã. Nós fomos para o meu quarto, Jay foi para sua casa, minha mãe se escondeu em sua cozinha e meu pai me contou histórias para dormir. A noite havia chegado antes mesmo que eu pudesse perceber. Quando finalmente abri meus olhos o relógio próximo a minha cama marcava 20h47min. Virei-me sobre os edredons e encarei o teto esbranquiçado do meu quarto.
Eu teria passado o resto da noite o encarando senão fosse pelo ranger de tábuas seguindo em direção a minha zero porta. Aperto os olhos.
- Você está acordada? - minha irmã do mal pergunta baixinho. Mantenho os olhos fechados, os lábios relaxados e o corpo imóvel. Por favor, por favor, não conte à mamãe que eu confirmei a história, por favor. Joana implorou no instante em que nossa mãe questionou-a sobre o porquê ela não havia ligado no minuto em que recebeu o e-mail de Carter. Seus olhos se arregalaram sobre a sombra lilás, os lábios se abriram, mas sua voz não veio. Ela não contou que havia recebido porque está tão enfiada nisso quanto ele. Até porque Carter precisou de alguém para confirmar sua história, e Joan serviu como a fonte segura. Eu quis contar, mas sabia que se o fizesse estaria sendo ainda mais baixa do que ela. Os nossos pais teriam a olhado daquela maneira que os pais olham seus filhos quando eles fazem algo inimaginável. Aposto que eles teriam á trancado em um convento. - Ems? - sua voz chama pelo meu apelido, mas eu não me movo. Quando a tábua solta perto ao beiral da porta range baixinho, abro os olhos. Viro-me de lado, as mãos contra a bochecha, os olhos fixos no rosto iluminado apenas por seu abajur. Joan está deitada em sua cama, suas mãos estão exatamente como as minhas, embaixo de sua bochecha, e o pouco de luz que ilumina seu rosto me deixa ver seus olhos azuis.
- Eu te odeio. - indago o mais baixo que posso.
- Eu sei. Sinto muito - Joan suspira, e apaga a luz de seu abajur.

Emily ParkerHikayelerin yaşadığı yer. Şimdi keşfedin