Sonho

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"Sonhar é bom, é como voar suspensa por balões."

Clarice Lispector

Estava encantada, a felicidade transbordando por cada parte de seu ser ao abraçar o corpo forte e quente do namorado. Levantou a face e mergulhou nos orbes negros que a fitavam com adoração. Seu coração amava e era amado na mesma intensidade.

Enlaçou o pescoço do Rodrigues, fechou os olhos e elevou o corpo para beijar os lábios finos e apaixonantes, praticamente nas pontas dos pés. Podia sentir o hálito fresco contra seu rosto e ansiava loucamente por mais um beijo carregado de amor e paixão.

Suas bocas se tocaram e...

*S2*

Um peso caiu contra a barriga de Sophia despertando-a. Assustada sentou sobre a cama e olhou confusa para todos os lados antes de se deter em uma bola peluda que espanava o ar com seu pequeno rabo.

Mesmo tendo seu sonho interrompido, Sophia sorriu carinhosa para o bichinho que pulou saltitante sobre seu colo.

– Bom dia, Migue!

Como se compreendesse suas palavras, o pequeno animal latiu e lambeu seu antebraço. Riu e acariciou o pêlo lustroso das costas dele.

Tivera sorte por seu pai autorizar que Migue morasse dentro da casa enquanto fosse pequeno. Durante o dia ele ficava no quintal da casa e a noite Sophia o colocava na caminha ao lado da sua, que a cada dia parecia menor em relação ao cachorrinho. Torcia para que Migue não crescesse muito.

Levantou da cama e entrou cantando no banheiro, tirou as roupas, entrou no box e ligou o chuveiro. Sua mente estava muito longe, relembrando todos os momentos que passara com Miguel desde que confessara estar apaixonada por ele. Passeios, estudos regados de beijos, carinhos e declarações românticas, infelizmente bem poucas da parte dele. Mas isso não atrapalhava em nada a felicidade da Almeida, pois sabia que Miguel a amava, ouvira a declaração e lembrava exatamente do som da voz dele proferindo cada palavra.

Terminado o banho, colocou o uniforme, amarrou o longo cabelo e se apressou a descer as escadas com Migue em seu encalço até chegar à sala de jantar onde Nathan, Olívia e seu pai a aguardavam.

– Sophia, aqui não é lugar para animais — avisou Tomás apontando para o cachorro aos pés da filha.

– Vou leva-lo para o quintal e já volto – informou antes de chamar o filhote e sair.

Voltou o mais depressa que conseguiu, por não desejar irritar seu pai, sentou e tomou seu café da manhã ansiosa pela chegada do namorado.

Sentado em frente à prima, Nathan se odiou por ter de admitir que o idiota do Rodrigues conseguia deixar Sophia cada dia mais radiante. Sophia acordava sempre disposta, sorridente e por diversas vezes a ouvira cantarolar pelos corredores da casa.

Queria encontrar somente um sinal de que Miguel fazia mal para Sophia, mas não havia nada. Até mesmo a bola peluda agradara a prima. Sophia não desgrudava do cachorro e o usava como desculpa para sair todas as tardes para passear com o namorado. Pelo menos tinha o consolo do cachorro confundir o Rodrigues com um poste e todos os dias brindar os sapatos dele com urina.

O som de uma buzina chamou a atenção de todos.

– É o Miguel. – Sophia levantou de súbito e correu ao encontro do namorado. – Nos vemos mais tarde.

Ela nem ao menos lhes deu a oportunidade de se despedir e sumiu porta a fora.

– A Soph está com tanta vontade de ver o Miguel que esqueceu o material – Olívia informou apontando a mochila ao lado da cadeira que Sophia ocupara. – Até eu esqueceria a vida por um gostoso igual ao Miguel – completou suspirando.

– Olívia! Isso não é jeito de falar.

– Ah, papai, me deixa ser feliz – reclamou com um bico de birra.

Consternado, Tomás balançou a cabeça. Tinha uma filha avoada e outra que não media as palavras.

– Olívia, termine logo seu café ou nos atrasaremos. Nathan, leve o material para Sophia. – Ordenou ao se levantar.

De imediato Nathan pegou a mochila e seguiu para fora da casa. Não se surpreendeu ao encontrar sua amada Sophia abraçada ao namorado trocando beijos apaixonados. Para sua infelicidade essa cena se tornara muito comum. Talvez presenciar aquilo todos os dias suprimisse seu amor proibido pela prima. Ou, o mais provável, aumentasse sua vontade de matar o Rodrigues.

Miguel foi o primeiro a repara na aproximação do Almeida e estreitou os olhos em sinal de desagrado. Nathan se sentia do mesmo jeito, se não fosse magoar a prima teria cortado o Rodrigues em pedacinhos, triturado aquela face arrogante e explodido até não sobrar nada, mas segurou cada um desses desejos. Estendeu a mochila quando Sophia se virou para ver o que deixara o Rodrigues tenso.

— Obrigada Nathan! – agradeceu envergonhada por ter esquecido o material na pressa de reencontrar o namorado.

Sem vontade de observar qualquer nova demonstração de carinho do casal, deu meia volta e se afastou pisando fundo.

*S2*

O portão do colégio ainda não fora aberto e, mesmo que tivesse, Davi não entraria sem antes se certificar que Sophia chegara. Gostava de cumprimenta-la logo na entrada do colégio e irritar o Rodrigues.

Leonardo evitava se meter naquele duelo bobo entre o amigo e Miguel, mas não conseguiu conter a pergunta quando Sophia e o namorado chegaram de mãos dadas e Davi se adiantou para ir ao encontro deles.

– Porque não desisti? — perguntou segurando o braço do Guerra.

– Ele vai magoa-la e quero estar por perto quando isso acontecer — Davi respondeu entredentes desviando o olhar do casal para encarar o amigo. — Eles mal se falavam e de repente o Rodrigues a ama? Acredita mesmo nisso?

– Nem todos usam palavras para se expressar.

– O que isso significa? — questionou encarando fixamente o amigo.

– Miguel a observava demais, principalmente nas aulas de educação física.

Davi franziu o cenho tentando lembrar-se de algo do tipo, porém não obteve sucesso. Nas aulas de educação física dificilmente reparava em algo fora da quadra.

– Oi Davi! Oi, Leonardo! — saudou Sophia com um sorriso tímido, a cintura sendo imediatamente enlaçada pelo namorado.

Davi não conseguia evitar olhar para Miguel com hostilidade, assim como o Rodrigues não fazia questão de esconder a irritação que o amigo de sua namorada lhe causava. Foi um alívio quando o portão foi aberto para permitir a entrada dos alunos.

– Vamos! — Praticamente ordenou o Rodrigues puxando Sophia.

– Esse cara trata a Soph como se fosse uma boneca de pano que pode levar aonde quer — resmungou Davi rancoroso. — E você ainda acha que esse idiota a ama. Não vê? Ele a afasta de nós, os amigos dela, para usa-la sem consideração e depois descarta-la sem nada, como fez com as outras. Mas Sophia não é como as outras, é frágil demais, vai sofrer, chorar muito e... Hey, Leonardo, está me ouvindo? — perguntou ao notar que a cabeça do amigo estava virada para o outro lado. Seguiu o olhar e não viu nada de interessante naquela direção, carros estacionados, a enorme doceria, alguns colegas de sua classe e outros estudantes do colégio. — O que tanto olha? — Ao não receber resposta balançou a mão na frente do rosto do Moreira. — O que você tem afinal?

Leonardo voltou à atenção para o colega, mas não disse nada, em silêncio caminhou para dentro do colégio.

Davi voltou a procurar o que atraíra a atenção do Moreira, mas novamente não encontrou nada importante. Bem, Leonardo sempre fora esquisito.

Meu Coração quer Amar e ser AmadoWhere stories live. Discover now