CAPÍTULO 7: Fugas na Madrugada

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Então você está fugindo – a voz de Bianca soou debochada enquanto ela fechava a porta – E veio se esconder justamente na minha casa? Que ideia brilhante, Westgan.

Rebeca se jogou na cama da loira, encarando os desenhos que as duas tinham feito com tinta guache no teto quando tinham cerca de dez anos. Era uma bagunça de formas geométricas coloridas, tentativas de fazer flores e castelos, animais e pessoas. Praticamente o quarto todo de Bianca era daquele jeito: rabiscado e colorido mas, de alguma forma, harmonioso. As paredes eram uma confusão de cores vivas resultantes de baldes de tinta jogados contra elas, que eram originalmente brancas – e sem graça ou personalidade alguma, segundo a loira. A parede atrás da cama era reservada unicamente para as pichações de grafite, com frases e rabiscos estranhos sem forma ou sentido. Ainda haviam os pôsteres de seus grupos e cantores favoritos, as bandeirolas de Game of Thrones e os quadros com temáticas de videogames e animes sobrepondo as cores. As únicas coisas sem cor eram os móveis, como a cama branca com dossel laranja brilhoso, a estante e a prateleira, que eram abarrotadas de livros, álbuns, revistas e pelúcias que iam desde um Yoshi roxo à uma Homem Aranha gigante.

– Eu não estava com muitas opções – murmurou ela de volta.

Bianca afundou na cadeira de rodinhas azul perto da escrivaninha, puxando as pernas para cima e apoiando o queixo nos joelhos. Os cabelos loiros estavam presos por uma caneta no alto da cabeça, estava sem maquiagem e vestia uma camiseta larga com estampa do reino dos cogumelos do Super Mario e um short de malha como pijama. E ainda assim, pensou Rebeca, Continua linda. Não que isso fosse uma surpresa, afinal, era de Bianca Harding que estava falando, a garota mais bonita de toda a cidade. Toda a família dela era bonita na verdade. Eram altos, magros, loiros, possuíam olhos verdes escuros como musgo e tinham uma áurea atrativa que se você não nascesse com ela, jamais iria ter. A loira era facilmente confundida com uma modelo, e já tinha até mesmo tirado algumas fotos profissionais para uma campanha que dizia que garotas também podiam gostar de videogames. E quando ela sorria, os olhos sorriam junto.

Rebeca era muito nova quando a viu pela primeira vez, em uma festa beneficente, e foi intimidada pela beleza da garota ainda naquela época, recusando-se firmemente a ir falar com ela mesmo com o incentivo de seus tios. Foi apenas em um jantar na casa dos DeFer que, depois da loira rir por quase cinco minutos da mancha que o recheio da torta tinha provocado no vestido novinho de Rebeca, elas trocaram as primeiras palavras; com Bianca se oferecendo para soltar Brutus, o pastor alemão de Benjamin que estava no quarto do garoto, para distrair os adultos enquanto elas se trancavam no banheiro e esfregavam a mancha com o detergente saqueado da cozinha. Daquela noite em diante, elas se tornaram a dupla inseparável que perturbava a paz de espírito de Lilian e Diana.

– Foi uma escolha idiota. Obviamente sua avó vai saber que você veio pra cá, você é muito previsível. – Rebeca levantou a cabeça para lançar um olhar torto para a amiga, que balançou os ombros distraidamente. – Mas quem sou eu para julgar escolhas idiotas no fim?

– Isso foi muito poético – sorriu a morena – E verdadeiro.

– Está julgando quem te ofereceu abrigo? Como ousa, seu monstro cruel? – Bianca levou uma mão ao coração, fazendo uma careta.

Ela riu se sentando na cama. Havia uma página aberta no notebook sobre a escrivaninha, onde um gif do que parecia ser uma mulher de idade se transformando em um lagarto gigante aparecia. Rebeca fingiu não ver aquilo.

– Você mesma sabe que faz escolhas péssimas, Bianca.

– Isso não é verdade! – protestou ela. Rebeca ergueu uma sobrancelha. – Não totalmente, pelo menos. E você está se escondendo da própria avó, não tem local de fala aqui!

A Receptora - O Ritual de Iniciação (livro um) Where stories live. Discover now