Que a verdade seja dita

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Greta Falcone

A verdade muda os planos das pessoas.

Sempre foi assim desde os primórdios dos tempos e — que a verdade seja dita — sempre será.

Eu poderia continuar a ouvir escondida palavras que não eram faladas para mim. Ou ainda, fingir calmaria quando uma tempestade inundava meu estômago. Um sorriso doce poderia ser ostentado em meu rosto enquanto cruzava com os maiores inimigos do meu pai ali mesmo na nossa sala de estar e tudo apenas para manter a aparência de destemida que ser uma Falcone me exigia. Porém, que a verdade seja dita: meus olhos não fingiam muito bem.

Ao cruzar o oceano azul de Amo, meu olhar denunciou imediatamente a confusão em que se encontrava a minha alma. E eu que sempre gostei de acreditar que era forte e corajosa, estava começando a perceber que os últimos tempos estavam cobrando um preço alto demais.

Em questão de segundos, Amo se afasta de sua família e atravessa o ambiente até mim. Seus passos são confiantes como de costume e ele nem ao menos pestaneja diante do olhar enfurecido que sei que Nevio lhe dirige ao meu lado. Inspecionando meu rosto rapidamente, ele não olha para o meu irmão antes de perguntar:

- Eu soube do que aconteceu. Você está bem?

A voz de Amo é enviada diretamente para as minhas terminações nervosas e tem um efeito relaxante sobre mim. Por um minuto, eu não me preocupo com as ameaças dos Zetas contra as nossas famílias. Não penso no ar carregado de perigo ao nosso redor e nem na ameaça que a minha melhor amiga precisou neutralizar. Apenas por um minuto, encaro os olhos do homem a minha frente e concentro-me no azul dali.

Respiro. Conto até três. Expiro e volto ao presente. Balanço a cabeça antes de responder.

- Foi um susto e tanto. Mas estou bem. Aquele homem não chegou a me machucar ou a Aurora. Apesar de não poder dizer se ela será a mesma depois da escolha que precisou fazer.

Ao meu lado, Nevio cruza os braços inquieto e posso imaginar o quanto deve ter significado para ele encontrar Aurora com uma arma na mão, após ter tirado a vida de alguém. Não éramos tradicionalistas italianos, como outros aqui e acreditávamos que as mulheres não deveriam ser meros troféus indefesos, porém os homens feitos honrados em qualquer lugar no mundo da máfia tinham uma grande missão na vida: proteger as mulheres da família. E eu sei que, no fundo, aquilo estava incomodando meu irmão. Treinar uma pessoa para se defender, é uma coisa. Ela realmente precisar usar essas habilidades em uma situação de perigo, é outra. O que Aurora precisou passar, apesar de necessário, atingiria a todos nós, independente no mundo em que vivemos.

Observo Amo assentir uma vez e franzir as sobrancelhas escuras.

- Ao menos o desgraçado teve o fim que merecia - ele diz e meu irmão bufa.

- Ele merecia sentir sua carne queimando e descolando dos ossos. Teve apenas um fim misericordioso, só isso - Nevio grunhe, sombrio.

Um calafrio passa por mim quando observo Amo encarar meu irmão. Ele então concorda com a cabeça e seus olhos escurecem.

- Poderia ter sofrido um pouco mais - Amo fala enfim, sério.

- Isso é o que eu sempre penso quando encaro um inimigo - Nevio diz ameaçadoramente e olho de um para o outro. Dois extremos do meu coração. Dois homens que nasceram para o poder e que se olham como se mal pudessem se tolerar.

Limpo a garganta, chamando a atenção dos dois. Amo me encara pacientemente enquanto Nevio levanta uma sobrancelha, me conhecendo bem demais.

- Preciso falar com Amo - digo a ele, que coloca uma carranca ainda maior no rosto. - A sós.

Avalanche | Amo & GretaTempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang