DEZOITO | BOSQUE WERAU

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           Jogue-se. – exigiu a voz.

         Os pés dela se precipitaram para baixo do precipício, pedregulhos rolaram com a gravidade. A celosiana estava no limite para uma queda.

        — Malya? – Zaire segurou seu braço.

       As películas negras em suas órbitas desapareceram, deixando-a confusa com a situação atípica. Malya retomou o controle de seu corpo.

         — Por Iya, você é sonâmbula? – ele não tinha visto as películas nos olhos dela. – Agora eu entendo porque o príncipe exige que durma na tenda dele. – ele não acreditava muito nessa suposição, sabia que havia algo além disso. Contudo, entendia que aquele não era o momento certo.

         A celosiana agradeceu mentalmente pelo amigo não ter vislumbrado o que a levou ao precipício, enfim algum resquício de sorte foi capaz de protegê-la de uma exposição. Ainda tentava entender o que estava acontecendo, mas vestígios da presença sombra na sua consciência logo lhe revelaram os fatos.

       — O-obrigada. – gaguejou nervosa, empenhando-se em sair dali.

       — Ei, calma. – correu atrás dela. – Deveria ter nos contado sobre seu sonambulismo, poderíamos ter nos preparado para esse tipo de situação. Nia teve algumas crises quando papai morreu. Numa ocasião, ela quase caiu no poço. Parece um problema inofensivo, mas pode ser uma dor de cabeça. – contou gentil, a fim de acalmar a outra.

         — Você tem razão. Fazia muito tempo que eu não vagava dormindo. Perdoe-me o susto. – mentiu, não poderia falar mais que isso.

         — Acho que todo esse estresse pode ter desencadeado as suas crises outra vez. Nia só parou de perambular depois de irmos a um curandeiro, talvez Kale possa ajudar você... – Zaire explicou, lembrando-se da condição da irmã.

        — Não, não é necessário. Eu tenho runas que são capazes de cessar o problema, só esqueci de usá-las hoje. – mentiu outra vez, não desejava que a informação se espalhasse entre os outros.

       — O que estão fazendo aqui fora? – Arden surgiu na porta, desde o início da viagem seu sono se tornara incrivelmente leve.

       — Nada, só ouvimos um barulho esquisito e decidimos checar. Mas era só um animal nos arbustos. – Zaire inventou.

       — Deveriam ter acordado aos outros, não podemos vacilar com nossa segurança. – replicou firme.

        — Como eu disse, era só um pássaro. – devolveu convicto.

       Todos entraram de volta na casa, ainda tinha um par de horas antes do dia raiar. Aproveitariam o máximo possível a cama macia, em virtude do inesperado desafio que espreitava. Só Malya que não conseguiu dormir mais, temerosa de que a voz retornasse mais determinada.

༄༄༄

      Os palladianos voltaram quando o sol nasceu, trazendo mais uma vez porções generosas de comida. Com o avançar da manhã, crianças se jogavam no lago central, brincando entre os cardumes de peixes. As risadas delas ecoavam tão puras e castas que conseguiam fazer a expedição esquecer dos últimos dias de perigo. As atividades da aldeia pareciam ser divididas coletivamente, assim como os bens gerais.

       — Espero que o café da manhã tenha sido do agrado de vocês. – Kale surgiu, usava a lança destravada nas mãos.

       — Foi ótimo, Kale. Eu nunca comi algo tão bom. – Zaire agradeceu.

        — Fico feliz, agora os anciões nos esperam. – o rosto dele se contorceu em sinal de tristeza.

Contos de Lucem - Ressurgir SombrioDonde viven las historias. Descúbrelo ahora