Capítulo 9

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      Na quinta-feira, logo pela manhã, Yara já estava mais do que certa de que tinha acordado com o pé errado.

Na verdade, não conseguira pregar os olhos por mais de dez minutos durante a noite, pois, a ansiedade corroía-lhe sem piedade, e a sua mente não conseguia desligar-se, imaginando mil e uma formas do evento do dia acabar em desastre.

Lá pelas quatro da manhã — cansada de se revirar na cama e nenhuma posição lhe parecer confortável —, aceitou de uma vez por todas que o sono não viria, e abriu a plataforma de livros no celular, tentando, pelo menos, fazer com que os seus pensamentos seguissem outra linha.

De fato, funcionou por um tempo, até adormecer com o aparelho na mão, sem saber se o protagonista tinha ou não descoberto quem assassinara seu irmão.

Contudo, embora tivesse recuperado alguma parte do tempo do sono que perdera, ao acordar, o interior da sua cabeça parecia ter sido ocupado por uma banda tocando rock pesado, bem como os olhos que pareciam querer saltar-lhe da cara, tamanha ardência.

E, para dar um acréscimo à lista de desastres do dia, quinze minutos após o horário marcado para o início do debate, ela ainda estava no andar de baixo à procura da professora de Química, tudo por causa de um maldito trabalho que havia se esquecido de fazer e valia ponto extra.

Por um lado, agradecia por seus colegas terem comentado sobre o assunto mais cedo na sala, ou então não se lembraria até que a docente passasse pra recolher. Porém, por outro, não pôde evitar ficar profundamente irritada por — como se não bastasse todo o nervosismo pela atividade que era obrigada a enfrentar logo mais — ter que elaborar um trabalho, dentro das exigências da professora, em menos de uma hora.

Optou então por faltar a aula de Filosofia — sem dor nenhuma no coração, porque detestava a matéria do fundo do âmago —, e refugiou-se na biblioteca, para que pudesse ter tudo pronto a tempo e, assim, não se atrasar para o evento.

No fim das contas, acabou por tomar todo o tempo da aula, do intervalo e um pouco mais além.

      — Ai meu Deus! Me desculpa! — pediu, quando chocou com alguém no corredor adjacente ao do auditório.

Envergonhada e com uma pressa dos infernos, ajudou o desconhecido — pele  escura e um pouco mais baixo do que ela — a pegar seus pertences do chão, reforçando o pedido anterior e seguindo, finalmente, para seu destino, daquela vez sem atropelar ninguém pelo caminho.

Empurrou lenta e delicadamente a porta do amplo espaço, espreitando para dentro em busca de um caminho que lhe fizesse não ser notada.

Uma voz masculina — que lhe ficou mais nítida ao entrar — se fazia ouvir e, seguindo naquela direção, identificou quem falava do outro lado do grande círculo que havia sido montado com as cadeiras, estando todos ali sentados.

Pôde notar ali seu professor de Português, junto de uma mulher morena muito bonita que nunca tinha visto, provavelmente a profissional que disse que estaria lá.

Pouquíssimos olhares foram dirigidos a si quando pegou um lugar vazio num canto mais escuro, abraçando a mochila contra o corpo. A julgar pela forma como todos permaneciam atentos ao garoto que falava, pensou que, o que quer que fosse, devia ser, no mínimo, interessante.

       — ...não pensam nos outros, nos que ficam pra trás. Sinceramente, é o que eu acho. — finalizou ele, recostando-se na caderia.

       — E é justamente por pensamentos como esse que os casos de suicídio vêm aumentando a cada ano! — quase levou um susto ao ouvir a voz de Léia soar firme, como se estivesse em um debate parlamentar e o garoto loiro que falara fosse da oposição. Buscou por ela entre os outros, encontrando-a mais rapidamente quando voltou a falar. — Quando ignoramos os sinais, dizemos que é frescura, que é covardia, egoísmo, falta de Deus, que a pessoa só quer chamar atenção. São essas coisas, que pensamos serem pequenas, que vão empurrando a pessoa cada vez mais para o fundo do poço, até deixar de ter esperança. E aí já sabemos o que tende a acontecer depois.

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