Herdeiro das tradições

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Amo Vitiello

O sol da manhã entra intrometido pela fresta da cortina e abro apenas um olho protegendo-me da claridade nada bem vinda. Ainda tenho alguns minutos até realmente precisar levantar e encarar a realidade, mas nada nunca é do jeito que a gente sonha. Respiro fundo antes de atender o maldito telefone que insiste em tocar incessantemente. Eu não preciso de dois segundos para saber quem me perturba tão cedo.

- Onde você está? - ouço a voz do Capo da Famiglia dizer do outro lado da linha.

Luca Vitiello, ou simplesmente meu pai, tem esse péssimo hábito de começar as ligações com perguntas, as quais eu não tenho vontade nenhuma de responder.

- A caminho? - digo, não conseguindo evitar um tom de interrogação ao estender a palavra.

Infelizmente, não sou conhecido por ser uma pessoa matinal. Nunca tive problemas em pular da cama de madrugada para acompanhar um carregamento de drogas que vai chegar ou passar a noite toda em claro fazendo rondas e me certificando de que nossos distribuidores estavam com os pagamentos em dia. Não. Nada disso me incomodava nenhum um pouco se não fosse preciso ser uma pessoa muito ativa logo após acordar. Precisava tomar um café da manhã primeiro.

- Estamos te esperando há quase uma hora! - meu pai diz irritado, mas conseguindo evitar que sua voz soasse alta demais. - Já adiantei todos os assuntos que podia para enrola-los até você chegar. Mas esse não parece ser o caso.

Puxo o telefone da orelha, conferindo as horas. Merda, a reunião com o conselho estava agendada para hoje. Velhos tradicionalistas que esperavam apenas uma brecha para criar problemas com a forma que meu pai comandava a Famiglia. Pobres almas, em todos esses anos não conseguiram fazer nada a não ser concordar com a cabeça como cachorrinhos famintos. A essa hora, eu realmente teria que correr se ainda quisesse chegar a tempo. E sem um café da manhã apropriado. Ótimo!

- Já estou indo pai, me dê 20 minutos.

- 20 minutos até sair de onde quer que você esteja ou 20 minutos para já estar aqui apertando mãos?

- Estar aí - digo, me levantando da cama, puxando minhas calças que estava jogadas no chão. - Meia hora, é melhor.

Posso imaginar meu pai apertando os dedos entre os olhos, como quem reunisse toda o restante da sua paciência. Comigo, ultimamente ela andava no limite.

- Ok. Irei puxar algum outro assunto. Esteja aqui em 30 minutos. Nenhum segundo a mais, Amo.

- Combinado! Já já chego aí! - falo e escuto a linha ficar muda.

Terminando de fechar o zíper da calça, procuro minha camisa de ontem, olhando ao redor. Onde diabos eu estava? Ao avistar um par de pernas nuas saindo embaixo do coberto, sigo o olhar até encontrar uma mulher com longos cabelos castanhos adormecida em cima da minha camisa. Ótimo, maravilhoso. Meus planos de saírem de fininho foram por água abaixo. Ou ainda não. Com o máximo de cuidado possível, consigo puxar a camisa sem acorda-la e terminando de calçar os sapatos, saio do apartamento o mais depressa possível. Eu deveria estar em uma desordem infernal, a noite de ontem vem em flash em minha memória. Me recordo de conhecer a doce mulher de cabelos castanhos em um bar na Bourbon com a Garden. Sorriso sugestivo, lábios preenchidos com botox e um par de penas de matar. Presa fácil. E agora eu estava indo embora da mesma forma que cheguei: sorrateiramente e sem promessas.

Chegando ao carro, olho no retrovisor ajeitando o cabelo, mastigo um chiclete para enganar o hálito matinal e ignoro minha necessidade de tomar um bom e velho café forte. O caminho até a reunião dura minutos.  Nova York nunca dormia, mas por algum milagre o qual eu era grato, consegui chegar dentro dos 30 minutos. Isso ou seria um escândalo e eu não precisava de mais um. Tomo o elevador e chego no andar correto, me apressando até passar pela porta. Em seguida, coloco a minha máscara e me preparo para o show.

Avalanche | Amo & GretaKde žijí příběhy. Začni objevovat