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— Eu não posso fazer dupla com você — sussurro.
— E porque não? — Carter questiona, e se não estivéssemos na sala de aula eu teria corrido e me escondido no banheiro feminino como de costume. — O professor disse: os colegas de mesa serão sua dupla — o garoto de olhos castanhos claros relembra fazendo aspas exageradas no ar. Aperto os dedos sobre o pano da minha jaqueta. — Você não tem muita escolha...
— Emily — indago baixinho.
— Eu sei o seu nome — Carter sorri com o cenho franzido. Meus olhos se arregalam, minhas bochechas queimam e minha mente grita ALERTA, ALERTA, ALERTA. O cara-que-nunca-vai-saber-que-eu-existo sabe o meu nome! A voz alta do professor desaparece quando o sinal toca. Agarro minha mochila, meu caderno e saiu sem olhar para trás. — Você não é boa nessa coisa de fugir, sabia disso Emily? — Carter Grayson me encara no instante em que dobro o corredor. Meus calcanhares rodam e eu quase caio quando tento dar um passo para trás. Olho para ele, para trás, para ele e para trás. Como ele conseguiu chegar aqui?! — Vim pela secretaria, corta uns 15min de caminha até a sala de inglês — Carter explica.
— Como você sabia que eu estava indo para sala de inglês?
— Você deixou seu caderno — ele ri abanando o caderno de capa preta para mim. Agarro-o com força e volto a andar. Seus passos altos batem furtivamente a cada passo meu. Por favor, Deus, você já me deu uma irmã terrível, então tem que me dar um desconto agora. Por favor, faça com que ele pare de me seguir. Por favor. Choramingo mentalmente. — Você vai fazer o trabalho comigo, certo? — Carter continua a tagarelar ao meu lado.
— Não, eu não vou.
— E porque não?
— Porque eu já tenho parceiro — minto, mesmo que não seja algo que eu costume fazer. Na verdade eu nunca minto e mamãe sempre diz que tenho que aprender a agir como uma pessoa normal. Carter continua me encarando sério. — Eu tenho parceiro e não vou fazer o trabalho com você. Fim de papo. — elevo a voz. Veja isso mãe, eu sei elevar a voz como uma pessoa normalmente normal. Seus dedos se fecham sobre as alças da minha mochila.
— Opa, calma ai — o garoto ri divertido. — Não precisa gritar comigo. — Carter balança a cabeça em um ritmo inaudível. Dou um passo para frente e ele se mete no caminho. Gemo baixinho, encaro o chão e respiro profundamente. — De qualquer modo, mesmo que tenha um parceiro, o professor deixou claro que teria de fazer comigo.
— Ele vai entender os meus motivos para trocar de dupla — sussurro.
— Não, ele não vai e você vai ficar...
— Não posso fazer com você porque o meu parceiro sou eu mesma. 
— O que? — Carter sorri enrugando a testa. — Isso não faz sentido algum.
— Obvio que faz — dou de ombros sem tirar os olhos do piso amarelado do corredor. O sinal do segundo tempo soa alto em nossos ouvidos. Ele faz um som estranho e eu ergo a cabeça para encontrar o rosto furioso de Alison Prescott a alguns passos da gente. Congelo. Carter move os lábios, mas não espero para ouvir o que ele tem a dizer e corro na direção oposta. Joan tinha deixado claro que eu não podia ser descoberta, que Alison queria que eu continuasse sendo a menininha invisível que eu sempre fui, mas estava claro que não sou boa nem em me esconder. Atravesso dois lances de corredores, o que me deixa com 15min de atraso, e quando finalmente adentro a classe de inglês sinto a imensa bola de frustração me derrubar. Carter Grayson abana os dedos em um tchauzinho afetado quando o professor pede que eu vá para o meu lugar. Ele repetiu o ano, era de se esperar que estivesse em quase todas as classes que eu. Acreditei que 2014 fosse o pior ano da minha existência. O meu pai traiu a minha mãe, nos mudamos para Chicago, as pessoas atacaram bolas com tinta em mim, minha mãe fingiu que estava agindo como uma mãe normal, minha avó parou de falar com a minha mãe, minha professora de espanhol tentou paquerar o meu pai após descobrir sua traição e eu tive a pior foto de anuário da existência humana. Bato minha testa contra a mesa cinza, o que faz com que o professor me repreenda e Jay ria. Aperto os lábios. Adoraria poder voltar a 2014 e toda aquela confusão familiar, mas parece que janeiro de 2015 estava pronto para superar qualquer coisa de ruim que tenha me acontecido no ano passado. Gemo. — Eu realmente odeio a minha vida.
— Odeio não saber o porquê sentou com Carter hoje — Jay sussurra próximo ao meu ouvido. Estamos de cabeça baixa, nossos rostos estão muito próximos na mesa e sua respiração faz cocegas no meu nariz. As lentes dos meus óculos embaçam. — Porque sentou com ele?
— Eu não posso dizer — suspiro fazendo-o bufar. — É coisa da Joana.
— Coisa da vac...
— Vocês dois — o professor de inglês chama com um tom rude. Ergo a cabeça fazendo meu cabelo, que mamãe diz ser ensebado, cobrir meu rosto. Meu coração acelera no momento em que meus olhos encontram o rosto desconfiado do professor. — Porque estavam de cabeça baixa? — ele questiona sério. — Aqui não é parque para estarem namorando.
— Namorando? — minha voz falha. — N-n-não esta... Ah... Eu não estava. Ele não é...
— Ok, ok — o professor abana as mãos quando a classe começa a rir. Pressiono a ponta da língua contra meus dentes, sinto minhas bochechar arderem e abaixo o rosto para encarar a mesa cinza. — Não deitem mais as cabeças, isso é uma sala de aula e não os seus quartos.
— Sim senhor — sussurro sentindo minha garganta se fechar. Ele volta a explicar algumas coisas do verbo passado, passa três trabalhos de casa e se despede com um risinho frouxo sobre não levarmos namorados para a classe de aula. Um arrepio percorre minha nuca sempre que alguém me lança um sorrisinho torto, pois sei que por detrás desse sorriso existe mais uma das piadinhas infames dos alunos da St. Augustus. Estava sentada nas escadas do segundo andar fazendo minha atividade de historia quando senti meu celular vibrar. Você precisa descobrir se Carter está saindo com Amanda Eliot. É uma garota do terceiro ano. Alison a viu fofocando sobre eles terem se encontrado. Dê os seus pulos e descubra ainda hoje! Era o que dizia a mensagem. Respiro exasperada. Sinto falta de nunca receber mensagem, de não ter ninguém para trocar o número e de não ter uma missão a cada 2h. Ando de um lado para o outro nos degraus largos do segundo andar, minha cabeça parece pesar 400 kg e meus dedos mindinhos estão doloridos. Você precisa descobrir isso. Precisa descobrir aquilo. Precisa não ser notado. Precisa ver o que ele tanto faz no celular. Precisa, precisa, precisa, precisa... Eu não preciso fazer nada... Mas faço. — Er... Carter?
Tenho que admitir que não sou boa tomando decisões, mas se não fizesse o que Joana estava pedindo acabaria levando a culpa pelo roubo do cartão, e sei que isso me levaria direto para um colégio interno. O meu pai é advogado, ele tem uma triste norma sobre roubos: no dia em que uma de vocês roubarem algo vão ser trancadas em um colégio interno... Um colégio interno de freiras em algum lugar frio e úmido. Posso não ter nada de relevante na vida, mas eu não sobreviveria em um lugar frio e úmido. Joana, minha queria e doce irmã, havia deixado claro que eu precisava dar os meus pulos para descobrir algo sobre Amanda Eliot e Carter, e agora estou a três passos do garoto mais popular do colégio com cara de quem sofreu um derrame cerebral. Quando ele se vira para mim — lábios arrebitados em um sorriso, olhos repuxados nos lados e bochechas arqueadas — sinto todo o chão tremer. Estou prestes a me jogar de uma ponte invisível e abraçar a morte quando as luzes do corredor brilham sobre seu rosto, o que me deixa ver as pequenas pintinhas verdes em seus olhos castanhos claros. As maçãs do seu rosto são um pouco quadradas, o cabelo é de um castanho claro caindo pela testa e é um pouco mais baixo atrás. Ele também tem milhares de pintinhas espalhadas, eu as chamo de beijos de anjo, pelo rosto. Uma porta de armário bate me tirando do transe.
— Veja o que temos aqui — Patric Silva, que na verdade não é um Silva e sim um Hayes, sorri aparecendo do lado esquerdo de Carter. Mordo os lábios. VOCÊ VIRA OS CALCANHAERES, SEGURA A MOCHILA E CORRE NA DIREÇÃO OPOSTA COMO SE NÃO HOUVESSE AMANHÃ. Meu cérebro me da a melhor das opções naquele momento, mas não me movo. Não me movo porque sou louca. — Parece que o Grayson tem uma namoradinha nova. — sua voz faz com que meu queixo caia. Patric me olha nos olhos, ele tem olhos azuis claros, e sua feição se transforma em uma careta meio tensa. — Embaraçoso! — o garoto sussurra com desdém.
— Ignore o Patric — Carter me diz — É o que eu faço no dia-a-dia — ele ri para o melhor amigo e o empurra para longe. O garoto de cabelos escuros lhe mostra o dedo do meio, o que me faz corar. — O que você quer? — ele pergunta sem nenhum rodeio. —Está pronta para admitir que me querer como dupla no trabalho?
— É que... — engulo a grande bola de saliva que se forma na minha língua. — Eu...
— Ótimo! — Carter interrompe de supetão. Meus olhos se arregalam. — É ótimo que tenha decidido se juntar ao trabalho — o garoto ri irônico. — Seria estranho apresentar o trabalho sozinho sendo que já entreguei a nossa proposta de trabalho para o Will — meu coração dança sobre meus músculos, minhas bochechas ardem e meus olhos parecem se atrapalhar com as luzes que são refletidas na lente dos meus óculos. Patric cutuca o ombro de Carter. — Você...
— Porque entregou os nossos nomes para o Sr. Johnson? — sussurro, envergonhada.
— Porque eu sabia que você voltaria atrás e faria a dupla comigo de qualquer modo.
— O que? — estalo sem perceber. — Como você poderia ter tanta certeza?
— Porque eu conheço a Joan muito bem, Emily — Carter da um passo em minha direção. Paro de respirar. Ele sabe. — E tenho certeza de que ela não gostaria de perder a oportunidade de me vigiar fora do colégio, certo?!  — seus olhos castanhos se apertam em comparação ao seu sorriso. Patric solta uma risadinha afetada, pisca o olho esquerdo para mim e dá duas tapinhas nas costas de Carter como se estivesse o parabenizando por algo enorme. Como se estivesse o parabenizando por ter pego Joan e Alison em sua própria missão de espionagem. Ele se afasta com um sorriso sarcástico nos lábios, e quando meu cérebro volta a funcionar meu dou conta: estou ferrada. Estou muito ferrada.

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Aloha “parkers”. Yeaaap, demorou, mas chegou! Eu tenho uma pergunta: quem aqui vai assistir A esperança parte 2 amanhã? Porque eu estou correndo feio louca pra me preparar kakaka. Espero que gostem do capitulo!

Emily ParkerWhere stories live. Discover now